Após veto de banca, Justiça manda Ufal matricular jovem autista em medicina
A Justiça Federal determinou que um jovem com TEA (transtorno do espectro autista), aprovado por sistema de cota, seja matriculado no curso de medicina da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) no campus Arapiraca, após ter o direito vetado por avaliadores da instituição.
A decisão é da juíza Camila Monteiro Pullin, titular da 8ª Vara de Alagoas e foi dada em caráter liminar nesta terça-feira (17), atendendo a pedido do candidato. No mesmo dia, o aluno foi matriculado e está apto a cursar a graduação.
Davi Ramos da Silva Santos, 22, foi aprovado por meio da cota para pessoas com deficiência, com renda de até familiar um salário mínimo e que cursou ensino médio em escola pública.
Ele ficou em 1º lugar na 3ª chamada pelo SiSU (Sistema de Seleção Unificada), mas teve a matrícula vetada após a avaliação da banca psicossocial da instituição, que o entrevistou e disse que "não foram identificadas barreiras/impedimentos significativos" do candidato.
Davi ainda recorreu administrativamente, mas a Ufal negou a matrícula em definitivo no dia 12 de dezembro, e ele decidiu então ir à Justiça.
Procurada, a Ufal divulgou nota informando que todo procedimento adotado foi legal e que, durante a avaliação, a banca "levou em consideração uma perspectiva biopsicossocial, ponderando não apenas sobre os aspectos biológicos/clínicos do TEA em sua decisão." "Também foram considerados os impactos e as restrições em aspectos sociais, decorrentes da condição informada (TEA)", diz o texto.
A partir dos relatos do candidato, não foram identificadas/os barreiras/impedimentos significativos nas principais áreas da vida comunitária, pessoal, escolar, profissional e cívica do candidato. Diante dos fatos apresentados e analisados, a banca concluiu pelo indeferimento do pedido do candidato para concorrer a uma vaga PcD no processo seletivo em questão, tomando como base a legislação e normas internas vigentes.
Ufal, em nota
Diagnóstico tardio
Ao UOL, o jovem conta que foi diagnosticado no final de 2022 com TEA nível 1, que o levou a concorrer por meio de cotas.
Morador de uma povoado de Arapiraca, Davi conta que demorou a ter o diagnóstico do transtorno. "Foram várias sessões com a neuropsicóloga, que fez vários testes e análises para poder fechar o diagnóstico. Com o relatório fechado, levei para a neurologista, e aí eu tive o laudo de TEA", conta.
Ele explica que, desde criança, sempre percebeu que era "um pouquinho diferente dos outros", especialmente por duas questões. "Sempre fui um bom aluno, minhas dificuldades eram com barulho e na socialização: eu tinha poucos amigos, sempre eram grupos muito restritos na escola", relata.
Mesmo apresentando laudo e passando por uma entrevista por cerca de uma hora no último dia 28, a banca vetou por entender que ele não se incluiria no público com direito a cota, o que gerou tristeza no candidato.
"Quando soube do resultado, houve um misto de sentimento: a primeira sensação foi de frustração, e depois veio sentimento de ser invalidado, de injustiça", conta.
Requisitos atendidos
A Justiça entendeu que o veto foi ilegal, já que o Estatuto da Pessoa com Deficiência "determina que a pessoa com transtorno do espectro autista é deficiente para todos os fins legais".
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Quero receberPara a juíza do caso, o laudo médico apresentado "atende os requisitos exigidos para comprovação da deficiência, para fins de matrícula na instituição de ensino."
Ela ainda cita que, embora o edital previsse que um candidato poderia ser convocado a participar de uma entrevista com a banca psicossocial para validação de sua condição de pessoa com deficiência, a instituição não poderia "impedi-lo de realizar sua matrícula."
O fato de a pessoa com TEA em nível 1 não possuir limitações de ordem cognitiva, não significa que não encontre outras dificuldades para se inserir no mercado de trabalho e alcançar seu pleno desenvolvimento, na medida em que são inúmeros os fatores de ordem social, ambiental e psicológico, que podem constituir barreiras à sua autonomia e à concorrência em igualdade de condições com pessoas que não tenham sido diagnosticadas com qualquer espécie de deficiência.
Sentença da juíza Camila Monteiro Pullin
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