Topo

Vereador reeleito em Blumenau (SC) negociou obra e até óculos com eleitores

Vinícius Segalla e Guilherme Balza

Do UOL, em Blumenau (SC) e em São Paulo

01/05/2013 12h00

O vereador Fábio Fiedler (PSD) conseguiu se reeleger em Blumenau (139 km de Florianópolis), nas eleições de 2012, com a segunda maior votação (5.542 votos), negociando desde obras de asfaltamento até par de óculos para crianças, segundo mostra investigação do MPE (Ministério Público Estadual), em Santa Catarina.

O coordenador de campanha do candidato foi o então secretário municipal de Obras Alexandre Brollo, que mesmo ocupando cargo público trabalhou para Fiedler, utilizando a estrutura municipal, conforme apontam as investigações do MPE.

Vereador paga até óculos em troca de voto; ouça

A atuação do vereador está ligada a um megaesquema de corrupção instalado em Blumenau, com o objetivo de desviar dinheiro público. Segundo o MP, o esquema já teria sido responsável por um prejuízo de pelo menos R$ 100 milhões aos cofres públicos, o equivalente a 7% do orçamento de 2012 da cidade catarinense.

  • Divulgação

    Fábio Fiedler (PSD), vereador de Blumenau (SC) que estaria envolvido em esquema de corrupção e compra de votos

Ambos listam uma série de vias cujo asfaltamento teria potencial de angariar votos para Fiedler. Muitas das vias citadas foram batizadas por eles com nomes de outros investigados no esquema, como “bequinho do Fumagalli”, “rua do Jacomel".

Luiz Henrique Fumagalli era servidor da Secretaria Municipal de Obras e trabalhou na campanha de Fiedler; já Eduardo Jacomel era diretor-presidente da URB (Companhia Urbanizadora de Blumenau), que está no centro do esquema investigado pelo MPE.

Na conversa, Brollo indica que várias vias que serão asfaltadas irão beneficiar candidatos do grupo político de Fiedler --o mesmo do então prefeito João Paulo Kleinubing (PSD)--, mas que é necessário escolher uma rua que beneficiaria diretamente o candidato a vereador. 

Entenda o esquema:

“E uma pontual nossa, que nós queremos ser ‘pai da criança’, porque isso tudo que a gente tá falando vai ter um monte de pai. Um tiro pequeno que a gente possa fazer para a comunidade, dá para fazer a continuação do rancho ali, do lado da creche”, disse.

Segundo as investigações, várias vias asfaltadas em troca de votos não tinham autorização dos órgãos competentes, nem projeto, e foram mal executadas.

Óculos para gêmeos

Em outra ligação interceptada no dia 25 de maio de 2012, Fumagalli conversa com uma mulher, cujos filhos gêmeos ganharam óculos pagos por Fiedler, segundo as investigações.

Mulher: “Se tu visse (sic) eles, a felicidade com que eles falaram. ‘O mãe, agora eu tô enxergando direito!.’”

Fumagalli: “Sabe quem foi o cara?”

Mulher: “Quem?”

Fumagalli: “Fabio Fiedler.”

Mulher: “Quem é esse?”

Fumagalli: “Vereador.”

Mulher: “Sério? Diz pra ele que se ele quiser qualquer coisa, meu Deus, é só vim falar com nós. Rapaz do céu, só a felicidade dos dois (filhos)...”

Fumagalli: “Então guarda o nome do cara que deu. Fábio Fiedler.”

Mulher: “Eu já ouvi falar sobre ele.”

Fumagalli: “Então, esse cara é que pagou os óculos.”

Mulher: “Agradece ele do fundo do meu coração, não tem uma mãe mais feliz do que eu. E a alegria dos dois...”


Fumagalli: “Lá na frente tu da uma força para esse cara, Fabio Fiedler. Procure saber quem é o Fábio Fiedler.”

Mulher: “Eu vou procurar na internet agora. Vou procurar, vou bater fotos dos gêmeos e colocar para ele ver.”

Fumagalli: “Tu vai ver a foto dele na propaganda.”

Mulher: “Se ele precisar de famílias de crianças que ele ajudou, é só falar.”

"300 votos"

Um diálogo entre Fiedler e Brollo, em 4 de julho de 2012, ambos falam sobre uma ordem de serviço para uma obra de asfaltamento. O candidato manifesta receio em participar do evento de assinatura da ordem de serviço por já estar em período eleitoral e dá orientações a Brollo de como ele deve atuar em sua ausência.

  • Reprodução

    Na transcrição acima, Fábio Fiedler e Alexandre Brollo conversam sobre a assinatura de uma ordem de serviço para uma obra que pode resultar em votos para o candidato a vereador

O vereador pede para o coordenador da campanha reunir o maior número de pessoas que conseguir para dar publicidade à assinatura da ordem de serviço. “Acho que isso vai dar uns 300 votos para nós. Trezentos eu não digo, mas 150 a gente arranca de lá”, disse.

Brollo responde que se a obra começar já na data de assinatura da ordem de serviço “tem grande chance de ficar pronta antes” do primeiro turno das eleições.

Fiedler teve a candidatura cassada pela Justiça Eleitoral, após ação do Ministério Público Eleitoral acusando-o de compra de votos. Ele recorreu à segunda instância, e, enquanto o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) não julgar os recursos, permanece no cargo.

Outro lado

Procurado pela reportagem, o vereador afirma que os fatos que integram as acusações contra ele ocorreram antes do período eleitoral. Ele nega que tenha Brollo tenha trabalhado em sua campanha ainda quando era secretário e que as visitas que fez com o ex-secretário, nas quais Brollo utilizou veículo oficial, não eram eventos de campanha.

SAIBA MAIS SOBRE BLUMENAU

Sobre a compra dos óculos para os gêmeos em troca de voto, Fiedler disse que a questão já foi “esclarecida em juízo” e que o fato ocorreu antes do período eleitoral. Segundo o vereador, os óculos não foram comprados por ele e sim por Luiz Henrique Fumagalli, seu assessor de campanha e funcionário da Secretaria Municipal de Obras.

Fiedler negou ter indicado o asfaltamento de ruas e outras obras em troca de votos. “O vereador tem que levar ao Executivo municipal os anseios da sociedade, e nós apresentamos as propostas na Câmara de Vereadores. Essa é a função legítima do mandato do vereador: exigir a troca desse asfaltamento.” O vereador negou ter cometido qualquer crime e disse ainda que prestou todos os esclarecimentos à Justiça.

Luiz Henrique Fumagalli também disse que prestou todos os esclarecimentos à Justiça e afirmou que ele mesmo comprou os óculos para os gêmeos, diferentemente do que foi dito na conversa interceptada pelo Ministério Público.