Estudo: savanização da Amazônia vai gerar calor extremo para 11,5 milhões
O aumento da temperatura média global somado ao processo de savanização da Amazônia vão deixar expostas a risco extremo de calor 11,5 milhões de pessoas até 2100. O dado consta no estudo "Desmatamento e mudanças climáticas projetam aumento do risco de estresse térmico na Amazônia Brasileira", publicado hoje na revista Nature.
O artigo é assinado pelos pesquisadores brasileiros Beatriz Alves de Oliveira, Marcus Bottino, Paulo Nobre e Carlos Nobre. A pesquisa foi a primeira a analisar os impactos na saúde humana dos dois processos combinados e apontou que há um limite de desmatamento para adaptação e sobrevivência da nossa espécie.
Segundo o estudo, dos 5.565 municípios brasileiros, 16% deles —onde moram 30 milhões de pessoas— sofrerão impactos por estresse térmico com a savanização da floresta. Desses, 11,5 milhões têm risco extremo ao calor.
O processo de savanização é quando uma floresta se torna um território similar às savanas africanas ou o cerrado brasileiro, com campo ralo, árvores espaçadas e uma menor quantidade de folhas. E o processo, no caso da Amazônia, está perto de pode se tornar irreversível.
Norte mais prejudicado
Dessa população de 30 milhões de pessoas impactadas pelo maior calor, 42% residem em municípios da região Norte, que apresenta baixa capacidade de resiliência e alta vulnerabilidade social. As demais estão nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Para fazer o cálculo, os pesquisadores levaram em conta a meta estipulada no acordo de Paris, que estima um aumento da temperatura de 1,5ºC no planeta até o fim do século. Para a análise da população exposta foi usado o IVS (Índice de Vulnerabilidade Social) —que é baseado em 16 indicadores de saúde, educação, infraestrutura, renda e trabalho.
Os impactos potenciais do desmatamento e o aquecimento global na saúde humana exigem a formulação de políticas relacionadas à mitigação de riscos e vulnerabilidade", alertam os pesquisadores. "Em nossas projeções, a combinação de mudança no uso da terra e aquecimento global pode ampliar os riscos ocupacionais.
Pesquisadores na Nature
Segundo os dados publicados, o impacto do maior calor vai afetar especialmente populações vulneráveis.
"Esses fatores vinculam o processo de desmatamento ao aumento da desigualdade e vulnerabilidade, que atuam sinergicamente com os efeitos do clima", apontam.
Alerta para situação dramática
Segundo a autora Beatriz Oliveira, pesquisadora do escritório da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) no Piauí, a modelagem feita para o artigo substituiu a floresta original por um tipo de savana —o que ocorrerá caso não seja freado o atual processo de desmatamento.
"O que a gente viu é que —se não mantiver o serviço ecossistêmico florestal da Amazônia, substituindo essa cobertura vegetal— vai haver um aumento da temperatura a níveis que o nosso corpo pode não conseguir se adaptar. Se isso ocorrer, o estrago vai ser mais dramático ainda do que o que está sendo previsto nas metas do acordo de Paris", alerta.
Em síntese: se isso ocorrer, serão necessárias estratégias que demandem energia e moradias adaptadas. "Isso porque precisaremos de ventilação artificial, ar-condicionado. A ideia desse estudo é mostrar que, se a gente não tiver um modelo de desenvolvimento sustentável, a situação vai ser dramática", pontua.
Ela conta que o calor extremo pode causar uma série de reações graves ao ser humano.
Nosso corpo trabalha para que a gente possa manter essa temperatura fisiologicamente, de forma que a gente garanta que fique entre 36ºC, 37°C. E quando você está exposto a um calor extremo, integrado com a umidade do ar, você tem dificuldade de manter essa temperatura
Beatriz Oliveira
Levando em conta atividades em campo aberto, setores de trabalho devem ter um impacto ainda maior. "Imagina o cortador de cana, ou quem trabalha na construção civil, quem é esportista. Nós não vamos conseguir ficar expostos sem ter uma adaptação porque fisiologicamente não vamos suportar esse calor", finaliza.
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