André Santana

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Reportagem

'Tratados como ladrões': músicos do Ilê Aiyê relatam racismo em restaurante

O bloco afro Ilê Aiyê, mais antiga entidade negra do Carnaval de Salvador, usou o perfil do Instagram na quinta (30) para denunciar o racismo que os músicos teriam sofrido antes de uma apresentação em um restaurante da cidade.

Fomos tratados como ladrões e não artistas que estavam ali para realizar um trabalho, diz a nota da entidade, que também foi compartilhada no perfil de Antônio Carlos dos Santos, o Vovô do Ilê.

Em 1974, Vovô e outros jovens do bairro do Curuzu criaram o bloco para possibilitar a participação de pessoas negras nos desfiles do Carnaval, em um tempo de segregação racial, quando o centro da cidade era ocupado apenas pelas elites econômicas exclusivamente brancas.

O caso denunciado pelo grupo teria ocorrido no restaurante Bistrot Trapiche Adega, na Avenida Contorno, que ainda não se pronunciou — nem respondeu as tentativas de contato feitas pela coluna.

De acordo com a postagem do bloco, quando os músicos da Band'Aiyê chegaram ao restaurante para uma apresentação para a qual foram contratados, foram indicados a uma sala para troca do figurino e preparação para a apresentação.

Após um tempo já nessa sala, eis que surge uma senhora, desesperada, pedindo que saíssemos daquele local, que não era para estarmos ali, pois naquele local tinha coisas de valor.

Ainda segundo a nota, após explicarem que a banda estava naquele espaço para vestir o figurino da apresentação, a mulher teria exigido que uma funcionária do estabelecimento ficasse na entrada da sala — e que a porta ficasse aberta.

Fomos tratados como ladrões e não artistas que estavam ali para realizar um trabalho. É claro que a primeira intenção foi sair do local e não realizar a apresentação, mas fomos convencidos pelo contratante a fazer tal apresentação.

"É inadmissível que esse tipo de coisa continue acontecendo na nossa cidade. Alguns brancos e brancas dessa cidade precisam entender que ser negro ou negra não é sinônimo de ser ladrão ou ladra", continua a nota.

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Fomos feridos na alma e esperamos que atos como esse deixem de acontecer em nosso país.

Medidas Jurídicas

Entre os mais de 600 comentários na publicação — contabilizados até o fim da manhã de hoje (1º) —, o advogado e professor de Direito da Universidade Federal da Bahia, Samuel Vida, destacou que racismo é crime e como tal deve ser ratado.

Além da denúncia através das redes sociais, o bloco Ilê Aiyê e/ou as vítimas devem formalizar um BO [boletim de ocorrência] e comunicar o ocorrido à Promotoria de Combate ao Racismo do Ministério Público da Bahia. Além da responsabilização penal, cabe responsabilização civil por danos morais.
Samuel Vida, advogado, em comentário nas redes sociais

Quem também cobrou medidas jurídicas foi a advogada Dandara Pinho, ex-presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados da Bahia.

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"A pergunta que não quer calar: as medidas jurídicas cabíveis já foram tomadas?! O povo negro precisa de reparação e quem ensinou o caminho foi o Ilê Aiyê! Aguardo bons ventos de decisões judiciais!", cobrou.

Procurado pela coluna, o presidente do bloco Ilê Aiyê, Antônio Carlos dos Santos, informou que a entidade está estudando qual medida tomar. De acordo com ele, o grupo já foi procurado pela advogada do restaurante para uma conversa.

"Estamos muito envolvidos com a organização do nosso carnaval, mas estamos estudando qual medida tomar neste caso. A advogado do restaurante procurou um advogado amigo do Ilê Aiyê para estabelecer uma conversa. Assim que tivermos uma decisão, anunciaremos", disse Vovô do Ilê Aiyê.

Sobre a pessoa que teria agido de forma racista com o grupo de músicos, Vovô confirmou que se trata da dona do restaurante. "O marido dela chegou a pedir desculpas ao grupo pelo ocorrido e foi quem informou que ela seria uma das sócias."

Até a publicação deste texto, ela não havia sido localizada.

Arte contra o racismo

Reconhecido internacionalmente pela contribuição para a valorização das heranças africanas no Brasil, o Ilê Aiyê está preparando as comemorações pelos 50 anos de criação, quando transformou definitivamente o carnaval de Salvador.

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O pioneirismo do Ilê Aiyê abriu espaço para a criação de outras entidades negras, possibilitando a elevação da autoestima de homens e mulheres negros por meio da música, da dança, das roupas e adereços — e do discurso político que inclui reivindicações por direitos.

Neste mês de novembro, dedicado à Consciência Negra, o Ilê Aiyê realizou shows e caminhadas em que coloca a arte em favor da luta contra o racismo e pela cidadania das pessoas negras.

No domingo, 24, o desfile do bloco pelo centro de Salvador contou com a presença da cantora Daniela Mercury, que compartilhou com seus fãs a alegria do momento.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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