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Após críticas, projeto de mineração em terras indígenas trava na Câmara

Já repudiado por lideranças indígenas e ambientalistas, PL foi criticado também pelas mineradoras - Secretaria do Meio Ambiente de Mato Grosso
Já repudiado por lideranças indígenas e ambientalistas, PL foi criticado também pelas mineradoras Imagem: Secretaria do Meio Ambiente de Mato Grosso

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

12/04/2022 04h01

Colocado sob regime de urgência na Câmara dos Deputados há um mês, o projeto de lei que libera mineração e usinas hidrelétricas em terras indígenas está longe de ir para votação. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia anunciado que criaria um grupo de trabalho para analisar o texto, mas não há expectativa do colegiado sair do papel.

A proposta, que é de autoria do governo, vinha sendo defendida e tratada como prioritária pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). No mês passado, porém, o Planalto e o Congresso foram surpreendidos com a repercussão negativa do projeto entre representantes do agronegócio e até da própria mineração. Ainda não se sabe quando e de que forma o texto será apreciado, segundo apurou o UOL.

Inicialmente, a previsão de Lira era que a proposta fosse votada "na primeira quinzena de abril". Para isso, segundo ele, seria criado um grupo de 20 deputados, sendo 13 majoritariamente alinhados ao governo, e sete da oposição. Os líderes partidários chegaram a discutir quais congressistas fariam parte do colegiado, mas o assunto esfriou nas últimas semanas.

A criação desse grupo de trabalho seria uma forma de evitar que o projeto fosse votado sem qualquer discussão prévia na Câmara. Isso porque as comissões temáticas da Casa, pelas quais o texto deveria tramitar normalmente, foram praticamente suspensas durante a pandemia, devido à dificuldade de reuniões presenciais.

Com a volta da atividade destes colegiados, desde o início do mês, a oposição deseja que a proposta seja analisada por uma comissão especial, e não mais pelo grupo de trabalho anunciado por Lira. Na última quarta, conforme apurou o UOL, Lira propôs aos líderes que fosse criado um grupo de trabalho mais amplo, para analisar todo o código de mineração, mas não há consenso sobre o assunto.

Para o deputado Nilto Tatto (PT-SP), que acompanha o debate por parte da oposição, a urgência sobre o tema foi esvaziada devido ao repúdio não apenas de lideranças indígenas e de ambientalistas, mas também do empresariado.

"Setores empresariais da agropecuária, e até da própria mineração, se posicionaram contra o projeto, porque entendem que ele vai ser muito ruim do ponto de vista da imagem do país. Eles entenderam que isso acabaria prejudicando a exportação de commodities, inclusive de minério", afirmou o congressista.

A pressão contra a proposta não partiu apenas do Brasil. Em parecer enviado em março à Câmara dos Deputados, logo após a aprovação do regime de urgência, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos afirmou que a liberação da mineração causaria um dano "irrecuperável" e "sem precedente" ao Brasil.

Histórico

Bolsonaro tem defendido a exploração de áreas protegidas desde antes de chegar ao poder, em 2019. Em abril daquele ano, já no comando do Executivo, ele recebeu líderes indígenas favoráveis à mineração para dar apoio à iniciativa. Na ocasião, disse que o estado de Roraima teria "trilhões embaixo da terra" e que "índio não pode continuar sendo pobre em cima de terra rica".

Meses depois, em fevereiro de 2020, o governo enviou ao Congresso o projeto de lei que está hoje em discussão. Mas o deputado Rodrigo Maia (sem partido-RJ), presidente da Câmara à época, prometeu a ambientalistas e lideranças indígenas que não colocaria o texto em votação.

Ao chegar ao comando da Câmara, porém, Lira passou a desengavetar este e outros temas de interesse de Bolsonaro. No último dia 9 de março, ele levou ao plenário um pedido do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Casa, para que o projeto tramitasse em regime de urgência.

Com 279 votos favoráveis e 180 contrários, a urgência foi aprovada apesar dos apelos de artistas e celebridades que foram a Brasília, naquele mesmo dia, para protestar contra a agenda de afrouxamento da proteção ambiental em andamento no país.

Apesar de não ter surtido efeito sobre os parlamentares, a pressão levou o STF (Supremo Tribunal Federal) a colocar em pauta a chamada "pauta verde", um conjunto de sete processos que questionam medidas de Bolsonaro sobre o meio ambiente. O julgamento destes temas, que começou no final de março, deverá se estender até maio.