Ernesto Araújo mente 3 vezes ao rebater CNN americana sobre a pandemia
O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, mentiu três vezes ao rebater declarações sobre a situação da pandemia no Brasil feitas por um especialista à CNN americana. O chanceler isentou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) da responsabilidade de atuar no combate à covid-19, divulgou valores inflados ao tratar de recursos investidos pelo governo federal e classificou como "promissor" um medicamento ainda em fase inicial de testes e sem eficácia comprovada.
No trecho da entrevista compartilhado por Araújo (veja abaixo), Dennis Carroll, especialista em doenças infectocontagiosas, atribuiu o alto número de casos e mortes no Brasil a uma "liderança política fracassada" e comparou o trabalho de Bolsonaro ao do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que deixou o cargo em 20 de janeiro.
Enquanto Carroll fala, aparece na tela um gráfico com a média móvel de mortes por covid-19 no Brasil nos últimos sete dias. Segundo os últimos dados divulgados pelo consórcio de veículos de imprensa do qual o UOL faz parte, esse número é de 1.645 óbitos por dia — a pior marca da pandemia.
O país também alcançou hoje o maior balanço de mortes registradas em 24 horas: 2.349.
1. "Culpa" do STF
A primeira das mentiras do chanceler diz respeito a uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de abril do ano passado, ainda no início da pandemia. Araújo disse que a determinação dá a governadores — e não a Bolsonaro — "toda a autoridade para estabelecer/controlar todas as medidas de distanciamento social".
O discurso, outras vezes adotado também pelo presidente, já foi desmentido pelo próprio STF. A decisão, na verdade, define que União, estados e municípios têm "competências concorrentes na área de saúde pública" para atuar no combate à pandemia, o que significa dizer que os três são responsáveis por adotar quaisquer medidas para conter o avanço do coronavírus.
2. Valores inflados
A mentira seguinte aparece ainda no primeiro tuíte. Segundo o chanceler, o governo federal enviou US$ 98 bilhões (aproximadamente R$ 555 bilhões, na cotação atual) a estados em 2020 para auxiliá-los com a "manutenção e expansão de seus sistemas públicos de saúde com mais leitos de UTI [Unidade de Terapia Intensiva] e etc."
A quantia divulgada por Araújo é mais de nove vezes maior que os R$ 60,19 bilhões descritos no Portal da Transparência como "auxílio financeiro aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios relacionado ao programa federativo de enfrentamento à covid-19". O valor também é maior que o todo o montante gasto pela União com a pandemia no ano passado — R$ 416,04 bilhões, de acordo com o mesmo portal.
Os números divulgados pelo governo para defender sua atuação na pandemia já foram alvo de briga entre estados e União. No último dia 1º, ao menos 19 governadores assinaram uma carta para contestar uma publicação feita por Bolsonaro com supostos valores de repasses feitos no último ano.
Segundo o documento, os recursos efetivamente repassados para a área da saúde são uma quantia "absolutamente minoritária" dentro do montante divulgado pelo presidente. Além disso, disseram os governadores, os dados estão distorcidos porque englobam repasses obrigatórios pela Constituição Federal, previstos pelo pacto federativo.
"Situação absurda similar seria se cada governador publicasse valores de ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] e IPVA [Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores] pertencentes a cada cidade, tratando-os como uma aplicação de recursos nos Municípios a critério de decisão individual", argumenta a carta.
3. Spray sem eficácia
O chanceler ainda fez menção à recente viagem que fez a Israel junto a representantes dos ministérios da Ciência e Tecnologia e da Saúde. A princípio, segundo disse Bolsonaro na semana passada, a visita tinha como objetivo conhecer o spray nasal EXO-CD24, medicamento que começou a ser testado contra a covid-19 apenas recentemente e ainda não tem dados de eficácia publicados.
O governo, porém, mudou o discurso sobre essa viagem. Mais cedo, em evento no Palácio do Planalto, o presidente disse que a ida a Israel buscava parcerias para o desenvolvimento de vacinas, além de acordos para testar novos medicamentos. A versão foi repetida por Araújo, que ainda classificou o spray como "indiscutivelmente o remédio mais promissor contra a covid-19" — o que não é verdade.
O estudo sobre esse medicamento é um dos mais iniciais em desenvolvimento, de acordo com o publicado pela Folha de S.Paulo com base em informações da plataforma Clinical Trials, que reúne dados de experimentos sobre remédios, diagnósticos e vacinas no mundo todo. A chamada fase 1 começou no final de setembro de 2020, e a previsão é de que seja concluída apenas no próximo dia 25 de março.
No site, o status da pesquisa sobre o spray aparece como "recruiting" — ou seja: ainda está na fase de recrutamento de voluntários.
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