Rosa Weber vota pela condenação de três dos quatro réus do Banco Rural
A ministra Rosa Weber votou pela condenação de três dos quatro réus do Banco Rural no julgamento do mensalão por gestão fraudulenta de instituição financeira. O voto da ministra foi lido nesta quarta-feira (5), no STF (Supremo Tribunal Federal), em Brasília.
Weber condenou os réus Kátia Rabello, ex-presidente do Banco; José Roberto Salgado, ex-vice presidente operacional; e Vinicius Samarane, ex-diretor estatutário e atual vice-presidente. A ministra votou pela absolvição de Ayanna Tenório, ex-vice presidente do banco.
Antes de Weber, o ministro-revisor Ricardo Lewandowski absolveu Tenório e Samarane, após ter condenado Rabello e Salgado na última segunda-feira. O relator, ministro Joaquim Barbosa, votou pela condenação dos quatro réus.
Segundo a Procuradoria Geral da República, autora da denúncia, o Banco Rural disponibilizou R$ 3 milhões para o PT e outros R$ 29 milhões para agências do empresário Marcos Valério, por meio de empréstimos fraudulentos, para financiar o "valerioduto" --que teria sido usado para comprar o apoio de parlamentares aliados no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Quatro dirigentes do Banco Rural são acusados de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de instituição financeira e evasão de divisas --exceto Ayanna Tenório, que é acusada apenas dos três primeiros delitos. Neste momento, os ministros votarão apenas no que diz respeito à gestão fraudulenta, deixando para outro item a análise sobre os demais crimes.
Para Rosa Weber, foi configurada gestão fraudulenta pela falta de transparência nas transações entre o banco e as agências. "A empresa do mesmo grupo [de Marcos Valério] estava sendo cobrada judicialmente enquanto os empréstimos eram concedidos pelo Banco Rural."
Ao concordar com denúncia da Procuradoria Geral da República sobre as negociações irregulares entre o PT, as empresas de Marcos Valério e o Banco Rural, a ministra Rosa Weber afirmou que “não se trataram de verdadeiros empréstimos, mas simulacros fraudulentos.”
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A ministra afirmou que chamou a atenção dela a maneira como Marcos Valério foi utilizado pelo Banco Rural para o banco ter mais influência no Banco Central. Weber citou o tráfico de influência feito por Marcos Valério, que intermediou reuniões com membros do governo e em algumas delas Kátia Rabello estava presente.
Weber afirmou que as defesas dos réus tentaram responsabilizar o ex-presidente do banco, José Dummont, morto em 2004, pelas irregularidades. Ele presidia o banco na época em que foram realizados alguns empréstimos. "Senti a tentativa de imputar as acusações a José Dummont", disse. “Não é possível atribuir-lhe a responsabilidade exclusiva”, afirmou a magistrada.
A ministra votou pela condenação de Samarane por entender que, embora ele não tenha assinado os empréstimos nem as renovações, ele omitiu dolosamente as informações.
Com relação à Ayanna Tenório, a ministra seguiu o revisor e concluiu “inexistir quadro probatório seguro de que tenha agido com dolo”. Ela afirmou não haver provas que comprovem que Tenório teve participação nas fraudes e citou documento que menciona que o seu cargo no banco era mais técnico.
Voto do revisor
Segundo o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, não há provas de que Tenório tenha responsabilidade nos empréstimos fraudulentos do banco para as agências de Marcos Valério, considerado o operador do mensalão. “Não fiquei convencido que a ré tenha agido de forma fraudulenta e ardilosa na gestão da instituição financeira”, disse Lewandowski.
O ministro afirmou que Valério e seus ex-sócios, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, confirmaram que não conheciam Tenório. "Não há nenhuma prova nos autos de que tivesse mantido contato com Marcos Valério."
Lewandowski afirmou também que Ayanna Tenório não tinha experiência profissional no setor bancário e citou depoimentos de testemunhas que comprovariam isso. O ministro argumentou que a carreira profissional da ré era focada em recursos humanos e gestão, o que não daria a ela conhecimentos sobre o setor bancário.
Para o advogado criminalista Gustavo Badaró, que é professor de direito processual da USP (Universidade de São Paulo) e acompanha na redação do UOL a sessão de hoje, o ministro considerou que não há prova que Tenório tenha tido a intenção de agir de forma fraudulenta.
"Ele entendeu que não há prova do que chama dolo específico, da intenção, o que levou à absolvição em relação à gestão fraudulenta", afirmou o advogado.
Sobre Vinícius Samarane, o revisor afirmou que a Procuradoria Geral da República não conseguiu provar a culpa do réu na renovação dos empréstimos às agências de Marcos Valério e ao PT. O ministro afirmou que, nas datas em que as renovações foram feitas, o réu não ocupava cargo com poder decisório sobre isso.
"Entendo que o Ministério Público, data vênia, não logrou em provar a participação do réu nos determinados fatos", afirmou Lewandowski. "[Samarane] não era gestor e não podia ser agente do crime de gestão fraudulenta", acrescentou.
O ministro disse também que, embora o próprio Samarane tivesse afirmado que ocupava cargo de direção, provavelmente para se gabar diante dos colegas, "na verdade, antes de 2004, não era diretor estatutário e não tinha poder para aprovar nenhuma transação bancária."
Após Lewandowski concluir seu voto, Joaquim Barbosa pediu a palavra e rebateu argumentos do colega, afirmando que Ayanna Tenório não agiu com "candura".
Veja o que disseram as defesas dos réus do Banco Rural
Outros réus do Banco Rural
Na segunda-feira (3), Lewandowski seguiu Barbosa e votou pela condenação de Kátia Rabello, ex-presidente do banco, e José Roberto Salgado, ex-vice-presidente operacional, por gestão fraudulenta.
A exemplo de Barbosa, o revisor considerou que os empréstimos foram fraudulentos: "Não apenas as concessões dos empréstimos, aqui tratados, e suas sucessivas renovações, em total desacordo com as mais comezinhas normas de prudência bancária, como também o reiterado mascaramento da classificação de riscos, caracterizam a saciedade de gestão fraudulenta de instituição financeira”, resumiu.
Outro lado
A assessoria de imprensa do Banco Rural divulgou na terça-feira (4) a íntegra dos memoriais entregues pelos advogados de dois réus do banco para os ministros do STF. Os documentos foram entregues pelos advogados de defesa Márcio Thomaz Bastos –defensor de José Roberto Salgado (veja aqui a íntegra)-- e Maurício Campos e Rodrigo Pacheco, que defendem Vinicius Samarane (veja aqui a íntegra). Também os advogados de Kátia Rabello entregaram o documento, mas a íntegra não foi divulgada.
O intuito dos documentos é rebater os argumentos dos ministros e tentar convencer os demais magistrados da inocência de seus clientes.
Próximos votos
Pela ordem regimental, após Weber, proferirão os votos sobre estes réus os ministros: Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, que, como presidente da Suprema Corte, é sempre o último a votar.
O ministro Celso Peluzo, que completou 70 anos na segunda-feira, teve que se aposentar compulsoriamente do STF e não julgará os próximos réus do processo, deixando a Corte com dez ministros.
Réus já condenados
Até o momento, a Suprema Corte já condenou o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) pelos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção passiva e peculato (uso de cargo público para prática de desvios).
Também foram condenados os publicitários Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz (ambos ex-sócios de Valério) e Henrique Pizzolato (ex-diretor de marketing do Banco do Brasil) por peculato e corrupção (passiva para Pizzolato e ativa para os publicitários). O ex-diretor do BB também foi condenado por lavagem de dinheiro.
As condenações estão relacionadas com os contratos das empresas de Valério com o Banco do Brasil e com a Câmara dos Deputados. A única absolvição, até o momento, foi a do ex-secretário de Comunicações do governo Lula, Luiz Gushiken, por falta de provas.
Julgamento fatiado
A pedido do relator, o julgamento vem sendo realizado em partes ou “fatias” para facilitar, na visão de Barbosa, o entendimento dos cenários em que cada um dos réus está inserido nos núcleos e delitos que compuseram o complexo esquema de corrupção que ganhou a denominação de mensalão.
Pela ordem divulgada por Barbosa, o primeiro item votado foi o 3 (corrupção no Banco do Brasil e na Câmara dos Deputados) e agora os ministros analisam o item 5 (sobre gestão fraudulenta). Em seguida, serão apreciados os itens 4 (sobre lavagem de dinheiro), 6 (referente à corrupção envolvendo partidos da base aliada do governo Lula), 7 (lavagem de dinheiro por parte do PT), 8 (evasão de divisas) e 2 (formação de quadrilha).
Apenas ao final do julgamento dos itens do processo os ministros irão discutir e definir as penas que deverão ser aplicadas aos réus condenados.
Entenda o dia a dia do julgamento
Entenda o mensalão
O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus --um deles, contudo, foi excluído do julgamento no STF, o que fez o número cair para 37-- e entre eles há membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.
O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.
O tribunal analisa acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.
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