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Líder do centrão: 'Precisamos de chanceler que não seja da ala ideológica'

Carolina Marins, Douglas Porto, Felipe Oliveira e Thaís Augusto

Do UOL, em São Paulo, e colaboração para o UOL, em São Paulo

29/03/2021 15h16

Presidente nacional do PP, o senador Ciro Nogueira, do Piauí, afirmou hoje que o Brasil precisa de um chanceler que não seja da ala ideológica. A declaração foi dada horas após Ernesto Araújo pedir demissão do posto de ministro das Relações Exteriores.

"Não tenho nada pessoal contra ele, mas, neste momento, precisávamos de um ministro que colocasse o país em primeiro lugar, tivesse uma visão para nos ajudar a superar essa pandemia da melhor forma possível. Não temos outra alternativa a não ser imunizar a nossa população", disse Nogueira durante o UOL Entrevista, conduzido pelo chefe da sucursal do UOL em Brasília, Tales Faria, e pela repórter Luciana Amaral.

O ministro [Ernesto Araújo] não foi capaz, não teve os instrumentos nem a determinação de ajudar nosso país nesse momento.
Senador Ciro Nogueira (PP-PI)

"O que espero do novo ministro? Que não tenha uma visão ideológica e, sim, patriota. Somos um celeiro de alimentos no mundo, grande exportador de matérias-primas, temos que ter uma boa relação com os EUA, a China, a União Europeia."

Uma das principais críticas a Araújo no cargo foi com relação à falta de negociação diplomática pelas vacinas e insumos para sua produção.

Nogueira é um dos principais líderes do centrão, grupo informal de partidos que compõe hoje a base aliada do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Congresso Nacional. Um dos favoritos para assumir o Itamaraty é o embaixador do Brasil na França, Luis Fernando Serra, também visto como polêmico.

Parlamentares do centrão foram fundamentais na queda de hoje de Ernesto Araújo. Mesmo antes da demissão comentada pelo chanceler hoje com assessores —mas que ainda não confirmada pelo Itamaraty e o Palácio do Planalto—, senadores articulavam um pedido de impeachment contra Araújo.

A crise entre o chanceler e o Senado ficou ainda mais acentuada neste final de semana devido a declarações do ministro contra a presidente da CRE (Comissão de Relações Exteriores) do Senado, Kátia Abreu (PP-TO). Ele escreveu no Twitter que, em almoço no início de março, a senadora teria dito que seria o "rei do Senado" se fizesse um gesto em relação ao 5G. Ernesto disse não ter feito "gesto algum", porque isso não caberia a ele.

Com essa atitude e principalmente após a postagem contra a senadora Kátia Abreu, Nogueira diz que será difícil o Legislativo aprovar a indicação de Ernesto Araújo para qualquer outro cargo.

"O erro que cometeu ontem em atacar a senadora, a forma que ele colocou, desleal, não é fácil. É um direito de quem fizer esta indicação, mas eu, que conheço como poucos o Congresso Nacional, acho muito difícil passar o nome dele no atual momento."

Ernesto Araújo faz parte da ala ideológica do governo de Jair Bolsonaro, assim como o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Questionado se Salles também deveria sair do cargo, Ciro Nogueira negou e teceu elogios ao ministro.

"Eu sou um admirador do ministro do Meio Ambiente, homem competente, sério. Agora, a atuação do ministro do Meio Ambiente foi comprometida pelo posicionamento do ministério das Relações Exteriores, que atrapalhou e superdimensionou algumas situações."

Não defendo a troca do ministro. Confio no ministro Ricardo Salles, sou admirador do seu trabalho.
Senador Ciro Nogueira (PP-PI)

Hoje, pouco depois do anúncio da saída de Araújo, o vice-líder do Cidadania na Câmara, Daniel Coelho (PE), disse esperar que o ministro do Meio Ambiente tenha o mesmo destino do chanceler.

Questionado se o senado hoje aprovaria a indicação do filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para o cargo de chanceler, Ciro Nogueira afirmou que a possibilidade "não passa pela cabeça do presidente".

Condução da pandemia

Segundo o senador, todos os membros do Congresso Nacional têm uma parcela de culpa no agravamento da pandemia do novo coronavírus.

"A situação que estamos vivendo não tem inocentes, inclusive eu, o Congresso Nacional... Só na semana passada viemos a aprovar um Orçamento que deveria ser aprovado desde o ano passado, não fomos capazes de votar aquele orçamento", afirmou Nogueira.

"O presidente da República [Jair Bolsonaro] pode ter cometido alguns erros, não concordei com alguns posicionamentos dele, mas os governadores também tiveram um erro do tamanho do mundo. Receberam recursos como nunca na História e usaram para sanar suas contas públicas em vez de ter hospitais funcionando", criticou ele.

Temos que ter soluções. Temos 300 mil mortes e podemos chegar a 500 mil, é coisa de uma catástrofe sem precedentes na história do mundo, mas temos que enfrentar, dar a nossa contribuição. É o momento dos homens públicos assumirem, seja presidente, Congresso, Judiciário, prefeitos. governadores, a sociedade como um todo, para salvarmos vidas e sairmos dessa situação.
Senador Ciro Nogueira (PP-PI)

O líder do centrão elogiou o trabalho do general Eduardo Pazuello como ministro da Saúde. "Fui defensor do ministro da Saúde, general Pazuello, no passado. Ele foi muito importante naquele momento, muito melhor que o ministro [Luiz Henrique] Mandetta, que passava o dia dando entrevista e não tinha operacionalidade nenhuma."

Após críticas e até investigação pela forma como conduziu a pandemia, Pazuello deixou o cargo no último dia 15 e foi substituído pelo médico Marcelo Queiroga.

Agora tínhamos que ter outro ministro. Estou feliz com o trabalho do novo ministro, um homem que defende uma série de situações, tem a coragem de defender o uso de máscara, distanciamento social.
Senador Ciro Nogueira (PP-PI)

O senador disse que apoia a criação de um novo imposto, uma nova CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), para bancar o auxílio emergencial.

"Se acharmos a fonte [podemos aumentar o valor do auxílio emergencial]. Temos que ter responsabilidade e não fazer propostas absurdas. Uma quantidade de parlamentares veio dizer que '[o auxílio] tem que ser R$ 1.000'. Sim, mas quem vai pagar? Vamos tirar de onde? Se fizermos uma reforma administrativa, [criar] o teto do funcionalismo, aí teremos fonte. Vamos botar uma CPMF para o auxílio, eu defendo isso."

Mais identificação com Bolsonaro que com Lula

Segundo o senador, os partidos de centro se identificam mais com projetos do presidente Jair Bolsonaro do que com as propostas do PT. "Não mudamos de dois anos para cá, só temos uma identificação muito maior com o projeto do presidente Bolsonaro do que tínhamos com o PT, que apoiamos no passado".

"Bolsonaro foi eleito com o discurso de que não ia fazer aliança e ele viu que não tem como. O que já foi aprovado nesse país desde a redemocratização que não tenha o papel decisivo e a coragem dos partidos de centro? Nada. Nas últimas eleições, os partidos de centro tiveram o aval da população. É fruto de um trabalho que foi reconhecido pela população."

"Acho que seria um retrocesso muito grande ao país a volta do presidente Lula", pontua.

Ainda pensando em 2022, o líder do centrão comentou sobre a possibilidade do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, concorrer nas eleições. Para ele, falta "apelo político" para o ex-juiz da Lava Jato.

"Não acredito no Sergio, [a possível candidatura dele] é uma situação criada pelo momento político importante da Lava Jato, mas não tem apelo eleitoral nenhum. Se for candidato, é a deputado ou senador", disse Nogueira.