Carlos Madeiro

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Reportagem

AL vai indenizar filhos de detento que se matou na prisão após 3 tentativas

Os dois filhos de um preso que se matou dentro do Presídio do Agreste, no município de Girau do Ponciano (AL), serão indenizados em R$ 50 mil cada um. Os valores devem ser pagos pelo governo de Alagoas e pela empresa Reviver Administração Prisional, que faz a gestão da cadeia.

O preso Manoel (sobrenome será preservado) cometeu suicídio no dia 2 de agosto de 2020, após ter tentado outras três vezes, sem sucesso, se matar. Além disso, agentes flagraram o preso batendo a cabeça na parede em 10 oportunidades.

A condenação é do juiz Jonathan Pablo Araújo, da Vara de Colônia Leopoldina, que entendeu que o detento teve os quadros de doença neurológica e psiquiátrica negligenciados na unidade —que é considerada de segurança máxima. Por ser em primeira instância, ainda cabe recurso da decisão.

Além da indenização, o juiz fixou uma pensão mensal no valor de 1/3 do salário mínimo desde a data do fato até o dia em que os autores completem 25 anos.

Situação relatada

O réu estava preso havia oito anos (condenado a 22 anos de prisão), e os filhos não tinham convívio com o pai desde 2019. À época, os meninos tinham 8 e 13 anos.

Segundo relatos do prontuário médico do preso, houve alertas ignorados de que Manoel deveria ir para prisão domiciliar por falta de remédios para tratar seus quadros de depressão e epilepsia.

A situação de Manoel foi informada ao serviço social da instituição por sua ex-mulher em 26 de fevereiro de 2019. Nesse mesmo caso, os familiares alegaram que não tinham condições financeiras de visitar o preso —e isso acarretou a perda de contato com os filhos. Ainda segundo o relato, crises convulsivas dele eram relacionadas a seu estado emocional.

Na sentença, o juiz argumenta que a Constituição deu ao estado a responsabilidade de assegurar a integridade física e moral de uma pessoa sob custódia. Ele levou em conta a fragilidade do detento, que sofria com convulsões e apresentava alto risco de suicídio.

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Presídio do Agreste, em Girau do Ponciano (AL)
Presídio do Agreste, em Girau do Ponciano (AL) Imagem: Governo de Alagoas

Diante do quadro alegado, em 2 de dezembro de 2019, a promotoria pediu um laudo médico sobre o estado de saúde mental dele para avaliar a possibilidade de concessão da prisão domiciliar. Em resposta, o presídio afirmou que Manoel teria condições de permanecer no presídio.

Consta relatório médico do presídio do Agreste, informando a inviabilidade de que o requerente seja mantido no presídio em razão de seu quadro neurológico, com risco de óbito e sequelas graves em razão da ausência de medicamentos que surtam efeito e de médico especializado.
Sentença

A partir dali, em 2020, ele tentou por três vezes o suicídio, nos dias:

  • 28 de janeiro
  • 6 de fevereiro
  • 11 de junho

No meio disso, no dia 28 de abril, o detento chegou a avisar a uma enfermeira que cometeria suicídio.

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Verifica-se que Manoel possuía graves problemas de saúde, que lhe causavam convulsões frequentes, tornando-o mais vulnerável no ambiente carcerário. Esse quadro, aliado à sua condição psicológica de alto risco para suicídio, demandava atenção especial e contínua por parte da administração penitenciária.
Sentença

Para o juiz, o processo mostra que a gestão do presídio estava ciente do problema e teve responsabilidade direta na morte.

Mesmo diante das sérias condições de saúde do acusado, não houve fornecimento de tratamento adequado que surtisse efeito, tanto com relação às repetidas convulsões, quanto em relação ao quadro depressivo e aos pedidos de prisão domiciliar e progressão de regime, todos negados, mesmo após o médico da unidade informar que este não tinha condições de permanecer sob custódia.
Sentença

O juiz negou a indenização pedida pela irmã e pela ex-mulher dele. Já os filhos menores, diz o juiz, "não possuíam meios para estabelecer contato com o genitor por conta própria."

A genitora, responsável legal pelas crianças, detinha a obrigação de garantir o direito ao convívio familiar entre os filhos e o pai, o que não aconteceu, segundo relatado, em razão de não ter condições econômicas para propiciar o contato entre eles. Assim, diante da morte do pai, evidente o direito dos filhos à pretensão indenizatória.
Sentença

A coluna procurou o advogado da ex-esposa e irmã do preso, mas ele não respondeu se irá recorrer da decisão.

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A PGE (Procuradoria Geral do Estado) também foi acionada pela reportagem, mas também não respondeu se vai questionar a sentença. O UOL não conseguiu contato com a Reviver, mas enviou e-mail para pedir um posicionamento, sem retorno até o momento. O espaço segue aberto.

Centro de Valorização da Vida

Caso você esteja pensando em cometer suicídio, procure ajuda especializada como o CVV (Centro de Valorização da Vida) e os Caps (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade.

O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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