Partido de Mandela perde hegemonia na África do Sul
Após três décadas no poder, Congresso Nacional Africano não consegue maioria absoluta nas eleições e terá dificuldades para formar coalizão de governo. Novo partido do ex-presidente Jacob Zuma poderá ser fiel da balança. Os partidos políticos da África do Sul aceleram as negociações para selar possíveis coalizões de governo, após o Congresso Nacional Africano (ANC), legenda do presidente Cyril Ramaphosa, ficar cada vez mais próximo de perder a maioria absoluta que manteve no país nas últimas três décadas.
Com 94,66% dos votos apurados até a noite desta sexta-feira (31/05), o ANC somava 40,69% do total, contra 21,53% da sigla de oposição Aliança Democrática (DA), de centro-direita. O partido de esquerda uMkhonto weSizwe (MK), fundado há poucos meses pelo ex-presidente Jacob Zuma, conquistou 14,31% dos votos. Em quarto lugar, aparece a legenda da esquerda radical Combatentes da Liberdade Econômica (EFF), com 9,44%.
Se o resultado final comprovar essa tendência, isso significará uma queda de cerca de 15% no apoio popular à ANC - partido fundado por Nelson Mandela - em relação às eleições de 2019. Os números refletem a insatisfação dos eleitores com o desemprego desenfreado, problemas de infraestrutura e graves crises no fornecimento de energia.
A perda de apoio é um duro golpe para o partido que forçou Zuma a renunciar em 2018 em meio a uma série de acusações de corrupção, às quais ele nega. Apesar de continuar sendo a maior legenda do país, o ANC terá de negociar uma coalizão de governo com ao menos uma das demais forças políticas. A decisão deverá ser tomada dentro de um prazo de 14 dias, estabelecido pela Constituição, com a indicação de um nome para ocupar a Presidência.
Dentro desse quadro, a reeleição de Ramaphosa é vista como cada vez mais incerta. Analistas apontam que sua permanência no cargo, assim como sua autoridade dentro do ANC, estão seriamente ameaçadas.
"Já conversamos com todos, antes mesmo das eleições", disse o vice-secretário-geral do ANC, Nomvula Mokonyane, durante a apuração. "Tudo deverá ocorrer com base em princípios, e não em um gesto de desespero." O partido dominou a política sul-africana desde o fim do Apartheid, o regime de segregação racial que prevaleceu na África do Sul entre 1948 e 1994.
Incompatibilidades
Uma possível coalizão com o DA, liderado por John Steenhuisen, enfrentará resistência de setores internos do ANC. A plataforma pró-mercado e em prol das privatizações, que prevê o fim do empoderamento econômico da população negra, está em confronto direto com as tradições da legenda de Mandela.
O mais provável seria uma coalizão com o EFF ou o MK de Zuma, o que não agrada as alas mais moderadas do partido governista. Além disso, o rompimento entre Ramaphosa e Zuma - que ainda não superou a perda do mandado em 2018 - é visto por muitos como impossível de ser contornado.
Um porta-voz do MK afirmou durante a apuração que o partido não se envolverá em discussões com o ANC enquanto Ramaphosa estiver no poder. Ele disse que qualquer possível parceiro de coalizão deverá se comprometer a avançar reformas radicais na Constituição e conceder um perdão a Zuma, que está inelegível desde os escândalos de corrupção.
"Traremos Zuma de volta à Assembleia Nacional e o colocaremos novamente na Presidência; simples assim", afirmou o porta-voz.
Nas três décadas em que o ANC esteve no poder, suas lideranças foram envolvidas em uma série de escândalos de corrupção, em meio a um encolhimento da economia mais industrializada do continente africano e ao aumento do crime e do desemprego em níveis recorde.
rc (AFP, ots)
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