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Janot diz que versões de Temer sobre relação com Joesley "colidem entre si"

O presidente Michel Temer (PMDB) - Eraldo Peres - 19.mai.2017/Associated Press
O presidente Michel Temer (PMDB) Imagem: Eraldo Peres - 19.mai.2017/Associated Press

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

27/06/2017 04h00

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, diz na denúncia que ofereceu nesta segunda-feira (26) contra o presidente Michel Temer (PMDB) por corrupção passiva que as versões apresentadas pelo mandatário sobre sua relação com o empresário Joesley Batista, dono da JBS, "colidem entre si".

CONFIRA A ÍNTEGRA DA DENÚNCIA

Segundo Janot, Temer se valeu do cargo de presidente para receber vantagem indevida de R$ 500 mil, por meio de Loures, oferecida por Joesley, cuja delação desencadeou a atual investigação. De acordo com a denúncia, Temer e Loures ainda "aceitaram a promessa" de vantagem indevida de R$ 38 milhões.

Janot afirma que Temer fez uma "confissão extrajudicial" ao admitir publicamente ter se encontrado com Joesley à noite, sem previsão em agenda oficial, no Palácio do Jaburu, sua residência oficial em Brasília. O procurador-geral diz que o presidente não só reconheceu a reunião, "como o conteúdo das conversas, apresentando apenas sua versão a respeitos dos fatos."

A denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) lembra declarações públicas de Temer dizendo que teria recebido Joesley na noite de 7 de março por causa da Operação Carne Fraca, que teve a JBS como um dos alvos. No entanto, a conversa aconteceu antes da operação. Com isso, Temer disse que "se equivocou".

Outro fato citado por Janot é a viagem de Temer, em 2011, em um avião da JBS. Primeiro, o governo negou que Temer tivesse feito tal viagem. Depois, admitiu que o fez, mas declarou que o então vice-presidente da República não sabia quem era o dono da aeronave.

A PGR ainda contesta a declaração pública de Temer de que recebeu Joesley à noite no Palácio do Jaburu como receberia "muitos empresários, políticos, trabalhadores, intelectuais e pessoas de diversos setores da sociedade brasileira”. Segundo a denúncia, "não há quaisquer registros de compromissos" de Temer após as 22 horas, e o presidente "também se recusou a apontar quem seriam essas pessoas com quem se encontraria".

PF também rebate Temer 

Em seu relatório sobre a investigação do caso, igualmente apresentado na segunda-feira (26), a Polícia Federal também rebate declarações públicas de Temer sobre a relação dele com Joesley. 

A PF cita, por exemplo, pronunciamento de Temer em que ele comenta trechos do áudio da conversa com Joesley, gravada secretamente pelo empresário e incluída em seu acordo de delação premiada com a PGR. Segundo o presidente, o já famoso trecho "Tem que manter isso, viu?" se referia apenas à manutenção das boas relações de Joesley com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Para a polícia, a "hipótese interpretativa" do presidente "não se coaduna com o todo." 

"Os termos do diálogo, conquanto não sejam explícitos --como costumam não ser em conversas desse jaez [espécie]-- têm como única interpretação possível, a seguinte: o Exmo. Sr. Presidente da República entendeu que o 'bom relacionamento' aludido por Joesley encerrava a ideia de apoio financeiro prestado a Eduardo Cunha e, assim, inequivocamente, incentivou a sua manutenção com as expressões 'tem que manter isso, viu?', seguindo-se a complementação do empresário: 'todo mês'", diz o relatório da PF.

Outro trecho em que a PF contesta Temer é o momento em que Joesley diz que estaria corrompendo juízes e um procurador. Em pronunciamento, o presidente disse não ter acreditado no que o empresário contou e o desacredita como "um conhecido falastrão, exagerado".

No relatório, a PF defende que Temer tinha a obrigação de levar as revelações de Joesley às autoridades competentes e contesta o fato de um presidente assumir compromissos com um "falastrão".

"Tivesse o empresário sido realmente considerado um 'conhecido falastrão, exagerado', como definido em pronunciamento à Nação, não teria Sua Excelência endossado, na mesma conversa, a sua pretensão de encaminhar pleitos diretamente ao atual Ministro de Estado da Fazenda, Henrique Meirelles, notadamente envolvendo o comando de órgãos importantes da estrutura federal, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM)."

A gravação da conversa do dia 7 de março mostra que Temer garantiu a Joesley um "alinhamento" com Meirelles. A promessa vem depois de o empresário reclamar da relação com o ministro e das tentativas aparentemente infrutíferas de fazê-lo influenciar dirigentes de órgãos como o Banco Central e a CVM, entre outros.

No dia 18 de maio, quando a gravação veio a público, Temer e Meirelles negaram irregularidades.

Câmara precisa autorizar processo

Se a denúncia for aceita pelo STF, Temer se torna réu e fica afastado do cargo por 180 dias. Caso o processo não seja julgado nesse prazo, o presidente reassume as funções.

Câmara precisa aprovar denúncia para o presidente ser afastado? Entenda

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Mas, primeiro, é preciso que a Câmara dos Deputados autorize o processo, pelo voto de ao menos 342 dos 513 deputados. O governo calcula ter apoio suficiente para barrar a denúncia na Câmara.

Antes de ser votado em plenário, o caso é analisado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, onde o presidente apresenta sua defesa.

Se autorizado pelos parlamentares, o processo retorna ao STF e caberá aos 11 ministros decidirem se abrem processo contra o presidente, o que o transformaria em réu.

As investigações

Temer é investigado num inquérito que apura suspeitas de corrupção, obstrução da Justiça e organização criminosa. A investigação foi aberta a partir da delação premiada de executivos da JBS.

O presidente foi gravado, sem saber, pelo empresário Joesley Batista, um dos donos do grupo, durante um encontro fora da agenda oficial em 7 de março no Palácio do Jaburu, residência oficial do presidente.

No diálogo, Temer aparenta indicar o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), que foi também assessor do Planalto, como seu homem de confiança, com quem Joesley poderia tratar de assuntos de interesse da JBS.

Veja a transcrição desse trecho da conversa, feita pela Polícia Federal:

Joesley - O brabo é... enfim, mas vamos lá. Eu queria falar sobre isso. Falar como é que é que... para mim falar contigo qual é a melhor maneira... porque eu vinha falando através do Geddel ... através... eu não vou Ihe incomodar, evidente, se não for algo assim...
Temer - [ininteligível]
Joesley - Eu sei disso, por isso é que...
Temer - [ininteligível]
Joesley – É o Rodrigo?
Temer - É o Rodrigo.
Joesley - Então ótimo.
Temer - [...] vou passar para o Meirelles [...] da minha mais estrita confiança [...]
Joesley - Eu prefiro combinar assim, se for alguma coisa que eu precisar... tal... taI... eu falo com o Rodrigo. Se for algum assunto desse tipo ai [...]

Seis dias depois, Joesley se encontrou com Rodrigo Loures e, segundo a Polícia Federal, ambos fizeram menção ao aval de Temer para as tratativas entre eles.

Veja a transcrição da Polícia Federal:

Loures -  Ele queria acho que falar com você, que eu vi num é, que ele, da outra vez, ele perguntou naquele dia, mas ele te disse o que que era, eu disse ô presidente, nem disse, nem eu perguntei. Sendo assim, diga a ele que se ele quiser falar, pode falar com você.
Joesley - Isso.
Loures -  Ele só vai falar, se ele quiser falar, então tem que deixar o homem à vontade.
Joesley - Agora tá autorizado, que ele autorizou, pronto.

No segundo encontro entre Joesley e Loures, no dia 16 de março, o empresário expõe seu interesse na resolução pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) de uma disputa comercial entre uma usina termelétrica do grupo e a Petrobras, na compra de gás da Bolívia.

Na ocasião, Joesley chega a citar a possibilidade de pagamento de 5% do lucro obtido na operação caso a usina do grupo fosse beneficiada.

Na sequência, no dia 24 de abril, Loures se encontra com o diretor de relações institucionais da J&F, grupo que controla a JBS, Ricardo Saud, também delator. Nessa conversa, Saud oferece a Loures, em troca da resolução do problema no Cade, pagamento de propina que poderia chegar a R$ 1 milhão por semana, segundo conclui a Polícia Federal.

Dali a quatro dias, em 28 de abril, Loures seria flagrado numa operação da Polícia Federal recebendo R$ 500 mil em dinheiro, dentro de uma mala entregue por Saud, em uma pizzaria de São Paulo.

A suspeita da Procuradoria é de que o dinheiro se refere a propina para que o governo atendesse interesses empresariais de Joesley.

Ouça a íntegra da conversa entre Temer e Joesley 18/05/2017 20h12

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O que dizem as defesas

O presidente Temer tem afirmado não ter cometido qualquer irregularidade e classificou como "fraudulenta" a gravação apresentada por Joesley.

Os advogados do presidente contrataram uma perícia independente que apontou possíveis pontos de edição no áudio.

A defesa de Rocha Loures tem recorrido ao STF para pedir a liberdade do ex-deputado, preso preventivamente desde o último dia 3, e afirmou que “a mala de dinheiro, segundo afirmam, decorreu de armação de Joesley Batista”, disse o advogado Cezar Bitencourt, em nota divulgada na última quarta-feira (21).

Nesta segunda-feira (26), em cerimônia no Palácio do Planalto, Temer afirmou que nada o "destruirá" ao citar medidas econômicas propostas por seu governo.

"Não há plano B, há que se seguir adiante. Portanto, nada nos destruirá. Nem a mim nem a nossos ministros", afirmou.

O discurso de garantia da estabilidade econômica tem sido usado por aliados do presidente para defender que a Câmara barre eventual denúncia contra ele.