Carlos Madeiro

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Após prisão, Justiça libera paciente a plantar maconha e extrair óleo no PI

A Justiça Federal no Piauí concedeu um habeas corpus criminal autorizando um paciente com problemas de saúde como ansiedade, depressão e hérnia de disco, a plantar maconha em casa e extrair o óleo de canabidiol para tratamento próprio.

A autorização é uma reviravolta na vida de Fernando (nome fictício), 40, que chegou a ser condenado em primeira instância (mas absolvido nas demais) e ficou detido por 4 meses e meio acusado de tráfico de drogas por causa da plantação em sua casa.

Fernando entrou com uma ação em setembro de 2023 para que a justiça impedisse justamente que ele fosse novamente preso por plantar cannabis em casa.

Proibição de prisão

A decisão — dada na última segunda-feira (22) pelo juiz Agliberto Gomes Machado, da 3ª Vara Federal — proíbe que autoridades policiais adotem "quaisquer medidas tendentes a cercear a liberdade do paciente."

O MPF (Ministério Público Federal) também se manifestou favorável ao habeas corpus.

[Ficam] tais autoridades impedidas de apreender sementes, mudas, plantas e insumos necessários para o cultivo voltado para o referido tratamento terapêutico.
Juiz Agliberto Gomes Machado

Com a decisão, ele vai poder importar sementes de cannabis, fazer o plantio limitado a 45 plantas anuais para cultivo e extração de óleo artesanal de cannabis "com fins exclusivamente medicinais para o tratamento de saúde."

O paciente está proibido de utilizar ilicitamente as substâncias extraídas da cannabis e/ou fornecer a terceiros para quaisquer fins, em especial para o uso recreativo e/ou em grupos de recreação.
Juiz Agliberto Gomes Machado

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O salvo-conduto que impede eventual prisão vale, inicialmente, por dois anos. Após esse prazo, o paciente deve apresentar novo laudo médico.

Problemas de saúde

Fernando tem TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), ansiedade, distúrbio de sono e depressão diagnosticados. Além disso, sofre também com mialgia (dor muscular), esofagite e hérnia de disco.

Na ação, ele relata que sua família tem um histórico problema de obesidade.

Ainda na adolescência, sofrendo de compulsão alimentar, teve um expansivo aumento de peso, que o levou a fazer uma cirurgia bariátrica ainda aos 21 anos de idade.

A partir daí ele iniciou um tratamento usando o óleo de canabidiol, extraído da maconha, que apresentou excelentes resultados —diferente de outros medicamentos químicos.

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Inicialmente, o médico prescreveu o uso ininterrupto de dois medicamentos importados, mas o alto custo deles (R$ 82.620 ao ano) impediu Fernando de ter acesso.

Para não ficar sem o tratamento, ele decidiu então cultivar a planta em casa e extrair da cannabis o medicamento que melhora sua qualidade de vida.

Óleo de canabidiol
Óleo de canabidiol Imagem: iStock

Prisão marca sua vida

Em 2016, Fernando sofreu o que classifica como fato marcante em sua vida: foi preso e ficou quatro meses e meio detido suspeito de tráfico de drogas por produzir em casa seu próprio remédio à base de cannabis.

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Ele chegou a ser condenado em primeira instância, mas acabou sendo absolvido nas instâncias superiores.

A prisão, diz, agravaram seus sintomas de ansiedade, gerando uma insônia.

As informações convenceram o juiz, que diz na decisão que não há indícios "de destinação comercial das plantas cultivadas e seus derivados."

Por isso, entendeu que Fernando age de boa-fé e com restrito interesse no plantio para "consumo pessoal e diário."

"Observo que as enfermidades que acometem o paciente em foco são, de fato, graves, e que a substância canabidiol vem se mostrando eficaz no tratamento, ao contrário dos demais medicamentos experimentados.
Juiz Agliberto Gomes Machado

"Brasil está atrasado"

Segundo o advogado de Fernando, Wesley de Carvalho, o pedido de habeas corpus para ele só foi necessário porque a legalização da cannabis no Brasil para uso medicinal caminha a passos lentos no Congresso Nacional.

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O Brasil, no que tende ao avanço dos direitos humanos, sempre foi muito atrasado. Só que do outro lado, estão os pacientes que sofrem por uma falta de regulamentação e acabam tendo que recorrer ao tráfico, ir atrás de associações ou plantar em casa. No caso de plantar, já existem diversas decisões que concedem autorização de cultivo.
Wesley de Carvalho

Ele explica que o trauma da prisão de 2016 acabou sendo um dos motivos para procurar o Judiciário.

"Por isso pedimos esse habeas corpus, que é utilizado quando a pessoa se encontra em uma situação que aparenta ser criminosa, mas não é. Para isso, o instrumento mais utilizado é o habeas corpus preventivo, mas existem outros casos na justiça brasileira em que pessoas conseguiram a autorização por meio de ação.
Wesley de Carvalho

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