Fernanda Magnotta

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Opinião

Tensões globais empurram China e Estados Unidos para o diálogo

Ao longo desta última semana Joe Biden e Xi Jinping encontraram-se na Califórnia para uma reunião bilateral que ocorreu às margens do encontro da APEC (Asia-Pacific Economic Cooperation, em inglês). Além de marcar a primeira visita de Xi aos Estados Unidos desde 2017, o encontro foi importante para tentar restaurar o diálogo entre os dois governos e manter ativas linhas diretas de comunicação.

Se a convivência harmoniosa entre eles já, por si só, suscita preocupações, o relacionamento entre os dois atores se torna particularmente sensível no contexto de novos conflitos e tensões geopolíticas que eclodem e afetam a estabilidade internacional em termos de paz e segurança.

Depois de anos discutindo a necessidade de os Estados Unidos tentarem se "desvincular" da China para reduzir a dependência econômica, eis que agora nos deparamos, cada vez mais, com uma tentativa de alteração de rota. Se até então "decoupling" era a palavra de ordem entre autoridades norte-americanas, com foco em minimizar a influência da China nas cadeias globais de suprimentos sem cortar laços completamente, agora tudo indica que estamos ingressando na era do "de-risking".

Além de ter constado no comunicado conjunto do G7 desse ano, o termo tem aparecido em discursos de importantes figuras do governo norte-americano, como do assessor de segurança nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan. A "redução de riscos", em tradução livre, implica uma abordagem mais moderada e cirúrgica em relação à estratégia anterior. Está contextualizada no campo da competição econômica, claro, mas pode ser interpretada como uma tentativa geral de reorganização do governo estadunidense em relação a China.

O "novo plano" envolve tomar decisões intricadas sobre quais tecnologias e setores devem ser mantidos longe da China, exigindo regulamentação cuidadosa e consideração das circunstâncias únicas de cada setor. Essa abordagem é vista como uma alternativa mais diplomática à "desvinculação", enfatizando a importância de calcular efeitos recíprocos na complexa relação bilateral.

Durante o encontro dessa semana, alguns destaques especiais reforçam a ideia de uma renovada tentativa de interlocução capaz de conter danos.

No campo econômico, Xi criticou o histórico das políticas protecionistas norte-americanas - especialmente o controle de exportações, a revisão de investimentos e as sanções unilaterais -, dizendo que essas afetaram o desenvolvimento chinês. No dia seguinte o governo dos Estados Unidos anunciou que iria rever algumas dessas políticas. Os dois presidentes concordaram em aumentar o número de voos de passageiros agendados no próximo ano e expandir intercâmbios culturais, educacionais e esportivos.

Em relação a Taiwan, Xi afirmou que a questão de Taiwan é a mais importante e sensível nas relações bilaterais com os Estados Unidos e que Washington deve parar de oferecer armamento à ilha e de apoiar sua independência em "ações concretas". Xi pontuou isso na reunião com Biden, dizendo que deseja o apoio de Biden na "reunificação pacífica" da China. Biden respondeu dizendo que seu apoio à política de reunificação chinesa permanece o mesmo e que deseja que o conflito seja resolvido de maneira pacífica. O presidente norte-americano também pontuou preocupações com as denúncias de abusos aos direitos humanos por parte do governo chinês em Xinjiang, Tibet, e Hong Kong. Igualmente pediu que a resolução dos casos de norte-americanos detidos injustamente na China seja uma prioridade.

Ambos os líderes se comprometeram a cooperar para desenvolver políticas ambientais e diminuir os efeitos das mudanças climáticas, assim como deram novos passos relacionados à cooperação militar. Foi estabelecida a criação de um grupo de cooperação para o combate à manufatura de drogas ilícitas como o fentanil e seus ingredientes. Também serão retomadas as comunicações militares com reuniões da U.S.-China Defense Policy Coordination Talks e do U.S.-China Military Maritime Consultative Agreement. Além disso, os líderes se comprometeram a entender melhor os riscos trazidos pelo uso da inteligência artificial no setor de defesa. Espera-se que os países entrem em um acordo para restringir o uso da IA em armamentos.

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Sobre os conflitos em curso, Biden reafirmou seu apoio à manutenção da paz e estabilidade na região do Indo-Pacífico, assim como a defesa por seus aliados na região. No caso da guerra Russo-Ucraniana, o presidente norte-americano reafirmou seu apoio ao Ucrânia e desejou que a China use sua relação com a Coreia do Norte para que ela pare de fornecer armamento para a Rússia. Em relação ao conflito Israel-Hamas, por fim, Biden cobrou a China de que utilize sua influência com o Irã para impedir que o conflito se expanda.

Nas relações pendulares entre Estados Unidos e China esse capítulo definitivamente não é inédito: períodos de aproximação e de contenção tem se revezado ao longo das últimas décadas. Do lado norte-americano, o desafio segue o mesmo de sempre - reduzir a interdependência sem causar danos desnecessários. O que muda, no entanto, agora, são as circunstâncias do mundo.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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