UFBA nomeia médica negra barrada em vaga após decisão cassar direito a cota
A otorrinolaringologista Lorena Pinheiro Figueiredo foi nomeada nesta terça-feira (29) como professora da Faculdade de Medicina da UFBA (Universidade Federal da Bahia).
A nomeação atende a decisão da juíza Arali Maciel Duarte, da 1ª Vara da Justiça Federal da Bahia, a mesma que em junho havia impedido a sua nomeação no concurso por entender que, como cotista, ela não poderia ficar com a primeira colocação por ter tido nota menor que uma médica não cotista.
Lorena perdeu a vaga da cadeira para a médica Carolina Cincurá Barreto, que acionou o judiciário por entender que a nota maior lhe daria direito à nomeação. A UFBA recorreu da decisão, e o MPF (Ministério Público Federal) deu parecer favorável a Lorena. (Leia mais sobre o caso abaixo)
Nesse momento, as duas médicas estão nomeadas, à espera do julgamento do mérito de quem é a vaga.
Lorena foi nomeada pela UFBA para o cargo de professora adjunta do Departamento de Cirurgia Experimental e Especialidades Cirúrgicas.
Como a impetrante foi aprovada dentro do número de vagas previstas no edital para as pessoas negras, foi a primeira colocada na sua cota, e ocorreu a "preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação", ainda que em cumprimento a decisão judicial, ela deve ser nomeada para uma das vagas desocupadas atualmente existentes na Faculdade de Medicina da UFBA, em respeito à tese fixada pelo STF.
Trecho da decisão de Arali Duarte
![Fachada da Faculdade de Medicina da UFBA, de 1808 Fachada da Faculdade de Medicina da UFBA, de 1808](https://conteudo.imguol.com.br/c/noticias/f9/2024/09/02/fachada-da-faculdade-de-medicina-da-ufba-de-1808-1725308676471_v2_750x421.jpg)
"Espero que seja um marco"
A médica comemorou a sua nomeação. "É uma vitória, sem dúvida, porque de todos os cotistas atacados até agora, ninguém chegou a esse passo de receber uma decisão jurídica favorável e de prosseguir", diz.
Ela afirma que a nomeação foi feita dentro do departamento que inclui a sua área de atuação e espera que seja colocada para atuar na área do concurso.
Eu tenho esperança de estar participando ainda da divisão de disciplinas relacionadas ao ensino, pesquisa e extensão de otorrinolaringologia na UFBA. É a realização de um sonho, quero contribuir na formação de novos médicos, com uma nova visão sócio-histórica identitária.
Lorena
Sobre o desfecho do processo, Lorena explica que a ação seguirá para instâncias superiores, onde haverá um debate sobre a Lei de Cotas.
Eu acho que essa é uma pauta super relevante no contexto atual, no sentido de fazer valer uma reparação sócio-histórica, que todos devemos ter. Espero que seja um marco e que eu abra essas portas para que venham mais e mais pessoas, docentes, negros e negras, entrem na universidade.
Lorena
Entenda o caso
O edital do concurso da UFBA foi lançado em dezembro de 2023 e previa 30 vagas para professores de várias áreas, entre elas a de otorrinolaringologia.
Lorena Pinheiro, 39, se inscreveu como candidata autodeclarada negra e teve homologada sua primeira colocação no dia 13 de agosto. O edital da seleção previa que, para os casos de apenas uma vaga, o critério de cota seria o primeiro para escolha.
Inconformada, a médica Carolina decidiu ir à justiça pleitear a única vaga, já que sua nota final foi de 9,40, acima da de Lorena —de 7,67, quarta nota geral.
Por só haver uma vaga, a defesa alegou que não poderia ser dada a cotista e que o sistema só prevê esse critério quando há "um número de vagas [a partir de três] capazes de suportar a aplicação de tais percentuais."
O edital do concurso, porém, explica no item 7.6 que candidatos com deficiência e negros "ocuparão a primeira vaga respectiva, ainda que esta seja a única e as suas classificações não lhes garantam a primeira posição, desde que tenham sido aprovados/as."
A juíza acolheu os argumentos da médica Carolina e no dia 13 de junho determinou a nomeação dela, alegando que a regra do edital "implicará a concessão de 100% das vagas para candidatos cotistas, em afronta ao direito de quem se submeteu à ampla concorrência e obteve notas mais altas".
Após recurso, a juíza entendeu que a nomeação de Lorena deveria ser feita até que o mérito da decisão da vaga seja definitivamente julgado.
Sistema de cotas da UFBA
A UFBA alega que adota a Lei de Cotas para concursos "considerando a totalidade de vagas do edital" e sem aplicar "qualquer fracionamento sobre especialidades ou áreas".
Até 2018, diz a UFBA, a cota era aplicada apenas nas áreas com três ou mais vagas. Entretanto, a instituição diz ter entendido que, como as vagas de docência são, em regra, menores que três, "a aplicação da lei não era possível, inviabilizando, na prática, a política afirmativa de inclusão."
Pela regra atual, o candidato autodeclarado negro ou com deficiência mais bem classificado em sua área de conhecimento é chamado para ter sua condição confirmada e ocupará a vaga "ainda que esta seja única e a sua ordem na classificação não lhe garanta a primeira posição geral".
101 comentários
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Clínica Ideo
Um completo absurdo este caso. Não seria o caso de abrir concursos só para cotistas então. Onde há apenas uma vaga é um absurdo excluir uma candidata com nota muito superior à da concorrente, só por não ser negra? E depois no futuro quando todos os professores forem negros, vão criar cotas para brancos?
Breno Nery Mourao
Um absurdo ter cota pra duas pessoas formadas e especialistas disputando uma vaga. A cor da pele define quem é mais capacitado? Ou a nota? Uma vergonha. Eu teria vergonha de passar na frente por ser negro tirando uma nota menor.
Jose Olavo Bueno
Se já são médicos formados torna-se um absurdo a prevalência das cotas. O único critério a prevalecer deveria ser o de maior nota. Isso gera revolta e é por isso que a esquerda vai acabar no Brasil.