Mortes por covid-19 param de cair no Brasil e indicam início de nova alta
Resumo da notícia
- Em meados de maio, média de mortes se estabilizou perto de 2.000 por dia
- Número vinha caindo após picos registrados no mês de abril
- Queda na adesão ao distanciamento social também preocupa médicos
A média móvel de mortes por covid-19 no Brasil parou de cair e já sinaliza que está iniciando uma tendência de alta, rumo que a média de casos já registra desde o final de abril.
O cenário seria reflexo da flexibilizado medidas de restrição em diversos estados, da queda no ritmo de vacinação, e do fato de que, cada vez mais, parte da população tem desrespeitado as medidas de distanciamento social e de uso de máscara.
No último dia de abril, o país tinha uma média móvel diária de 2.523 óbitos. Em 15 de maio, caiu para 1.910 mortes. Desde então, a escalada recomeçou. Em 20 de maio, a média chegou em 1.971.
Nossa média móvel se estabilizou perto de 2.000 mortes por dia. Isso é alto demais. Alto demais"
Flávio Guimarães da Fonseca, presidente da SBV (Sociedade Brasileira de Virologia)
Para o virologista da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Flávio Guimarães da Fonseca, presidente da SBV (Sociedade Brasileira de Virologia), a interrupção na queda já era de se esperar. Ele cita que "houve uma abertura por parte das cidades, dos estados". "E quando isso acontece, comércio reabrindo, as pessoas passam a ter maior mobilidade novamente. E o que se vê é o índice de infecção aumentar."
O epidemiologista Wanderson Oliveira, secretário de Serviços Integrados de Saúde no STF (Supremo Tribunal Federal), diz que, na medida que se observa alguma redução nos números da pandemia, "a tendência é as pessoas relaxarem um pouco mais". "E acaba tendo mais contato. Depois de quarentena, você tem um aumento esperado." Oliveira esteve no Ministério da Saúde no início da crise sanitária.
"A população está cansada das restrições, mesmo sabendo dos perigos que corre, com infecções e reinfecções", pontua o infectologista Leonardo Weissmann, consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia)."Porém, o vírus se fortalece e circula com maior velocidade quando existe maior circulação de pessoas."
Distanciamento ainda necessário
Presidente da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia), o infectologista Carlos Magno Fortaleza reforça que ainda estamos em um momento com necessidade de restrições para tentar frear a disseminação do vírus, que já matou cerca de 450 mil pessoas no país. "Com essa ilusão que nós não temos de fechar muito, que é impopular, nós prolongamos a agonia sanitária e a agonia econômica. E entra nessa sanfona, que irá até o momento em que tivermos a maior parte da população vacinada."
A média móvel de casos já está em elevação há mais tempo. Em 26 de abril, o cálculo era de 56.106 casos por dia. Quase um mês depois, em 20 de maio, a média diária havia chegado ao patamar de 65.962 novos casos.
Os especialistas apontam que este já era um sinal de que a situação dos óbitos iria piorar, já que, com mais casos, cresce a quantidade de internações, as quais, em alguns casos, resultam em mortes. No estado de São Paulo, por exemplo, a lotação de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) voltou a ser crítica em algumas regiões.
Oliveira lembra que os números de casos "estão sempre atrasados", porque os dados de hoje são resultado do efeito da circulação do vírus há três semanas. Além disso, também há a subnotificação, o que faz com que o número oficial possa não ser o real sobre a pandemia no país, pela falta de testagem, que deveria ser ampliada.
Nós não sabemos o que está acontecendo. Isso que a gente visualiza é a ponta da ponta da ponta do iceberg"
Wanderson Oliveira, epidemiologista
Cansaço e negacionismo
Fortaleza vê dois fatores que podem explicar o comportamento da população, mais reticente em cumprir medidas de isolamento: o cansaço e o discurso do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Contra restrições desde o início da pandemia, apesar de autoridades sanitárias apontarem que essa é a melhor saída para a crise, Bolsonaro chegou a classificar como idiota quem fica em casa.
Acredito que a maioria dos governadores têm consciência do absurdo que é flexibilizar neste momento. O problema é que a sociedade mesmo se mobiliza contra [as restrições]
Carlos Magno Fortaleza, infectologista
Para Fortaleza, "tudo que essas pessoas precisam é de um direcionamento correto e firme" e que não se "pode deixar os governadores sozinhos nessa posição". "A gente precisa que outros players políticos colaborem da mesma forma."
Vacina não libera aglomeração
O presidente da SPI atestou na prática a falha de comunicação sobre o combate à pandemia. Ele é responsável pelo estudo sobre os efeitos da imunização em massa com a vacina AstraZeneca em Botucatu, no interior paulista, que aconteceu no final de semana passado.
"Foi só a prefeitura dizer que a população toda seria vacinada e, duas semanas antes [da imunização], a população toda se aglomerou", conta o infectologista. "Nós passamos um caos. Eu passei a noite [de 19 para 20 de maio] toda acordado atendendo paciente que chegava no pronto-socorro." O número de casos e internações por covid-19 teve alta na cidade.
Como leva cerca de três semanas para o imunizante começar a fornecer proteção, Fortaleza diz imaginar que Botucatu ainda viverá "três semanas de pavor, com pessoas se expondo absurdamente porque acham que a vacina liberou para fazer isso".
Variantes do coronavírus, junto com aglomerações, só reforçam para o infectologista a necessidade de restrições à circulação de pessoas e medidas protetivas. "O lockdown não distingue cepa, variante. O lockdown protege contra qualquer variante. O uso de máscara protege contra qualquer variante. A única coisa que depende da variante é a vacina." Oliveira, por sua vez, reforça essa visão lembrando que a vacina para uma parcela da população só será realidade no final do ano.
Agora, os brasileiros precisam ter ciência de que o "efeito sanfona" nos números continuará "até ter a população imunizada com vacinas eficazes", diz Fortaleza. "Estou falando 'vacinas eficazes' porque, se elas não forem eficazes contra essa variante indiana que já está lá no Maranhão, não vai adiantar nada."
O presidente da SPI diz entender que as restrições "são uma coisa terrível, uma coisa amarga". "Eu tenho, na minha família, um irmão que vivia de alugar geradores para eventos enormes. Passou a não ganhar nada", disse. Por situações como essa, que Oliveira ressalta a necessidade de o governo providenciar um auxílio financeiro, por financiamento ou empréstimo, para empresas, o que permitira que se parasse tudo no Brasil por três semanas. "Se a gente fizer isso, a gente para com a epidemia."
Fortaleza ainda pontua: "Se nós tivéssemos feito o distanciamento correto, eficaz, efetivo, intenso, coordenado, nacional, seguido de um bom controle de fronteiras, nós já estaríamos com a economia recuperada."
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