Bilhete 'premiado' de R$ 13 milhões: como grupo usa religião e fisga idosos
A Polícia Civil indiciou nesta quinta-feira (29) quatro suspeitos (um deles preso em flagrante) de praticar golpes contra idosos usando um suposto bilhete de loteria premiado, mas que não poderia ser sacado pela dona por "questões religiosas".
A organização criminosa fez ao menos seis vítimas em Maceió, e há registro de outras pessoas enganadas no Recife. Todas as vítimas têm um perfil: são idosas. A polícia solicitou o sequestro dos bens dos suspeitos para ressarcir as pessoas enganadas.
Uma das vítimas contou que o bilhete oferecido estaria "premiado" em R$ 13,9 milhões, e a mulher que seria dona estaria disposta a trocar por R$ 1 milhão (Leia detalhes abaixo).
O crime, segundo a polícia, acontece em cinco passos:
1. Abordagem Inicial
Uma mulher, membro do grupo, aborda a vítima idosa nas proximidades de agências bancárias em bairros nobres. Ela afirma possuir um bilhete de loteria premiado com valores altos.
2. Chegada de advogado
Depois, outro membro do grupo surge e se oferece para ajudar a "golpista" e a vítima. Ele diz ser advogado e finge ligar para uma central telefônica para "confirmar" o prêmio. Em seguida, ele relata que o bilhete tem R$ 13,9 milhões de crédito.
3. Manipulação da vítima
A partir daí, a dona do bilhete alega ser "Testemunha de Jeová" e, por proibição religiosa, não pode resgatar o prêmio. Ela oferece o bilhete em troca de um valor menor ou sugere que a vítima faça uma doação para caridade com o dinheiro. O outro membro participa fingindo que vai dividir o valor da "compra" do bilhete.
4. Acompanhamento até o banco e transferências financeiras
Os golpistas levam a vítima até uma agência bancária, onde a induzem a realizar transferências ou mesmo fazer empréstimos para contas de laranjas.
5. Dissimulação com o dinheiro
Após receberem o dinheiro da vítima, os criminosos rapidamente o distribuem entre contas de integrantes do grupo para dificultar o rastreamento e bloqueio pelas autoridades.
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Quero receberO UOL teve acesso ao relato de uma das vítimas, que levou a caso a polícia.
A idosa contou que foi no último dia 21 abordada por uma mulher, que se dizia de outra cidade e pediu ajuda para encontrar uma loja pertencente a um homem que tinha lhe prometido R$ 7.000 e um jogo de panelas se ela devolvesse um bilhete lotérico.
Sem conseguir achar o local, ela começa a falar sobre o bilhete e põe em dúvida se ele é premiado. Em seguida, chega o segundo integrante da quadrilha. Ele tenta "ajudar" as duas mulheres e finge ligar para a Caixa, confirmando que o bilhete da Quina estaria premiado em R$ 13,9 milhões.
Nesse momento, a mulher dona do bilhete diz que não pode sacar o valor, já que seria contra sua religião jogar e disse que o "venderia" por R$ 1 milhão.
O homem que fingia ser advogado afirmou que teria R$ 600 mil no banco, que conseguiria mais cerca de R$ 200 mil, e sugeriu levar a idosa a agências para ela ver se ela tinha o valor para completar.
Ela vai no carro com os golpistas, com quem ficou por cerca de seis horas. Foram em duas agências entre idas e vindas e muita conversa, até que ela transfere, ao todo, R$ 57 mil em transações feitas pelo celular. Ela contou que o homem fez três DOCs, e ela apenas colocou a senha.
A idosa ainda foi induzida a fazer um empréstimo consignado no valor de R$ 80 mil, que também foi repassado aos integrantes do grupo.
A descoberta do crime ocorreu porque os criminosos começaram a protelar a ida dela ao banco para sacar o dinheiro, e ela começou a questioná-los. Foi aí que os próprios golpistas informaram que era um golpe, pararam o carro, compraram uma água para ela e fugiram.
Ela foi à polícia e mostrou uma foto que mostra parte do rosto da golpista e informou a placa do carro, o que ajudou a polícia a chegar ao grupo.
Prisão no Recife
O único preso suspeito do crime até aqui é Jean Adriano Pereira da Luz, apontado como responsável pela locação de veículos e hospedagem dos demais membros do grupo.
Ele foi preso ainda no dia 21 no aeroporto do Recife pouco após ter cometido o crime contra a idosa citada acima. Ele estava na capital pernambucana para devolver o carro usado na abordagem da idosa enganada.
Em depoimento, ele alegou que recebeu R$ 3,5 mil, que havia conhecido o grupo fazia pouco tempo e que esse seria o primeiro golpe que praticava.
Entretanto, a investigação já revelou, por meio da análise do aparelho celular do detido, que ele estava no grupo havia mais tempo, participaria de golpes similares em outros estados e teria atuação importante nas ações criminosas.
Para a polícia, ele integrava uma "organização criminosa estruturada e hierarquizada, com divisão clara de tarefas."
O UOL não conseguiu identificar quem defende Jean. O espaço está aberto para manifestação.
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