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Salles defende 'boi bombeiro' no Pantanal e nega desmonte ambiental

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

13/10/2020 12h01

Assim como a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, defendeu hoje a criação de gado no Pantanal e o uso do chamado "fogo frio" como medidas preventivas a queimadas no bioma.

Ele também negou que haja um desmonte na área ambiental em sua gestão à frente da pasta, apesar de indicações que apontam o contrário.

Segundo o ministro, a alta nas queimadas no Pantanal neste ano se deve, principalmente, às altas temperaturas combinadas com a baixa umidade. Parte de entidades ambientais credita o aumento a ações humanas.

Na semana passada, ao também participar de audiência pública na comissão temporária do Senado que acompanha os incêndios no Pantanal, Tereza Cristina afirmou que hoje o boi é o "bombeiro do Pantanal" e que, se tivesse mais gado no bioma, os incêndios poderiam ser menores do que os deste ano, situação que classificou como "desastre".

A tese é que o boi come uma parte da massa do capim seco que, quanto mais alto, mais ajuda a propagar focos de incêndio mais rapidamente. Estando o capim mais baixo após ser comido pelo boi, o fogo não se alastraria com tanta facilidade. No entanto, a tese é rebatida por especialistas.

"Nós concordamos. Ouvimos de várias fontes diferentes a necessidade de haver um reconhecimento do papel da criação de gado no Pantanal, uma vez que o gado também contribui para diminuir o que há de excesso de matéria orgânica, o capim, enfim, o pasto que ele ajuda a reduzir", disse Salles.

O ministro ainda defendeu a utilização do chamado "fogo frio", fogo preventivo aplicado de forma controlada para diminuir o volume de massa orgânica depositada se feito de maneira certa e no momento adequado.

Em julho deste ano, decreto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) proibiu queimadas no Pantanal e na Amazônia por 120 dias, com algumas exceções. No Mato Grosso do Sul, a queimada controlada já vinha sendo proibida por um determinado período ao longo dos últimos anos devido à dificuldade de se controlar o fogo dadas as condições climáticas adversas.

"Há medidas que nós podemos e continuaremos fazendo, para não só prevenir e, para isso, fazer os aceiros, permitir a criação de gado no Pantanal como forma de reduzir a massa orgânica, permitir que seja feita a queima controlada, o uso do fogo frio, e não ter isso como algo a ser indiretamente boicotado por algumas visões que não acreditam nesse formato", declarou Salles.

Em seguida, o ministro disse que as áreas de competência do governo federal são unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos, que somam 6% do bioma, segundo ele. O restante, 94% do Pantanal, é de jurisdição dos Estados. Portanto, a maior parte da fiscalização e aplicação de penalidades e multas é de competência estadual, defendeu.

"Você retira a pecuária, retira o fogo frio, aumenta inexoravelmente a quantidade de massa. Toda essa massa queima. O volume de fogo, o que acontece? É isso que estamos vendo nesse ano. Clima mais quente, mais seco, com volume excessivo de massa orgânica. Fica um fogo de grandes proporções", disse o ministro, ao citar artigo do pesquisador aposentado da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Arnildo Pott, encaminhado pelo pesquisador da Embrapa Territorial Evaristo Miranda.

Os posicionamentos de Evaristo Miranda, porém, não são unanimidade no meio científico. Na audiência, Salles falou ser preciso ouvir "diversas vozes" e criticou o que chamou de "seleção de alguns que se dizem porta-vozes da ciência".

O ministro argumentou que a proibição "de tudo a qualquer momento" não é preservação, mas exagero. "Temos que ter muito equilíbrio, ouvir quem conhece a realidade na prática. Muitos desses estudos e opiniões que vêm de fora desconhecem completamente as necessidades do local", falou.

Confrontado por senador, ministro nega desmonte

Confrontado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES) de que entrou para a história como ministro que operou um "verdadeiro desmonte" na área ambiental, Salles negou e culpou gestões passadas.

"Nós recebemos esse desmonte. O desmonte foi feito antes de nós. Recebemos o Ibama e o ICMBio com 50% do seu quadro de pessoal faltando, com orçamento deficitário, com problemas graves de infraestrutura. Então, estamos tentando, em meio a esse caos que o governo herdou de administrações passadas - e aí me refiro ao caos não só na parte de gestão, mas ao caos econômico, seja da corrupção, seja da desorganização do Estado, enfim -, estamos tentando arrumar a casa com os recursos que nós temos, lembrando que há necessidade de informatização", falou.

Mais cedo na audiência, Salles disse que o governo federal aumentou para 3 mil o número de brigadistas no programa para o setor, o que representaria o dobro de 2019, e aumentou para dez os aviões que lançam água para combater as chamas.

Porém, apesar de o desmatamento no país ter aumentado, as sanções impostas pelo Ibama caíram 60% nos seis primeiros meses deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado.

Além disso, segundo o MPF (Ministério Público Federal), Ricardo Salles interferiu nas estruturas de fiscalização do Ibama após Bolsonaro pressionar sua equipe devido à destruição de maquinário usado por grileiros na Amazônia.

Delegado da Polícia Federal já afirmou que focos de incêndio identificados em junho e julho tiveram início em regiões pouco habitadas e distantes de Corumbá (MS) e dentro de propriedades rurais. De acordo com ele, "não tem como não terem sido ocasionados por ação humana".

Na reserva particular do Patrimônio Natural Sesc Pantanal, na região de Barão do Melgaço, em Mato Grosso, peritos apontaram que o incêndio aconteceu por queima intencional de vegetação desmatada para criação de área de pasto para gado.

Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, servidores públicos federais da área ambiental também elaboraram um dossiê em que enumeram ações do atual governo que desmontam as políticas ambientais no Brasil, ao ver deles.