Após morte de líder, maior milícia do RJ tem guerra interna e se alia ao CV
A morte do líder da maior milícia do Rio, baleado em uma operação policial em junho de 2021, deu início a uma guerra interna em disputas por poder que motivaram a aliança entre uma ala do grupo paramilitar com o Comando Vermelho desde o começo deste ano. Com isso, o tráfico de drogas avançou para áreas na zona oeste do Rio, reduto tradicional das milícias.
Organização criminosa dividida
A ruptura do grupo começou no dia seguinte à morte de Wellington da Silva Braga, o Ecko, quando mais de cem homens com fuzis cercaram a área de atuação dele na zona oeste carioca. Segundo a Polícia Civil, eram milicianos ligados a Danilo Dias Lima, o Tandera, responsável pela expansão da organização criminosa para a Baixada Fluminense iniciada há sete anos.
O grupo passou a ser chefiado por Luis Antônio da Silva Braga, o Zinho, irmão de Ecko, que tem mandados de prisão por organização criminosa, porte ilegal de arma e associação criminosa. De lá para cá, outras duas lideranças da maior milícia do Rio romperam com o chamado Bonde do Zinho.
Homem de confiança de Zinho, Rodrigo Santos, o Latrell, se desvinculou do grupo após ser preso em São Paulo em março de 2022. Transferido para o Rio, o miliciano pediu para ser levado para uma ala onde não houvesse detidos ligados ao Bonde do Zinho, segundo fontes na Seap (Secretaria de Administração Penitenciária).
Em junho deste ano, Latrell foi transferido para um presídio federal por decisão da Justiça por ser apontado como um dos criminosos mais perigosos do Rio.
Mas a ruptura com Alan Ribeiro Soares intensificou a disputa por território na milícia. Nanan, como Alan é conhecido, era uma das lideranças do Bonde do Zinho e hoje é o principal rival dele nas ruas.
Nanan, que tem mandados de prisão por organização criminosa e associação criminosa, se voltou contra o líder da milícia após o assassinato neste ano de um dos seus homens de confiança em Santa Cruz, zona oeste carioca. Encurralado, Zinho firmou aliança com o Comando Vermelho, permitindo que a facção criminosa passasse a vender drogas em suas áreas de atuação.
O Ecko [líder da milícia morto em 2021] tinha a tropa na mão. Com a morte dele, o Zinho, irmão dele, assumiu o grupo, mas foi perdendo espaço e decidiu firmar essa aliança com o Comando Vermelho, que está ocupando territórios na zona oeste do Rio que até então eram só da milícia.
André Neves, delegado da Draco, que investiga as milícias do Rio
Esse grupo paramilitar já era uma união de criminosos, que se tornaram parceiros de armas. Com a morte do Ecko, o ponto de equilíbrio acabou, dando início a uma disputa entre eles.
Elisa Ramos Pittaro Neves, promotora de Justiça do Rio
Como está a guerra interna da milícia
A guerra interna da milícia deixou mais de 20 mortes na zona oeste do Rio só neste ano, segundo a Polícia Civil. Em um intervalo de pouco mais de uma semana, cinco suspeitos de integrar os grupos chefiados por Zinho e Nanan foram assassinados na mesma região.
Na noite de 13 de setembro, dois homens foram mortos a tiros na favela do Aço, em Santa Cruz, reduto de Zinho.
Três dias depois, o corpo do miliciano Luís Paulo Aragão Furtado, o Vin Diesel, foi encontrado na Gardênia Azul. Ele foi morto porque teria auxiliado o Comando Vermelho a tomar o poder ali, indicam as investigações. Vin Diesel estava sendo procurado pela Justiça e tinha dois mandados de prisão por homicídio qualificado.
Newsletter
PRA COMEÇAR O DIA
Comece o dia bem informado sobre os fatos mais importantes do momento. Edição diária de segunda a sexta.
Quero receberNo dia 16 de setembro, dois milicianos ligados a Zinho foram mortos a tiros dentro de um carro por um suspeito de integrar a quadrilha de Nanan em Santa Cruz. O autor dos disparos também se feriu na ação, mas resistiu aos ferimentos e acabou sendo levado ao Hospital Pedro II.
O caso mais recente ocorreu na noite da última quinta-feira (21), quando Renan Ribeiro Viana, 36, foi morto com tiros de fuzil ao passar de carro pela avenida Antares, também em Santa Cruz. Conhecido como Renan Bomba, a vítima era apontada como um dos seguranças de Zinho. Todos os casos estão sendo investigados pela Delegacia de Homicídios da Capital.
Assassinato de fundador da milícia
No começo deste mês, o Ministério Público denunciou Zinho e outras cinco pessoas por suspeita de envolvimento no assassinato do ex-vereador e ex-policial civil Jerônimo Guimarães Filho. Solto em 2018 após cumprir dez anos de prisão por formação de quadrilha, Jerominho é apontado como o fundador do grupo paramilitar, que surgiu há cerca de 20 anos e já foi conhecido como "Liga da Justiça".
O crime foi motivado pela descoberta de um plano de Jerominho e seu irmão Natalino José Guimarães de retomada de poder na milícia, aponta o MP. Ele perdeu o controle da organização criminosa após permanecer preso com o irmão entre 2007 e 2018.
Jerominho e seu amigo Maurício Raul Atallah foram mortos a tiros de fuzil em agosto de 2022 em ação registrada por câmera de segurança. O grupo paramilitar era acusado por extorsões, cobranças por taxa de segurança e execuções no asfalto em plena luz do dia.
Em entrevista ao UOL em 2020, Jerominho disse que planejava um retorno ao meio político e dizia se inspirar no agora ex-presidente Jair Bolsonaro. "Quando assaltadas, as pessoas não vão para a delegacia. Elas me procuram", disse à reportagem na ocasião.
Uns polícia [sic] têm umas armas. Aí, tem embate. Tem morte, tem tudo. E os traficantes acabam fugindo. A família não vai mais ser esculachada, o comerciante não vai mais ser esculachado. Pronto, conseguiram formar uma milícia. Eu ouvi dizer que foi assim que começou tudo.
Jerominho, em entrevista ao UOL em 2020
Com mais de 300 mil habitantes, Campo Grande, reduto do grupo fundado por Jerominho, é o bairro mais populoso do país. Localizado a 48 quilômetros do centro, possui o batalhão da PM-RJ (Polícia Militar do Rio de Janeiro) com o menor efetivo da capital, na relação com o número de moradores.
Deixe seu comentário