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CPI pede indiciamento de Osmar Terra e cinco membros do gabinete paralelo

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

20/10/2021 17h03Atualizada em 20/10/2021 17h03

O relatório final da CPI da Covid, lido hoje pelo Renan Calheiros (MDB-AL), pede o indiciamento de cinco membros do chamado gabinete paralelo, um dos focos da investigação. Segundo o documento, o grupo formado por médicos e empresários atuou em conjunto com o deputado Osmar Terra (MDB-RS), ex-ministro do governo Bolsonaro, e com o presidente do CFM (Conselho Federal de Medicina), Mauro Britto Ribeiro.

Os integrantes do grupo citados no relatório são os médicos Nise Yamaguchi e Luciano Azevedo, o biólogo Paulo Zanotto, o empresário Carlos Wizard e o ex-assessor da Presidência Arthur Weintraub, irmão do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub. A todos os cinco, a CPI pede o indiciamento pelo crime de epidemia com resultado morte, que prevê de 20 a 30 anos de prisão.

No relatório, os senadores consideraram que o gabinete paralelo assumiu "risco do resultado lesivo" quando orientou Bolsonaro a apostar em ideias como a imunidade de rebanho e o uso de remédios ineficazes contra a covid. A atuação do grupo, segundo a CPI, colaborou para que Bolsonaro divulgasse medidas nocivas à população.

"A pergunta é: a epidemia teria tomado o curso causal que tomou sem o assessoramento paralelo ao Presidente da República, que influenciou diretamente suas decisões e seu discurso desde o início? As ações e o discurso do Presidente, conforme amplamente exposto neste Relatório, influenciaram o comportamento de milhões de brasileiros desde março de 2020", questiona o texto.

A responsabilidade por essa influência, segundo a CPI, é do gabinete paralelo e do CFM. "Os integrantes do gabinete paralelo e o Presidente do CFM tinham conhecimento do uso que o Presidente estava fazendo das informações fornecidas, e ainda assim o assessoramento prosseguiu por todo o ano de 2020 e início de 2021".

Bula da cloroquina

O relatório da CPI cita a reunião ocorrida no Planalto, no início da pandemia, na qual o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, recebeu uma proposta de alteração da bula da cloroquina. A medida, segundo as investigações, não foi adotada porque teve a oposição de Antonio Barra Torres, presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Segundo a comissão, a proposta de alteração da bula, que se daria por meio de um decreto presidencial, partiu dos médicos Luciano Azevedo e Nise Yamaguchi, ambos indiciados. À CPI Yamaguchi negou ser autora da proposta e Azevedo não chegou a dar depoimento.

Outra reunião relevante, segundo a CPI, ocorreu em setembro de 2020, também no Planalto. No encontro, Bolsonaro e outros ministros receberam a associação Médicos Pela Vida, que atacava o uso de máscaras e distanciamento social enquanto estimulava o chamado tratamento precoce, com remédios ineficazes.

Durante a reunião, conforme registrado em vídeo, o virologista Paulo Zanotto, também indiciado no relatório, sugeriu a criação de um "shadow cabinet" (gabinete das sombras), secreto, para orientar o governo em relação às vacinas. Zanotto, que também não depôs à CPI, afirmou ao UOL que "o ônus da prova está em quem acusa".

Imunidade de rebanho

Segundo as conclusões da CPI, o gabinete paralelo orientou Bolsonaro a apostar na chamada imunidade de rebanho, que prevê a contaminação da maior parte da população até que se atinja uma proteção natural contra o vírus.

"A busca pela imunidade de rebanho por infecção levou Bolsonaro a resistir fortemente à implementação de medidas não farmacológicas, tais como o uso de máscara e o distanciamento social, bem como a demora na compra das vacinas e a recomendação de remédios ineficazes", anotou o relatório.

Segundo a CPI, o principal defensor da tese da imunidade de rebanho foi o deputado Osmar Terra, que deixou o governo em fevereiro de 2020 mas seguiu próximo do Planalto.

Terra, conforme o relatório, tratou da imunidade de rebanho não apenas com Bolsonaro, mas também com o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. A comissão compilou 11 entrevistas em que Terra defendeu o conceito. Em um dos vídeos, ele afirma que "não é a vacina que vai acabar com a pandemia, o que vai acabar com a pandemia é a imunidade de rebanho".

Além do crime de epidemia com resultado morte, que é atribuído ao gabinete paralelo, Terra também foi enquadrado por incitação ao crime, que prevê de três a seis meses de prisão ou multa. Segundo a CPI, ele foi um dos políticos que provocou "grande confusão na população, levando as pessoas a adotarem comportamentos inadequados para o combate à pandemia".

O UOL procurou a defesa de Terra para comentar as conclusões da CPI, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem. Ao dar depoimento à CPI, em junho, o deputado minimizou suas recomendações pela imunidade de rebanho, afirmando que ela "nunca foi uma estratégia" do governo.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.