'Crueldade': De esposa à PRF, o que dizem as partes do caso Genivaldo
As circunstâncias da morte de Genivaldo de Jesus Santos, 38, em Umbaúba, litoral sul de Sergipe, estão sendo investigadas pelas autoridades. No entanto, testemunhas e PRF já apresentaram as versões do que teria ocorrido ontem após ele ter sofrido uma abordagem truculenta de policiais na BR-101 durante uma blitz.
De acordo com vídeos e detalhes do boletim de ocorrência, os agentes usaram o que parecem ser bombas de gás lacrimogênio para dominarem o homem, que ficou preso em um porta-malas. Em nota, o IML informou que o laudo definitivo ainda não foi realizado, mas os médicos legistas já identificaram que a vítima morreu por "insuficiência aguda secundária a asfixia."
O sobrinho
Testemunhas que estavam no local — inclusive o sobrinho de Genivaldo, Wallison de Jesus Santos, contam que ele obedeceu às exigências das autoridades durante a abordagem e os agentes foram informados sobre Genivaldo ter problema psiquiátrico.
"Ele parou, colocou a moto no tripé e atendeu todos os comandos", disse Wallison ao UOL. Os policiais então pediram para que ele levantasse a camisa e Genivaldo teria afirmado que estava com os remédios psiquiátricos e a receita médica no bolso, que serviria para provar os transtornos.
Ao ver o início de uma truculência entre a polícia e o tio, Wallison deu o alerta aos policiais confirmando a versão de Genivaldo.
"A gente pediu para pegar leve, que ele ia atender o que eles pedissem. Mas o policial chamou reforço no microfone, e chegaram mais dois policiais em seguida", lembra. A chegada de mais dois policiais deu início a uma série de agressões, ainda que Genivaldo estivesse rendido e imobilizado.
Testemunha
Nos vídeos publicados por moradores, é possível ver o momento em que Genivaldo ergue os braços, demonstrando colaborar. Porém, por várias vezes na gravação é possível ouvir os policiais gritando com ele e até o ofendendo. Mais tarde, ele é visto no porta-malas, com fumaça — ainda não confirmada se gás lacrimogênio — escapando da viatura.
O homem que grava toda a cena diz: "Ele tem problema mental". Depois, ao saber que havia um parente de Santos presente, ele se dirige a ele e diz: "Cara, se você sabe que ele tem problemas mentais, você tem que avisar". Ao que Wallison responde: "Já avisei."
A PRF
Por meio de nota oficial encaminhada à imprensa, a PRF de Sergipe disse lamentar o fato e informou que foi aberto procedimento disciplinar para averiguar a conduta dos policiais envolvidos.
Segundo a versão das autoridades, Genivaldo "resistiu ativamente a uma abordagem de uma equipe da PRF". Em razão da "agressividade", os agentes empregaram "técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção e o indivíduo foi conduzido à delegacia da polícia civil da cidade".
Não ficaram claras, no entanto, quais foram as técnicas e instrumentos utilizados pelos policiais e que tipo de gás foi lançado no porta-malas da viatura.
No comunicado, a PRF ainda narrou que Genivaldo "foi conduzido à Delegacia de Polícia Civil. No entanto, durante o deslocamento, passou mal, foi socorrido e levado para o Hospital José Nailson Moura, onde posteriormente foi atendido e constatado o óbito."
A irmã da vítima
No boletim registrado na delegacia de Umbaúba, a irmã de Genivaldo, Damarise de Jesus Santos, 46, disse que ele havia pegado a sua moto de maneira furtiva, sem que ela soubesse. Ela também confirmou que o irmão tinha problemas mentais, "imaginando vultos e sendo perseguido", mas não saberia dizer qual era a doença.
No texto do boletim consta ainda que Damarise teria dito que o irmão estaria agindo de forma agressiva e se recusou a seguir a ordem para colocar as algemas, sendo contido "por meio de utilização de gás de pimenta", em seguida algemado e colocado dentro do camburão. "Ele é grandão, muito forte, tem quase 2 metros de altura", disse a irmã da vítima ao delegado Rafael Brito de Oliveira, que colheu o depoimento.
A esposa
A mulher de Genivaldo, Maria Fabiana dos Santos, repudiou a "crueldade" dos policiais e confirmou a versão de que ele tinha transtornos.
"Eu não chamo nem de fatalidade, isso foi um crime mesmo. Eles agiram com crueldade pra matar, porque eu vivo com ele há 17 anos, ele tinha há 20 anos o problema dele, nunca agrediu ninguém, nunca fez nada de errado, sempre fazendo as coisas pelo certo, e em um momento desses pegaram ele e fizeram o que fizeram", lamentou Maria em entrevista à TV Sergipe, afiliada da Globo no estado. Ela não especificou que problema Genivaldo tinha diagnosticado.
A comunidade
Moradores da cidade de Umbaúba realizaram um protesto na manhã de hoje, pedindo Justiça pela morte de Genivaldo. As imagens publicadas nas redes sociais indicam que o protesto ocorreu na BR-101, que teve vias fechadas com pneus queimados. A população aparece com cartazes afirmando que "esse crime não pode ficar impune."
A Polícia Federal
A PF (Polícia Federal) em Sergipe instaurou inquérito para apurar as circunstâncias da morte de Genivaldo. O MPF também abriu um procedimento sobre o caso, no sentido de acompanhar as investigações. O órgão em Sergipe deu um prazo de 48 horas para que a PRF (Polícia Rodoviária Federal) dê detalhes sobre o procedimento.
A OAB
O presidente da OAB Sergipe, Danniel Alves Costa, em vídeo enviado ao UOL, afirmou que "as imagens são muito fortes, causam indignação em toda a sociedade e transmitem indícios de negligência na abordagem policial."
"Por isso, não só a OAB, mas toda a sociedade sergipana, exige uma resposta rápida nas apurações e caso fique demonstrado a existência de responsabilidade pelo falecimento que sejam os culpados penalizados e afastados de suas respectivas funções", disse ele. "Mesmo ciente da seriedade da PRF e da sua importância institucional, não é esse tipo de proteção que a sociedade espera da polícia."
Violência contra negros no Brasil
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021 (levantamento mais recente feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados do ano de 2020), 75,8% das vítimas de homicídio no Brasil eram pessoas negras.
Entre as pessoas mortas por policiais, 78,9% são pessoas negras.
Na esfera do poder público, não existe uma divulgação transparente de dados oficiais nacionais sobre homicídios ou sobre mortes provocadas por policiais em todo o Brasil. O governo brasileiro também não disponibiliza dados nacionais sobre as investigações e punições de homicídios.
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