Moradores não conhecem dona de terras de Jeri: 'É loira, morena? Não sei'
Moradores da Vila de Jericoacoara, no Ceará, dizem que nunca viram a aposentada Iracema Correia São Tiago, 78, na região. Ela alega ser dona de cerca de 80% do local, e conseguiu na Justiça a posse do equivalente a 4% das terras reivindicadas.
O que aconteceu
O Conselho Comunitário de Jericoacoara diz que só soube do acordo, fechado com a Procuradoria-Geral do Estado em maio deste ano, há duas semanas. A entidade foi informada sobre a posse das terras ao tentar montar uma horta em um dos trechos.
"É uma grande falha do estado", disse a presidente da entidade, Lucimar Marques de Vasconcelos, ao Fantástico, da TV Globo. "Ele errou porque não procurou a comunidade. Como uma pessoa tem 80% de uma vila dessa. Onde ela estava esse tempo todo que nunca se apresentou?", questionou.
"Não sei se é alta, baixa, magra, morena, loira. Não sei", disse moradora. Teresa Martins é neta de uma das primeiras pessoas a chegarem na região. "É onde a gente foi criado. Aqui nessa casinha fomos seis irmãos. Estamos já na sexta geração e nunca saímos da vila", afirmou a mulher.
A moradora mais antiga do local, de 104 anos, lamentou o acordo judicial. "O lugar está dando dinheiro, e eles agora 'cresceram os olhos' no lugar", disse ao Fantástico, sem ser identificada.
Sobrinho defende família
Sanuel Machado, sobrinho do ex-marido de Iracema, que cedeu parte das terras a ela após o divórcio em 1995, diz que apenas o tio ia ao local. "Era uma viagem de pista de terra batida até a primeira localidade, que era distrito de Caiçara", afirmou ao colunista do UOL Carlos Madeiro.
"Era uma viagem longa, não existia vila de Jeri", destacou Samuel. "Lá só tinha algumas casas de pescadores, não tinha energia. Ele nunca fez casa de família, era estritamente comercial", acrescentou Machado. Outro ponto é que Iracema, ao separar, decidiu voltar o sobrenome de solteira e tirou o Machado. "Aí as pessoas não fizeram essa ligação ao Zé Maria", argumenta.
A família também se defende das críticas por ficar décadas sem reivindicar as terras. Segundo o sobrinho, um advogado contratado por eles em 2002 afirmou que o estado teria feito a aquisição da área entre 1995 e 1997, e o prazo de reivindicação seria de apenas cinco anos —aquisição de terras, segundo especialistas ouvidos, não prescreve para pedido de reivindicação.
Entenda o caso
Um dos destinos mais badalados e visitados do Nordeste, Jericoacoara é alvo de uma polêmica. Após 40 anos, uma empresária procurou o estado para alegar que uma área de 730 mil de m² dentro da Vila de Jeri, (equivalente a 80% do total) são de sua propriedade.
É na vila que estão com casas, hotéis e restaurantes, por exemplo, visitados por turistas de todo o mundo. Ela fechou um acordo com o governo do estado e terá 49,5 mil m² de áreas livres recebidos de volta.
Depois de uma análise dos documentos, a Procuradoria-Geral do Estado informou que as matrículas apresentadas, datadas do ano de 1983, são verdadeiras. Para evitar que centenas de famílias e empresários tivessem que sair de áreas já tituladas, o estado anunciou que fechou um acordo com cessão apenas de áreas desocupadas à mulher.
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