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PF decide integrar equipes, e Lava Jato perde grupo exclusivo no Paraná

Polícia Federal na sede da Justiça Federal em Curitiba - Rodrigo Félix Leal - 17.nov.2016/Futura Press/Estadão Conteúdo
Polícia Federal na sede da Justiça Federal em Curitiba Imagem: Rodrigo Félix Leal - 17.nov.2016/Futura Press/Estadão Conteúdo

Nathan Lopes*

Do UOL, em São Paulo

06/07/2017 14h22Atualizada em 06/07/2017 21h11

A Polícia Federal decidiu integrar os grupos de trabalho dedicados às operações Lava Jato e Carne Fraca na Superintendência Regional no Paraná à Delecor (Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas). A informação foi divulgada pela instituição nesta quinta-feira (6) por meio de nota. Com isso, deixa de existir em Curitiba uma equipe dedicada exclusivamente às investigações envolvendo a Lava Jato.

Segundo o UOL apurou com fontes ligadas à investigação, a PF já estava "praticamente parada” na operação na Operação Lava Jato. “Eles não conseguem dar andamento a qualquer apuração nova”, disse um integrante da equipe que não quis se identificar.

De acordo com outra fonte da PF consultada pela reportagem, a reestruturação em si não é negativa, já que há "muitas interconexões entre diversas investigações". O maior problema, entretanto, segundo essa fonte, é a quantidade escassa de agentes diante da "quantidade monstruosa" de material a ser analisado.

Segundo a PF, "o atual efetivo na Superintendência Regional no Paraná está adequado à demanda e será reforçado em caso de necessidade". A corporação afirmou ainda que a integração de equipes "visa priorizar ainda mais as investigações com maior potencial de dano" aos cofres públicos e que a nova organização vai reduzir a carga de trabalho dos delegados atuantes na Lava Jato.

De acordo com o comunicado, o número de policiais dedicados às investigações no Paraná chegará a 70. A assessoria de imprensa da PF não soube precisar se esta quantidade de policiais é maior ou menor do que o efetivo dedicado atualmente à Lava Jato ou às investigações no Estado. 

A iniciativa da integração, segundo a PF, foi do delegado regional de Combate ao Crime Organizado do Paraná, Igor Romário de Paula, coordenador da Operação Lava Jato no Estado.

Reportagem publicada no site da revista "Época" afirma que a decisão do fim do grupo de trabalho da Lava Jato foi comunicada informalmente aos quatro delegados que ainda restavam na equipe.

Ao anunciar a integração, a Superintendência da PF informa que “foi firmado o apoio de policiais da Superintendência do Espírito Santo", incluindo dois ex-integrantes da Operação Lava Jato”, os delegados Márcio Anselmo e Luciano Flores.

“O modelo é o mesmo adotado nas demais superintendências da PF com resultados altamente satisfatórios, como são exemplos as operações oriundas da Lava Jato deflagradas pelas unidades do Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo, entre outros”, diz a instituição. Investigações da PF relacionadas à Lava Jato acontecem em 16 Estados e no Distrito Federal.

Críticas da procuradoria

Integrantes do MPF (Ministério Público Federal) tratam a questão como o fim da força-tarefa da Lava Jato. Na noite desta quarta (5), o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima usou sua página no Facebook para criticar a liberação de emendas parlamentares pelo governo Temer em contraste com a falta de verbas para a Polícia Federal. "A Força-tarefa da Polícia Federal na operação Lava Jato deixou de existir", escreveu. 

No fim de junho, a PF suspendeu a emissão de passaportes por tempo indeterminado alegando falta de orçamento para a atividade. Segundo a ADPF (Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal), a medida é o aspecto "mais visível do desmonte sofrido pela Polícia Federal"

O MPF deve se manifestar a respeito da mudança informada pela PF por meio de comunicado ainda nesta quinta-feira.

No fim de maio, em entrevista após a 41ª fase da Lava Jato, o delegado Igor Romário de Paula, coordenador da força-tarefa da PF em Curitiba, disse que a equipe dedicada à operação possuía seis delegados e que estava sendo “difícil dar continuidade para o trabalho da forma satisfatória como sempre foi”.

Na mesma ocasião, o delegado disse que estavam em curso 120 procedimentos instaurados no âmbito da PF em Curitiba. "Tendo em vista que cada delegado do grupo de trabalho da Lava Jato possuía cerca de vinte inquéritos cada um, essa equipe, juntamente com o grupo de trabalho da Carne Fraca, passou a integrar a Delecor", informou a Superintendência na nota desta quinta.

No primeiro discurso após tomar posse em maio, o novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou que a Lava Jato é "programa de Estado, não de governo".

Na última terça-feira (4), cinco procuradores da Lava Jato participaram de um evento em Curitiba para fazer uma defesa da força-tarefa. Segundo eles, a operação precisa ter mais apoio popular para resistir às pressões dos políticos interessados em acabar com as investigações.

“A Operação Lava Jato deu certo, porque o poder político estava sem unidade. Nós vivíamos em um governo que estava fragilizado, e muitos que estavam na oposição viram uma oportunidade, não dando apoio ao governo do PT e pensando que nós estávamos investigando o PT, não a corrupção. Quando perceberam, a investigação ganhou força e já era tarde para eles se unirem. Agora, estamos vivenciando uma unidade das forças políticas e a [Operação] está em situação de perigo real”, disse Santos Lima no evento.

Repercussão

A decisão anunciada nesta quinta pela PF foi avaliada com preocupação por dois especialistas em gestão pública. A Transparência Brasil afirmou que a medida “é mais um motivo de desconfiança” sobre o governo do presidente Michel Temer. Já a professora de direito internacional e comparado da USP (Universidade de São Paulo) Maristela Basso acredita que a decisão poderia representar um tiro no pé, considerando o momento atual.

Segundo a chefe de operações da Transparência, Juliana Sakai, não faltam elementos para desconfiança por parte do cidadão. Ela citou o episódio recente de plantas colocadas na entrada do Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer em Brasília. A medida impede a identificação de quem entra na casa.

“A gente vê uma Presidência totalmente sem moral e sem transparência. Esses episódios só corroboram para essa desconfiança, quando na verdade o cidadão quer esclarecimento e passar a limpo a situação do país e retomar sua confiança”, disse.

Sakai também citou o corte no orçamento da corporação, que resultou na suspensão, por tempo indeterminado, da emissão de passaportes. Nesta quarta (5), a PRF (Polícia Rodoviária Federal) anunciou a suspensão de serviços por falta de dinheiro.

“O que temos visto são conversas, áudios e ações que são verdadeiras provas de interferência nas operações, mas que ao mesmo tempo obriga o governo a se posicionar e defender o combate à corrupção”, disse.

Apesar de afirmar que ainda não é a hora de tirar conclusões sobre a mudança, a professora da USP afirmou que é certo que "seria bastante arriscado ter uma atitude no sentido de esvaziar a operação que é conhecida do povo brasileiro, que o povo brasileiro acredita".

Basso ponderou, contudo, que essa pode ser a forma encontrada pela instituição para driblar as dificuldades resultantes da falta de recursos. “É uma organização que tem penetração no Brasil todo, com um contingente maior de pessoas e com uma tradição investigativa que o Ministério Público não tem. Um trabalhava sozinho, agora vão trabalhar dois”, disse.

Leia a íntegra da nota:

Sobre o efetivo da Superintendência Regional no Paraná, a Polícia Federal informa:

1. Tendo em vista que cada delegado do Grupo de Trabalho da Lava Jato possuía cerca de vinte inquéritos cada um, essa equipe, juntamente com o Grupo de Trabalho da Operação Carne Fraca, passou a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (DELECOR);
2. A medida visa priorizar ainda mais as investigações de maior potencial de dano ao erário, uma vez que permite o aumento do efetivo especializado no combate à corrupção e lavagem de dinheiro e facilita o intercâmbio de informações;
3. Com a nova sistemática de trabalho, nenhum dos delegados atuantes na Lava Jato terá aumento de carga de trabalho, mas, ao contrário, ela será reduzida em função da incorporação de novas autoridades policiais;
4. O número de policiais dedicados a essas investigações chega a 70;
5. A iniciativa da integração coube ao Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado do Paraná, delegado Igor Romário de Paula, coordenador da Operação Lava Jato no estado, e foi corroborada pelo Superintendente Regional, delegado Rosalvo Franco;
6. O modelo é o mesmo adotado nas demais superintendências da PF com resultados altamente satisfatórios, como são exemplos as operações oriundas da Lava Jato deflagradas pelas unidades do Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo, entre outros;
7. Também foi firmado o apoio de policiais da Superintendência do Espírito Santo, incluindo os delegados Márcio Anselmo e Luciano Flores, ex-integrantes da Operação Lava Jato;
8. O atual efetivo na Superintendência Regional no Paraná está adequado à demanda e será reforçado em caso de necessidade;
9. Conforme nota divulgada no dia 21/05/2017, deve-se ressaltar que as investigações decorrentes da Operação Lava Jato não se concentram somente em Curitiba, mas compreendem o Distrito Federal e outros dezesseis estados;
10. Desde o início, a Polícia Federal, de forma republicana e sem partidarismos, trabalha arduamente para o êxito das investigações, garantindo toda a estrutura e logística necessária para o esclarecimento dos crimes investigados.

Divisão de Comunicação Social

*Colaboraram Bernardo Barbosa, Mirthyani Bezerra e Venceslau Borlina Filho