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PL de Bolsonaro para segurança se limita a 'operações de GLO'; entenda

Bolsonaro apresentou PL que amplia "legítima defesa" de militares e policiais durante operações de Garantia da Lei e da Ordem -
Bolsonaro apresentou PL que amplia "legítima defesa" de militares e policiais durante operações de Garantia da Lei e da Ordem

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

25/11/2019 04h01Atualizada em 25/11/2019 15h26

Resumo da notícia

  • Bolsonaro apresentou, na última semana, mais um PL sobre segurança pública
  • 'Ladrão de celular tem que ir para o pau', disse Bolsonaro, sem detalhar que o projeto versa somente sobre operações de GLO
  • Em pouco mais de 25 anos, os governos utilizaram pelo menos 136 vezes a GLO
  • PL de Bolsonaro é semelhante a decreto assinado pela autoproclamada presidente da Bolívia

"Quem estiver portando uma arma de forma ostensiva, vai levar um tiro", disse o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre Projeto de Lei (PL) que enviou ao Congresso na última semana sobre o excludente de ilicitude, sem comentar um detalhe importante: a proposta se restringe a Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

O projeto, apresentado durante o lançamento do que deverá ser o nono partido de sua carreira, propõe isentar de punições policiais e militares que cometerem excessos, incluindo assassinato.

Entenda o que está em discussão:

O que é a GLO?

As operações de Garantia da Lei e da Ordem estão estipuladas no artigo 142 da Constituição de 1988 e foram regulamentadas em 1997.

Elas ocorrem, conforme texto do Ministério da Defesa, "nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública, em graves situações de perturbação da ordem".

"Nessas ações, as Forças Armadas agem de forma episódica, em área restrita e por tempo limitado, com o objetivo de preservar a ordem pública, a integridade da população e garantir o funcionamento regular das instituições", diz o ministério.

Quantas vezes a GLO foi usada?

O dispositivo foi usado pela primeira vez em 1992, durante a organização da Eco 92 — a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente. Naquele ano, o Rio de Janeiro foi escolhido como sede para a chamada Cúpula do Clima, e 570 militares foram deslocados para fazer a segurança do evento.

Em 27 anos, os governos utilizaram 138 vezes a GLO (três delas durante a gestão de Jair Bolsonaro), sendo a mais duradoura delas, e também a mais conhecida, a intervenção militar no Rio de Janeiro assinada por Michel Temer (MDB) em 2017.

Durante um ano e cinco meses, centenas de militares das Forças Armadas ocuparam o estado fluminense a um custo de R$ 234 milhões aos cofres públicos. O UOL revelou, em fevereiro, que somente com operações do Exército os gastos somaram mais de R$ 72 milhões.

O Observatório da Intervenção, organizado pela Universidade Candido Mendes logo após o decreto da intervenção, contabilizou 6.041 mortes violentas durante a presença dos militares. Foi constatada uma redução de 1,7% em relação aos números de 2017, mas no interior do estado houve um aumento considerável nas mortes (15,8% em comparação ao mesmo período de 2017).

As mortes causadas por agentes do estado dispararam. Foram 1.375 mortos de fevereiro a dezembro de 2018, valor 33,6% maior do que o contabilizado em 2017. No interior do estado esse número subiu mais de 80%. 99 militares que participavam da intervenção morreram durante a operação.

No governo do capitão reformado, as operações de GLO foram decretadas em três momentos: para garantir a segurança externa de presídios federais em Roraima e Rio Grande do Norte (fevereiro e março); durante a crise das queimadas na Amazônia (agosto a outubro); e na cúpula dos Brics, entre 11 e 15 de novembro.

O que pode mudar?

O texto apresentado por Bolsonaro propõe um novo entendimento para "legítima defesa" de agentes das Forças de Segurança durante a GLO e diz que "não é cabível a prisão em flagrante" para aqueles que atuarem assim.

O projeto também diz que age com legítima defesa os militares ou agentes que "repelem injusta agressão" e a tipifica:

  • atos de terrorismo
  • condutas capaz de gerar morte ou lesão corporal
  • portar ou utilizar "ostensivamente" arma de fogo.

Sobre a restrição de liberdade, Bolsonaro afirmou ontem que " o sniper pode executar o tiro sem qualquer problema, ele vai para casa tranquilo porque ele cumpriu o seu dever".

O texto, que ainda deve passar pelas duas Casas no Congresso para ser aprovado, também afirma que militares que cometerem excessos e, posteriormente, forem processados, serão representados pela Advocacia-Geral da União.

As diferenças com a proposta de Moro

Proposta semelhante, tratando do chamado "excludente de ilicitude", foi apresentada pelo ministro da Justiça Sergio Moro e rejeitada pelo Congresso.

A proposta figurava do 'pacote anticrime' e era mais ampla, alterando o Código Penal do país. O ex-juiz propôs alterar o artigo 23 daquele conjunto normativo incluindo dois parágrafos, um deles citando a possibilidade de isentar de punição o agente que cometer excesso em caso "de escusável medo, surpresa ou violenta emoção."

2º O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção
Proposta de Sergio Moro que consta no 'pacote anticrime'

No caso do PL apresentado pelo Executivo, a norma sobre o excludente de ilicitude valerá apenas em operações de GLO. A despeito de já ter sido rejeitada pelo Parlamento, o ministro Sergio Moro pediu, na última quinta (21), para que o Grupo de Trabalho que analisa o 'pacote anticrime' reconsidere e insira novamente o excludente de ilicitude no projeto, conforme revelado pela Folha de S. Paulo.

Semelhança com a Bolívia

O projeto de Bolsonaro é muito semelhante a um decreto assinado pela autoproclamada presidente da Bolívia, Jeanine Áñez, no último dia 17. Ela eximiu de punições os militares que "atuem em "legítima defesa ou estado de necessidade" quando estiverem "cumprindo suas funções constitucionais."

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) classificou o decreto assinado por Añez como "grave" e afirmou que o texto "estimula a repressão." Pelo menos 32 pessoas morreram durante as manifestações no país, segundo o balanço mais recente da Defensoria do Povo do Estado da Bolívia.