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Cara a cara, Lula usa covid para atacar Bolsonaro e presidente, Petrolão

Do UOL, em São Paulo, no Rio e em Brasília*

16/10/2022 21h52Atualizada em 18/10/2022 14h55

O primeiro confronto direto entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou um novo modelo de debate e foi dividido em dois momentos. No primeiro bloco, Lula dominou a cena emparedando Bolsonaro com questões sobre a condução da pandemia de covid-19. No último, depois de pressionado por acusações de corrupção na Petrobras, o petista se perdeu no tempo e o chefe do Executivo teve quase seis minutos para falar, sem interrupção.

O debate entre os candidatos à Presidência da República foi promovido pelo UOL, em parceria com Band, Folha de S.Paulo e TV Cultura. O programa foi dividido em três blocos e durou quase duas horas.

Lula subiu ao palco antes de Bolsonaro, que entrou e não cumprimentou o petista. Na primeira pergunta do confronto, o ex-presidente saiu do púlpito e respondeu ao questionamento andando, enquanto Bolsonaro ficou parado —ao longo do debate os adversários ficaram mais à frente do palco e o presidente chegou a encostar no ombro do adversário.

Pesquisa Datafolha divulgada na sexta-feira (14) mostrou Lula com 49% das intenções de voto e Bolsonaro com 44%. Outros 5% disseram que devem votar em branco ou nulo e 1% dos entrevistados se declararam indecisos. O levantamento tem margem de erro de dois pontos percentuais. O segundo turno está marcado para 30 de outubro.

O que você precisa saber sobre o debate:

  • Lula usou a gestão da pandemia de covid-19 para emparedar Bolsonaro;
  • Bolsonaro relembrou Petrolão e deixou Lula, pressionado, nas cordas;
  • Visita de Lula ao Complexo do Alemão, no Rio, fez Bolsonaro insinuar ligação do petista com crime;
  • Bolsonaro destacou decisão de Alexandre de Moraes para se defender de polêmica sobre pedofilia;
  • Candidatos se comprometeram a não mexer no número de ministros do STF.

O que os candidatos disseram:

Quem defende a democracia e a liberdade sou eu. Muito mais do que ele, que é um pequeno ditadorzinho."
Lula

Prezado Lula, quem vai ser seu ministro da economia? Já decidiu ou está barganhando com algum partido político?"
Bolsonaro

Se houve corrupção na Petrobras, olha, apreendeu-se o ladrão que roubou, acabou. E prendeu porque houve investigação. Porque, no nosso governo, nada era escondido. A gente não tinha sigilo. Não tinha sigilo do filho, da filha, não tinha sigilo do cartão de crédito."
Lula

Eu não tenho nada a ver com esse orçamento secreto. Posso até entender que o Parlamento trabalha melhor na distribuição de renda do que nós, do lado de cá."
Bolsonaro

Leia mais frases de Lula no debate
Leia mais frases de Bolsonaro no debate

Lula e Bolsonaro ficaram longe do púlpito na maior parte do debate na Band - Renato Pizzutto/Band - Renato Pizzutto/Band
Lula e Bolsonaro ficaram longe do púlpito na maior parte do debate na Band
Imagem: Renato Pizzutto/Band

Como foi o debate:

'Pintou um clima'. Antes mesmo do debate, Lula e Bolsonaro fizeram comentários sobre a entrevista dada pelo presidente a um podcast na última sexta-feira (14). Na gravação, ele se referiu a um encontro com venezuelanas dizendo que "pintou um clima" ao ver adolescentes "arrumadas para ganhar a vida", insinuando exploração sexual infantil.

Em entrevista ao chegar à emissora, Lula criticou o adversário e disse que o candidato à reeleição agiu "de má-fé". Já Bolsonaro se defendeu e disse que passou "por 24 horas terríveis".

Questionado sobre o que quis dizer com a expressão "pintou um clima", Bolsonaro desconversou e disse que usa a fala em outros contextos. Sobre a insinuação que as jovens venezuelanas estariam se prostituindo, o presidente disse que "não fez acusação direta de nada".

Fake news. No debate, ao responder sobre divulgação de notícias falsas, Bolsonaro citou o mesmo caso. Disse que a campanha de Lula tentou atingi-lo com o que tem de "mais sagrado: defesa da família brasileira, defesa das crianças".

Em seguida, o atual presidente usou uma decisão do ministro Alexandre de Moraes contra o PT para atacar o petista. Moraes —que frequentemente é alvo de Bolsonaro— acolheu o pedido do presidente para que Lula se abstenha de explorar durante a propaganda eleitoral gratuita e em suas redes sociais vídeos que o associem ao crime de pedofilia.

Você tem que falar do seu passado, que não tem nada que preste no seu passado. Tem que mentir para tentar denegrir a imagem dos outros."
Bolsonaro

Broche. Lula foi ao debate usando um broche na lapela de seu terno em homenagem à Campanha Nacional de Mobilização de Combate a Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. O slogan da campanha é "Faça bonito, proteja nossas crianças e adolescentes".

Ao UOL, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse que a ideia do ex-presidente usar broche da rosa amarela foi dela.

Staff. Nos bastidores, familiares e integrantes da campanha de ambos os candidatos acompanharam o debate. Lula chegou com a esposa, Janja da Silva, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Bolsonaro estava cercado de homens —o filho Carlos Bolsonaro e os ministros Fábio Faria, das Comunicações, e Ciro Nogueira, da Casa Civil.

O ex-juiz e senador eleito Sergio Moro (União Brasil-PR) entrou no estúdio antes do programa começar para orientar Bolsonaro —e também participou da coletiva, logo após o embate, ao lado do atual presidente. Ambos haviam rachado em 2020, quando Moro abandonou o governo de Bolsonaro e o acusou de interferir na Polícia Federal.

Bolsonaro afirmou que Moro tem vasto conhecimento sobre esquemas de corrupção do PT. Questionado sobre a ruptura dos dois, o presidente minimizou. "Você nunca brigou em casa com marido? Uma briguinha? Acontece divergência, mas aqui são muito maiores porque estamos falando de Brasil."

Pandemia no centro. Nos primeiros minutos do bloco inicial do debate, Lula usou temas relacionados à pandemia de coronavírus para atacar Bolsonaro. O atraso da vacina e o discurso do atual presidente a favor de medicamentos sem eficácia comprovada foram alguns dos assuntos.

O Brasil tem 3% da população mundial. E o Brasil teve 11% das mortes da pandemia no mundo. Por que que houve tanta demora para se comprar vacina? O senhor não se sente responsável? O senhor não carrega nas costas um pouco do sofrimento dos brasileiros de ser responsável pelo menos por 400 mil mortes nesse país?"
Lula

O candidato à reeleição, por sua vez, ficou na defensiva.

A vacina, seu Lula, não é para quem está contaminado, a vacina é para quem ainda não foi contaminado."
Bolsonaro

A declaração de Bolsonaro, no entanto, é falsa. Quem teve covid-19 pode contrair a doença novamente, especialmente após o surgimento de novas variantes. Logo, apesar de infecção prévia, é importante a vacinação.

Segundo reportagem do UOL, a imunização em massa foi responsável por conter o avanço da subvariante BA.2, que se tornou predominante no mundo a partir de maio de 2022. O número de mortes, que já havia ficado mais baixo com a variante ômicron, também segue pequeno em relação a outras ondas —mostrando uma proteção robusta na população advinda principalmente graças à vacinação.

Ainda no primeiro bloco, Bolsonaro criticou a CPI da Covid e as medidas de isolamento que foram adotadas para impedir o avanço do coronavírus no Brasil.

Petrolão. Para atacar o petista, Bolsonaro usou o Petrolão, que definiu como o "maior esquema de corrupção da história da humanidade".

Em sua resposta, o petista disse que foi responsável por fazer a capitalização de R$ 70 bilhões da Petrobrás e transformou a estatal "na segunda maior empresa de energia do mundo", o que, segundo ele, tornou o Brasil um país "autossuficiente".

O petista afirmou que prenderam quem roubou a Petrobras porque houve investigação nos governos do PT, sem sigilos nas ações do governo —Lula tem repetido que vai quebrar os sigilos de cem anos impostos pelo presidente sobre assuntos relacionados ao governo e aos familiares de Bolsonaro.

Eu não tenho nenhum problema de explicar o Petrolão, quero que você explicar é a forma sigilosa que você colocou tantas coisa na sua vida."
Lula

Lula no CPX. Bolsonaro falou sobre a ida de Lula ao Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, na última quarta-feira (12) para um ato de campanha e mentiu ao dizer que não havia a presença de policiais —"apenas traficantes".

Ao responder, o petista afirmou ter "orgulho" de ser um candidato com "coragem de entrar em uma favela sem colete de segurança".

O candidato sabe que quem cuida de crime organizado não sou eu. Quem tem relação com miliciano e crime organizado, ele sabe que não sou eu, e sabe quem tem. Sabe inclusive da culpabilidade que foi o crime organizado que matou a Marielle no Rio de Janeiro."
Lula

Lula se reuniu com lideranças comunitárias para tratar de projetos sociais, política de armas, cultura e segurança pública. Depois, fez uma caminhada de cerca de uma hora pela Estrada de Itararé.

No comício, o petista usou um boné com as iniciais CPX. O item foi atacado por bolsonaristas que afirmaram que o acrônimo é de uma gíria de grupos criminosos, o que não é verdade —como mostrou o UOL Confere. Hoje, no debate, Bolsonaro voltou a mentir sobre o termo.

"CPX" é abreviação para "complexo", como são chamados os conjuntos de favelas cariocas. A simplificação é usada pelos moradores dos locais, pela Polícia e pelo governo— a sigla também aparece na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) para 2023 do estado do Rio.

Sem mexer no STF. Questionados pela jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura, sobre aumentar o número de ministros do Supremo Tribunal Federal, os candidatos se comprometeram a não mudar.

A ideia foi aventada e defendida por aliados do Planalto para aumentar de 11 para 15 a 17 cadeiras, garantindo maioria ao governo Bolsonaro em caso de reeleição. Nos últimos dias, porém, o candidato à reeleição tem recuado e falou em "invenção" da imprensa.

"Da minha parte está feito o compromisso, não terá nenhuma proposta como nunca estudei isso com profundidade", respondeu Bolsonaro.

"Você não indica ministro da Suprema Corte para votar favoravelmente a você para se beneficiar. Ministro da Suprema Corte tem que ter currículo, tem que ter história", disse Lula. "Tentar mexer na Suprema Corte para colocar amigo, companheiro, partidário é um retrocesso que a República brasileira já conhece."

Como mostrou o UOL, somente na ditadura militar o STF contou com 16 integrantes. A medida, imposta pelo Ato Institucional nº 2 (AI-2), de 27 de outubro de 1965, e durou até 1969. Neste ínterim, três ministros da Corte sem ligação com os militares foram cassados, diminuindo ainda mais o poder de atuação do Judiciário.

Personal space? Ao longo do debate, os adversários ficaram longe do púlpito. Na hora de perguntar e responder, Lula, por exemplo, falava olhando para as câmeras e, ao final, olhava diretamente para Bolsonaro.

No início, o candidato à reeleição fugia o olhar tanto para Lula, quanto para as câmeras —o que mudou no final do primeiro bloco.

"Fica aqui, Lula. Fica aqui", disse Bolsonaro, no meio do terceiro bloco, tocando no ombro do petista. "Estou à disposição", respondeu o ex-presidente.

Não há registro de contato físico entre os dois no mínimo desde 2018, quando Bolsonaro concorreu à presidência pela primeira vez. Nos bastidores dos debates neste ano, nunca apertaram as mãos —nem ao final do programa deste domingo.

Momento em que Bolsonaro coloca a mão no ombro de Lula no debate na Band - Renato Pizzutto/Band - Renato Pizzutto/Band
Momento em que Bolsonaro coloca a mão no ombro de Lula no debate na Band
Imagem: Renato Pizzutto/Band

Problemas do primeiro debate. Dentro da Band, apoiadores de Lula e Bolsonaro ficaram separados por uma grade, seguranças e até vasos de plantas. Mas a verdade é que o espaço não foi muito prestigiado —havia mais jornalistas que convidados dos candidatos.

A medida não havia sido adotada no debate antes do primeiro turno. Na ocasião, o deputado André Janones (Avante-MG) e o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles discutiram e quase trocaram socos em uma sala reservada para os convidados dos presidenciáveis.

A briga começou após a reação da comitiva de Bolsonaro em uma das falas de Lula. Bolsonaristas gritavam "ladrão" no momento em que o petista falava.

*Participaram desta cobertura:
Em São Paulo: Ana Paula Bimbati, Beatriz Gomes, Caê Vasconcelos, Felipe Pereira, Herculano Barreto Filho, Isabela Aleixo, Juliana Arreguy, Letícia Mutchnik, Lucas Borges Teixeira, Stella Borges, Saulo Pereira Guimarães e Wanderley Preite Sobrinho.
No Rio de Janeiro: Lola Ferreira.
Em Brasília: Camila Turtelli, Leonardo Martins e Paulo Roberto Netto.
Colaboração para o UOL: Amanda Araújo e Pedro Villas Boas.