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Noboa assume presidência do Equador 'rompendo tendência' de polarização política na América Latina

Eleito em 15 de outubro contra a candidata de Rafael Correa, Luisa González, o empresário Daniel Noboa tomou posse oficialmente como presidente da República do Equador nesta quinta-feira (23). Filho de um bilionário e cinco vezes candidato à presidência, Noboa foi eleito com uma plataforma neoliberal em uma eleição marcada pela violência que assola o país há vários anos.

Poucos dias antes de sua posse, Daniel Noboa negociou um acordo com o Partido Social Cristão (PSC), de direita, e o partido socialista Movimento Revolução Cidadã (RC), de seu antigo oponente Rafael Correa, para formar uma aliança na Assembleia que dará ao novo presidente uma maioria confortável. Um socialista cristão será o presidente da Assembleia Legislativa, um partidário de Correa será o vice-presidente e um deputado do partido de Noboa, a aliança Ação Democrática Nacional (ADN), será o segundo vice-presidente.

"Quebrando a lógica do correísmo/anti-correísmo"

Para Franklyn Ramírez, professor de sociologia política da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais - ouvido por Angélica Pérez da RFI - nessa aliança todos ganham. "O governo de Noboa tem um partido pequeno, a ADN, quase inexistente, que tem uma bancada muito, muito pequena na Assembleia. Portanto, primeiro Noboa ganha um bloco majoritário que lhe dá governabilidade e garante a aprovação de duas leis urgentes que ele apresentará em dezembro, uma reforma tributária e uma reforma energética. E ele também faz um pacto com o Partido Social Cristão e a Revolução Cidadã, que são partidos com experiência política, mais confiáveis, que não vão fazer os jogos extorsivos habituais das forças menores", explica.

"O Partido Social Cristão, que estava em baixa, com essa aliança está recuperando sua influência no governo. Parece que terá representantes diretos no poder executivo, já ganhou a presidência da Assembleia. E a Revolução Cidadã, ao que me parece, e isso é o principal, está saindo da marginalidade política que teve nos últimos anos, saindo dos maus tratos que recebeu do resto dos partidos políticos", destaca.

"Portanto, o que Noboa faz, e esse é o gesto mais importante, é romper com a lógica Correa/anti-Correa que dominou a luta institucional. Ele está fazendo um pacto com a principal força política, embora seu alcance não esteja totalmente claro. Porém, pela primeira vez, sem disputas, está eliminando a polarização, isolando esses setores que representam a política do ódio, da intransigência, da perseguição, digamos que de alguma forma ele está rompendo com essa tendência que vemos no resto da América Latina, em que a centro-direita ou a direita moderada faz o jogo dos setores mais extremos e radicais da direita", enfatiza Ramírez.

Uma aliança frágil?

Alguns analistas acreditam que a aliança legislativa de Noboa com a outra direita e com um partido que, em princípio, é a oposição programática de seu governo, é frágil. Para Pablo Iturralde, diretor do Centro de Direitos Econômicos e Sociais (Cdes), "é uma aliança que tem pernas curtas. Ela possibilitará a estruturação da Assembleia, a negociação das comissões, mas se romperá no momento em que começarem a discutir como vão supervisionar os decretos que Noboa preparou para privatizar o setor petrolífero e supervisionar as obras hidrelétricas e as concessões de mineração. Essa é a extensão da aliança, e Noboa terá de procurar outros tipos de alianças para passar pelos processos de supervisão e poder compartilhar o bolo que sobrará das privatizações".

A esquerda, liderada por Luisa González, tem o maior grupo na Assembleia, 51 deputados, e presidirá uma das comissões mais importantes: a Comissão de Supervisão e Controle Político, que tem o poder de iniciar processos de impeachment contra representantes eleitos. Algumas medidas anunciadas pelo governo já provocaram reações duras da esquerda, como o plano de fundir os ministérios do Interior e da Administração Interna. Um "erro muito grave", segundo o ex-presidente Rafael Correa.

"Os dois ministérios funcionavam separadamente e isso deu bons resultados porque permitiu que um segmento dos funcionários públicos se especializasse precisamente em segurança. A fusão é um sinal terrível, porque é um indicador de que haverá uma continuação do modelo de austeridade que (o ex-presidente) Lenín Moreno começou a implementar. A fusão também vem com um corte orçamentário para gerenciá-los, tanto as questões de segurança quanto a gestão política, que deveriam ser questões diferentes", enfatiza Iturralde.

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Segurança e economia

Além da fusão, o plano é que a nova pasta seja dada a um policial ou um militar. "Isso é problemático. Primeiro, porque a autoridade, tanto sobre a polícia quanto sobre as Forças Armadas, deve estar sempre subordinada a um civil, constitucionalmente. Mas, além disso, o problema de segurança no país já envolve a própria polícia, ou seja, a permeia. Ter uma autoridade, por exemplo, sobre a polícia, poderia incentivar ainda mais a corrupção na instituição. Como a polícia tem uma certa autonomia em relação ao governo, por conta das várias reformas que ocorreram no país desde 2017 (...) foram consolidadas estruturas que atuam paralelamente à autoridade do governo. Colocar um policial ou um militar no Ministério fortaleceria essas estruturas paralelas que hoje estão permeadas pelo crime", analisa Pablo Iturralde.

Outro problema pesa sobre o Equador: a economia tem um déficit fiscal de mais de US$ 5 bilhões. Durante sua visita aos Estados Unidos no início de novembro, como presidente eleito, Noboa se reuniu com representantes do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para solicitar empréstimos. Essa posição foi contrária à da presidência de Correa, que conseguiu melhorar a situação social e econômica com políticas que deram as costas ao FMI.

"Além disso, o presidente Noboa fez essa solicitação ao FMI de forma muito explícita, com quais objetivos? Ele está praticamente pedindo ao FMI que financie sua campanha porque precisa desses recursos, segundo ele, para poder se reeleger e impedir que o Correísmo volte ao governo", denuncia Pablo Iturralde.

O jovem bilionário ficará no cargo até maio de 2025 para completar o mandato deixado vago por seu antecessor Guillermo Lasso, que optou por dissolver a Assembleia Nacional para acabar com uma crise de governança após seu envolvimento em escândalos de corrupção, o que levou à convocação de eleições legislativas e presidenciais antecipadas.

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