Dados do governo põem gestão Rui Costa na BA como a 1ª em mortes violentas

A Bahia foi o estado brasileiro com o maior número de assassinatos nos últimos oito anos, com registro de pelo menos 49,5 mil homicídios entre 2015 e 2022. O número é 40% maior do que o do segundo colocado, ocupado pelo Rio. A gestão nessa época era do petista Rui Costa, atual ministro da Casa Civil.

O que aconteceu

Após a divulgação do Anuário da Segurança Pública, Rui Costa disse em entrevista à GloboNews que não reconhecia "dados de ONGs" sobre violência e afirmou que os estados usariam metodologia diferente —o que levaria a imprecisões em comparações.

O ministro sugeriu até que uma padronização de dados fosse feita pelo governo federal para evitar problemas.

Não reconheço nenhum parâmetro, nenhuma comparação, não reconheci e não reconheço, de ONGs que fazem publicações sobre questão de segurança. Porque estamos comparando coisas diferentes, melancia com abacaxi.
Rui Costa, ex-governador da Bahia e ministro no governo Lula, em entrevista

O anuário colocou a Bahia como dona da polícia que mais mata no país.

Os dados coletados pelo UOL são do Painel de Monitoramento do SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade), do Ministério da Saúde, e detalham as mortes por local de ocorrências, idade, sexo e raça. Os registros de 2022 ainda são parciais e podem ter novas inclusões.

A Bahia, sob gestão de Rui Costa, lidera o ranking, seguida por Rio (35,1 mil), Pernambuco (31,8 mil), Ceará (30,7 mil) e São Paulo (30,1 mil).

Procurada, a Casa Civil não se manifestou até a publicação da reportagem. Caso um posicionamento seja enviado, o texto será atualizado.

Dados do anuário são confiáveis

O Anuário da Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, tem como metodologia as informações das polícias e secretarias de todos os estados. Muitas vezes os números são informados apenas por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação). O próprio governo federal utiliza os dados do fórum em suas políticas públicas para segurança.

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Os números do Ministério da Saúde, apesar da contrariedade do ministro, deixam claro que a gestão Rui Costa teve uma violência acima da média nacional, como denunciam entidades de direitos humanos. Além disso, seu governo foi marcado por ataques a grupos que cobravam mais transparência nos dados.

O estado implementou um domínio da narrativa com controle dos dados da segurança. Ele foi junto à mídia local implementar um monopólio dos números. Falta transparência. Com informações nunca verificáveis, eles atacavam quem questionava os dados. Houve até uma criminalização de que informava dados diferentes.
Wagner Moreira, coordenador do grupo Ideas e articulador do Fórum Popular de Segurança Pública do Nordeste.

Nesta sexta (18), a quilombola Maria Bernadete Pacífico foi morta a tiros em Simões Filho, região metropolitana de Salvador. Criminosos teriam invadido o terreiro da comunidade, feito familiares reféns e assassinado a líder comunitária com disparos de arma de fogo.

Com a quarta maior população do país, a Bahia sempre teve patamares altos de violência, antes mesmo da gestão Rui Costa.

No índice mais atual de mortes violentas por agressão, calculado com base na taxa por 100 mil habitantes, em 2021, a Bahia aparece em segundo lugar, com taxa de 43,1. Em primeiro, está o Amapá com 46. O cálculo foi feito em colaboração com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

É um erro brigar com números. No caso da Bahia, a grande questão é que os números, revelados por várias fontes diferentes, revelam um padrão de uso letal da força completamente destoante do restante do país. Um governante deveria estar mais preocupado em buscar responder sobre as razões e as opções político-institucionais por trás desta realidade e apresentar ações e políticas públicas concretas que sinalizem mudanças.
Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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No Palácio do Planalto, o assunto da violência na Bahia virou um ponto delicado no governo e expõe Rui Costa. A herança da gestão do ministro e o atual comando de Jerônimo Rodrigues (PT) se opõem às promessas da gestão Lula (PT), embora não haja plano concreto do governo federal para solucionar a questão.

Quando a polícia do governo Rui Costa intensifica ação policial que gerou número crescente de mortes, sobretudo da população negra da periferia e mais pobre, isso faz o PT se aproximar da extrema direita na prática. Isso preocupa o governo porque, se o governo vai criticar o que foi a gestão de Jair Bolsonaro, ele agora tem teto de vidro.
Eduardo Grin, cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas)

"Epidemia de violência homicida"

Os dados do SIM são padronizados e levam em conta as declarações de óbito emitidas por médicos com a causa da morte. Eles deixam claro que o estado sofre com uma alta "epidemia de violência homicida", como a ONU (Organização das Nações Unidas) classifica locais com taxas de homicídio acima de 10 por 100 mil homicídios.

O Sistema de Informação sobre Mortalidade ainda revela que as mortes na Bahia atingem de forma desproporcional os negros. Entre os anos de 2015 e 2021, com dados já finalizados, das 44,1 mil mortes por agressão, pelo menos 40,3 mil (90%) foram de pessoas pretas ou pardas —há ainda 1.200 que não tiveram raça identificada nas declarações de óbito.

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A violência alta também vale para a letalidade policial. A Bahia teve registradas nos dados do SIM, até 2021, 3.690 mortes praticadas em intervenções legais, atrás apenas do Rio de Janeiro.

Nesse caso, vale ressaltar que os dados da Saúde não computam todas as mortes por intervenções legais, apenas aquelas que constam na causa da morte indicada pelo laudo do IML (Instituto Médico Legal).

Polícias da Bahia mataram mais que forças dos EUA

As polícias da Bahia mataram mais pessoas em supostos confrontos do que todas as forças policiais dos Estados Unidos juntas no ano de 2022. O UOL comparou dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Mapping Police Violence, dos EUA.

Em declaração após a chacina, o governo da Bahia classificou os mortos por policiais de bandidos. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia defendeu que as mortes causadas por PMs têm sido reduzidas em 2023 e ressaltou trabalhos positivos da corporação, como apreensão de armas de fogo e de toneladas de drogas, além de ações contra o tráfico de drogas.

Ressalta ainda que são constantes os investimentos em capacitação, tecnologia e inteligência para as forças de segurança do estado, buscando sempre, como principal objetivo, a preservação de vidas, bem como a legalidade das ações policiais.
Secretaria da Segurança Pública da Bahia, em nota

Errata:

o conteúdo foi alterado

  • Maria Bernardete Pacífico foi morta em Simões Filho, região metropolitana de Salvador, e não na capital baiana. A informação foi corrigida.

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