'Reação esperada', diz secretário que teria irritado facções que atacam CE
À frente da Secretaria da Justiça do Rio Grande do Norte até o ano passado, o policial civil Luís Mauro Albuquerque enfrentou rebeliões e conquistou fama de linha dura. Em 2019, recebeu o convite para chefiar a recém-criada Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará diretamente do governador, Camilo Santana (PT).
No discurso de posse, disse que encurralaria o crime organizado no Ceará, não reconhecia as facções criminosas e deixaria, portanto, de separar presos de grupos rivais.
No dia seguinte à declaração, o Ceará passou a viver uma série de atentados que já duram uma semana. Os atos são interpretados como uma retaliação ao novo secretário e ao discurso.
Em entrevista exclusiva ao UOL, Albuquerque refuta a tese de que tenha provocado os ataques e os relaciona a medidas do Estado contra o crime organizado. É a primeira vez que o secretário responde à imprensa desde o início dos ataques no Ceará.
Para investigadores e especialistas em segurança pública ouvidos pela reportagem, os episódios são orquestrados pelas três facções que atuam no Ceará, em conjunto: PCC (Primeiro Comando da Capital), CV e GDE (Guardiões do Estado). Desde a semana passada, criminosos incendeiam ônibus, repartições públicas, uma central de energia elétrica, uma ambulância e agências bancárias. Também colocaram explosivos sob uma ponte e um viaduto.
Em entrevista por e-mail, Albuquerque afirma que não recuará.
O caminho de gerir uma secretaria e consequentemente o sistema penitenciário é seguindo o que rege a lei. Portanto, não há como voltar atrás
Leia outros trechos da conversa:
UOL: Como o senhor analisa o nível de crise instalado atualmente no estado?
Albuquerque: O Ceará vive um momento de forte enfrentamento a ações de criminosos. A reação do crime organizado a esse enfrentamento era algo esperado. O Estado tem respondido prontamente com um trabalho forte de inteligência, com mais de duas centenas de prisões e a transferência de lideranças do crime para penitenciárias federais. Contamos com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança, além de estados parceiros. É um momento duro, mas passageiro, que trará certamente um grande ganho para o Estado e para o Brasil.
A que se deve essa série de ataques recentes na avaliação do senhor?
O governo do Estado tem assumido uma série de medidas contra o crime organizado, garantindo a aplicação da lei, e na qual está inserida a própria criação da Secretaria da Administração Penitenciária. Esses ataques são uma clara reação a essa atuação dura.
O governador tem conversado e apoiado?
O governador Camilo Santana me deu total autonomia para aplicar a lei no sistema. Sob o comando do governador Camilo, o estado está reunido, desenvolvendo um trabalho conjunto para normalizar essa situação. A diretriz que recebemos do governador Camilo Santana é de que é preciso fazer cumprir a lei dentro das unidades prisionais do estado. E é esse o trabalho que estou buscando desenvolver.
O senhor assume a responsabilidade pela motivação dos ataques, uma vez que investigadores apontam que o crime organizado se rebelou após seu discurso de posse?
Os ataques ocorreram após as duras medidas impostas pelo estado contra o crime organizado, dentro e fora das unidades prisionais.
Qual a chance de voltar atrás na afirmação e, consequentemente, na configuração da disposição dos presos nas unidades prisionais?
A minha determinação é tratar preso como preso, garantindo seus direitos e exigindo o cumprimento de seus deveres, como preceitua a Lei de Execução Penal. Acredito que o caminho de gerir uma secretaria e consequentemente o sistema penitenciário é seguindo o que rege a lei. Portanto, não há como voltar atrás.
O senhor se sente, de alguma maneira, ameaçado?
De forma alguma.
Em meio ao que vem acontecendo, é possível dizer que existe algo de positivo?
As ações são positivas para o Estado e para o Brasil. Estamos trabalhando para implantar uma rotina mais firme de disciplina dentro das unidades prisionais, com procedimentos rígidos que visam a coibir a entrada de ilícitos, impedindo que criminosos atuem de dentro do presídio aqui para fora. Também buscamos um padrão de segurança que dê mais garantia ao trabalho dos agentes penitenciários. E queremos ainda atender a todas as assistências - de saúde, educação, trabalho e jurídica - às quais os presos têm direito por lei. Alcançar esses objetivos é altamente positivo. Com as parcerias traçadas, a estratégia de rua e dentro das unidades, creio que seremos uma semente para que situações como a que vivenciamos atualmente não sejam repetidas em outros Estados.
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