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STF põe sob sigilo inquérito que mira Milton Ribeiro e pastores

4.fev.22 - Bolsonaro e o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro - Luis Fortes/MEC
4.fev.22 - Bolsonaro e o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro Imagem: Luis Fortes/MEC

Paulo Roberto Netto

do UOL, em Brasília

30/06/2022 13h20

O STF (Supremo Tribunal Federal) colocou sob sigilo o inquérito que mira o escândalo do balcão de negócios do MEC (Ministério da Educação), investigação que o ex-ministro Milton Ribeiro à prisão.

O caso retornou ao tribunal por decisão do juiz Renato Borrelli, da 15ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal. O magistrado atendeu a um pedido do MPF, que viu indícios de interferência do presidente Jair Bolsonaro na apuração.

Os autos enviados por Borelli chegaram ao STF ontem e, na sequência, o inquérito entrou em sigilo. A relatora é a ministra Cármen Lúcia, que deverá encaminhar o processo à PGR (Procuradoria Geral da União), a quem cabe avaliar o caso.

Cármen já enviou para a PGR outros 3 pedidos de investigação contra Bolsonaro por suposta interferência no caso. As petições foram assinadas pela oposição.

Integrantes da PGR e do MPF ouvidos pelo UOL avaliam que há elementos suficientes que justifiquem a abertura de uma apuração que pode mirar três possíveis crimes: favorecimento pessoal, violação de sigilo funcional e obstrução de justiça, cuja pena pode chegar a até cinco anos de prisão.

A decisão final, porém, cabe à equipe do procurador-geral Augusto Aras.

Suspeita de interferência

Milton Ribeiro citou Bolsonaro em um diálogo grampeado pela Polícia Federal. No diálogo, o ex-ministro diz que conversou com o presidente, que disse ter tido um "pressentimento" de que o Ribeiro poderia ser alvo da investigação como forma de atingi-lo. A conversa foi divulgada pela GloboNews e obtida pelo UOL.

"A única coisa meio... hoje o presidente me ligou... ele tá com um pressentimento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim, sabe? É que eu tenho mandado versículos pra ele, né?", disse Ribeiro.

A filha pergunta: "Ele quer que você pare de mandar mensagens?"

E o ex-ministro responde: "Não! Não é isso... ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... em casa... sabe... é... é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? Se houver indícios, né?".

Em ofício à Justiça Federal obtido pelo UOL, o delegado Bruno Calandrini, responsável pela investigação, disse que Milton Ribeiro estava "ciente" que seria alvo de buscas, e que teria obtido a informação "supostamente" através de um telefonema com o presidente da República.

Segundo o delegado Bruno Calandrini, as interceptações telefônicas detectaram três conversas que chamaram a atenção da PF: a primeira entre Milton Ribeiro e Waldomiro de Oliveira Barbosa Júnior, no dia 3 de junho, outra entre Ribeiro e um homem identificado como Adolfo em 5 de junho e a fala entre o ex-ministro e sua filha, Juliana Pinheiro Ribeiro de Azevedo, no dia 9 de junho.

"Nos chamou a atenção a preocupação e fala idêntica quase que decorada de Milton com Waldemiro e Adolfo e, sobretudo, a precisão da afirmação de Milton ao relatar à sua filha Juliana que seria alvo de busca e apreensão, informação supostamente obtida através de ligação recebida do Presidente da República", disse.

Milton Ribeiro e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura foram presos na quarta-feira passada (22) por suspeita de corrupção, prevaricação, tráfico de influência e advocacia administrativa. Eles foram soltos no dia seguinte por decisão do desembargador Ney Bello, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região).

Na sexta (24), o advogado Frederick Wassef negou que o presidente tenha conversado com Milton Ribeiro.

"O presidente Bolsonaro não tem nada a ver com este inquérito, não falou com ministro, não interferiu na Polícia Federal. É uma nova campanha de acusações infundadas", afirmou. "Todos os inquéritos, todas as acusações feitas até hoje contra o presidente Bolsonaro, ficou provado que não existe nada, sempre fica provado que ele é inocente".

Em nota, o criminalista Daniel Bialski, que defende Milton Ribeiro, nega que o ex-ministro tenha cometido "qualquer ilicitude".

"Quem conhece um pouco o funcionamento do Ministério da Educação sabe que o Ministro e nem ninguém tinha e ou tem poder para favorecer pessoas, cidades ou Estados porque há todo um procedimento formal que regula o andamento e avaliação dos benefícios pretendidos. Inclusive, aperfeiçoado na gestão exercida pelo Ministro Milton Ribeiro", disse.

"Balcão de negócios"

As investigações da PF miram a atuação de Ribeiro e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura em esquema para liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), órgão do governo controlado pelo centrão.

Os pastores são acusados de montar um "balcão de negócios" dentro da pasta ao supostamente cobrar propinas de prefeitos em troca de liberação de recursos do FNDE. O caso foi revelado pelo jornal "O Estado de S. Paulo".

Em março, áudio obtido pelo jornal Folha de S.Paulo revelou que o governo federal priorizou a liberação de recursos a prefeituras indicadas pelos pastores, que atuavam como lobistas na pasta, apesar de não terem cargos oficiais no governo.

Na gravação, o ex-ministro diz que o privilégio atenderia a solicitação de Bolsonaro, que negou ter orientado o então subordinado a cometer qualquer irregularidade.

Após a divulgação do áudio, o prefeito do município de Luis Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB), disse que o pastor Arilton Moura solicitou R$ 15 mil antecipados para protocolar as demandas da cidade, além de um quilo de ouro.

No dia seguinte, Ribeiro admitiu o encontro com pastores, mas isentou Bolsonaro de pedir "atendimento preferencial" aos líderes religiosos e lobistas do MEC.

O presidente da República não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem"
Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação, em nota divulgada em março

O inquérito inicialmente foi aberto no STF (Supremo Tribunal Federal), uma vez que Ribeiro tinha foro privilegiado. Em abril, a PGR afirmou que não via elementos para incluir o presidente Jair Bolsonaro (PL) no caso, uma vez que o nome do presidente é apenas mencionado na gravação do ex-ministro.

Após a demissão de Ribeiro, o caso foi enviado para a primeira instância.