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Deputados que tiveram doações da Vale dizem manter isenção em investigações

Na Câmara, 11 dos 17 deputados da comissão externa criada receberam doações da Vale - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Na Câmara, 11 dos 17 deputados da comissão externa criada receberam doações da Vale Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

Do UOL, em Brasília

14/11/2015 06h00

Os deputados que receberam doações de campanha de empresas do grupo Vale negaram que as contribuições eleitorais influenciem seu trabalho nas comissões criadas para acompanhar as consequências do rompimento das barragens da Samarco, na cidade de Mariana, em Minas Gerais.

A Samarco é controlada pela Vale e pela BHP Billinton. A reportagem do UOL identificou R$ 2,6 milhões em doações eleitorais que pagaram parte dos custos de campanha de 25 deputados federais e estaduais. Os parlamentares são membros titulares de comissões criadas nesta semana para apurar as causas da tragédia e as providências adotadas. São três ao todo, na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas de Minas Gerais e do Espírito Santo, Estado que também foi afetado no desastre ambiental.

Na comissão criada na Câmara, tiveram gastos de campanha bancados por empresas ligadas a Vale os deputados Laudívio Carvalho (PMDB-MG), Gabriel Guimarães (PT-MG), Leonardo Monteiro (PT-MG), Paulo Abi-ackel (PSDB-MG), Rodrigo de Castro (PSDB-MG), Paulo Foletto (PSB-ES), Eros Biondini (PTB-MG), Mário Heringer (PDT-MG), Subtenente Gonzaga (PDT-MG), Fábio Ramalho (PV-MG), Brunny (PTC-MG), Lelo Coimbra (PMDB-ES) e Givaldo Vieira (PT-ES).

Na Assembleia mineira, Agostinho Patrus Filho (PV), Thiago Cota (PPS), Gustavo Corrêa (DEM), Gustavo Valadares (PSDB) e Gil Pereira (PP). No Legislativo do Espírito Santo, foram beneficiados Guerino Zanon (PMDB), Janete de Sá (PMN), Rodrigo Coelho (PT), José Carlos Nunes (PT), Gildevan Fernandes (PV) e Bruno Lamas (PSB).

A reportagem do UOL procurou, entre quinta-feira (12) e sexta-feira (13), todos os deputados citados nesta reportagem por meio de e-mail e por telefone. Onze deles não se manifestaram.

O deputado federal Lelo Coimbra (PMDB-ES) afirma que as doações, repassadas a ele pelo partido, “em nada” influenciam seu trabalho.

Coimbra diz ter enviado representações ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e ao diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daielo, para a abertura de inquérito policial contra a mineradora Samarco. “A responsabilidade da Samarco é compartilhada pelas duas principais acionistas, a Vale e a australiana BHP Billiton”, diz. “Portanto, todas são responsáveis jurídica e socioambientalmente por esse crime/desastre”, ele afirma.

O deputado federal Givaldo Vieira (PT-ES) afirma ser contra o financiamento por empresas às campanhas mas diz que as doações não afetam seu trabalho. “Posso assegurar que de minha parte não influencia em nada. A responsabilidade que tiver que ser cobrada da Vale será cobrada da mesma forma que cobraria de qualquer outro, independentemente dessa doação”, afirma.

“A empresa sabe muito bem que não vou refrescar se ela estiver errada”, diz a deputada estadual Janete de Sá (PMN-ES), que é dirigente do sindicato dos ferroviários e funcionária da Vale.

“Vejo com naturalidade a doação pelo fato de a mineração ser um dos principais segmentos econômicos do nosso Estado”, diz o deputado da Assembleia mineira Gustavo Valadares (PSDB). “Reafirmo que em nada tal auxílio irá tirar a imparcialidade de minha atuação na comissão extraordinária”, afirma.

“Fico muito tranquilo em participar da comissão. Vamos apurar todas as barragens do Estado”, diz o deputado estadual mineiro Gustavo Corrêa (DEM).

Deputado federal, Paulo Foletto (PSB-ES) diz acreditar que a Vale fez doações à sua campanha devido à “seriedade” de sua atuação como parlamentar. “Isso não muda em nada a maneira como vou me comportar”, afirma. “Eu já falei que a Samarco é culpada”, diz Foletto.

O petista Leonardo Monteiro (MG) afirma que a contribuição registrada por sua campanha a deputado federal foi feita por causa de doação que recebeu do partido e que ele nunca pediu doações ou teve contato com executivos da Vale. “Fiz questão de não pedir. Recebi uma doação do partido. O PT tem doações de várias entidades”, afirma Monteiro.

Laudívio Carvalho (PMDB-MG), deputado federal, afirma que a doação da Vale registrada por sua campanha se refere a material de campanha elaborado pelo partido e que o fato não influencia em “absolutamente nada” seu trabalho na comissão. “Foi uma doação feita pelo partido e não foi em espécie [dinheiro], foi doação por pagamento de propaganda eleitoral”, diz.

O subtenente Gonzaga, deputado federal pelo PDT mineiro, afirma que a contribuição registrada em sua prestação de contas se refere a material feito pela campanha de seu então candidato ao governo de Minas Gerais, que incluiu sua imagem nas peças publicitárias. “Concretamente, não tenho e não fiz nenhum contato com a Vale e muito menos com o comitê pedindo material. Eles [o comitê de campanha ao governo] que fizeram. É uma formalidade da prestação de contas”, diz.

O deputado federal Fábio Ramalho (PV-MG) criticou o foco da reportagem. “Chega a ser estranho que o jornal [sic] utilize uma doação de um valor simbólico e inexpressivo, 613 reais, como insinuação de imparcialidade do mandato eleito pelo voto de 83.567 mil pessoas que recebi na última eleição, de modo que configura um desrespeito às instituições e a minha legitimidade de representante do povo”, diz o deputado.

O deputado federal Rodrigo de Castro (PSDB-MG) afirma atuar com “independência” e diz que as doações são permitidas por lei e não comprometem sua atuação. “É importante que a Câmara dos Deputados esteja presente exigindo que a mineradora Samarco arque com suas responsabilidades em relação aos danos causados”, diz.

O deputado estadual José Carlos Nunes (PT-MG) afirma que a doação foi feita de forma legal e que "em nada afetará ou influenciará minha atuação como legislador", diz.

“As empresas que contribuíram com a minha campanha são empresas sérias e idôneas, o fato de a tragédia em minha cidade (Mariana) envolver uma mineradora não absolve a mesma de receber todas as cobranças e investigações por parte desta comissão ou da minha pessoa”, afirma o deputado estadual Thiago Cota (PPS-MG). “Agora é preciso ações da Samarco e do governo para amparar essas famílias de forma justa e correta”, afirma.

O deputado estadual Bruno Lamas (PSB-ES) afirma que a doação eleitoral não retira seu “direito e obrigação de fiscalizar e cobrar providências” da Samarco. “É inadmissível uma empresa  com o porte da Samarco ter sido tão displicente e irresponsável”, diz.

O deputado estadual Rodrigo Coelho (PT-ES) afirma que sua campanha não foi financiada pela Samarco ou suas acionistas. “Estou certo que segue intacta a minha isonomia”, diz Coelho. O site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), no entanto, indica repasses indiretos no valor de R$ 2.096, por meio de doação da Vale Energia à campanha do deputado federal Helder Salomão (PT-ES), que pagaram atividades da campanha de Coelho.

O deputado estadual Guerino Zanon (PMDB-ES) afirma que a doação foi feita ao partido e que ele só tomou conhecimento de que a contribuição teve origem em doações da Vale Energia no momento da prestação de contas de campanha. “Não vai influenciar, e nem pode. Eu já fiz várias falas [afirmando] que é uma ação criminosa o que foi feito com o meio ambiente e com as pessoas, provocado tanto pela irresponsabilidade da empresa e suas acionistas majoritárias quanto dos órgãos fiscalizadores”, afirma Zanon.