Lula tem reunião fora da agenda com Shell; encontro gera mal-estar
Tentando vender a ideia de que o Brasil é um dos principais protagonistas ambientais e com uma mensagem de compromisso com a questão climática, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve uma reunião fora da agenda pública com a cúpula da petrolífera britânica Shell, em Nova York. Ele está na cidade para participar da Assembleia Geral da ONU.
Nesta segunda-feira (23), o brasileiro teve reuniões bilaterais com a Comissão Europeia e com o governo da Alemanha e um almoço com líderes estrangeiros. Mas, na agenda oficial do presidente, o encontro com a Shell não foi incluído e não houve explicação sobre a ausência da informação.
Uma ala do governo considerou a decisão de Lula de receber os executivos como "um erro", já que pode enfraquecer sua mensagem de compromissos com a pauta ambiental.
A notícia foi revelada primeiro pela BBC Brasil e confirmada pelo UOL. Nenhuma informação foi prestada até o momento sobre o motivo do encontro, que teria sido solicitado pela Shell.
A exploração de petróleo em regiões próximas à foz do Amazonas é alvo de polêmica e questionamentos. No encontro com a Shell, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, não esteve presente. Por uma hora, na residência do embaixador do Brasil na ONU, Lula foi acompanhado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o chanceler Mauro Vieira.
Lula pretendia chegar à ONU com dados fortes sobre a queda do desmatamento para permitir que ele assumisse um protagonismo global na questão climática. Mas as queimadas das últimas semanas transformaram esse cenário.
O presidente não adotará uma postura negacionista e nem repetirá a fórmula de Jair Bolsonaro, que culpou indígenas e a população local pelas queimadas. O tom será um equilíbrio entre o reconhecimento dos desafios diante da seca histórica e um alerta sobre como os fatos no Brasil estão interligados às mudanças climáticas causadas por décadas de emissões, principalmente dos países industrializados.
Nos dias que antecederam a reunião, a diplomacia brasileira e a primeira-dama, Janja Lula da Silva, fizeram discursos que também alertaram para o caráter criminoso dos incêndios. A menção pode voltar a aparecer no discurso do presidente, num esforço do Brasil de apresentar "as suas versões do fato" diante do mundo.
Mas Lula também usa a viagem para pressionar líderes europeus para que adiem a adoção de lei ambiental que, a partir de 2025, permitirá que o bloco impeça a importação de produtos agrícolas que sejam responsáveis por desmatamento.
O tema foi tratado com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Ainda que o tema central do encontro seja o compromisso de ambos os lados para fechar um acordo comercial entre o Mercosul e a UE, o governo indica que a questão do desmatamento entrará na agenda. "Falaremos sobre isso", confirmou o chanceler Mauro Vieira ao UOL.
Há dez dias, o governo brasileiro enviou uma carta para a UE criticando a lei do bloco que proíbe a importação de produtos de áreas recentemente desmatadas e pedindo que a medida seja reavaliada. O temor do Brasil é que, uma vez implementada, a lei possa ser usada como um instrumento de protecionismo disfarçado. O impacto pode chegar a US$ 15 bilhões.
Desde 2020, o Itamaraty vem alertando os europeus sobre os riscos de que a lei possa violar as regras internacionais do comércio e não descarta até mesmo recorrer aos tribunais internacionais contra o bloco.
O Brasil ainda conseguiu criar uma espécie de aliança entre países emergentes que, durante a tramitação da lei, enviaram um carta para a UE para denunciar o projeto.
Agora, o governo pede que o bloco "reavalie urgentemente sua abordagem sobre o tema" e qualifica a lei como um instrumento "unilateral e punitivo".
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