Josias de Souza

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Opinião

Lula converte ato institucional de socorro aos gaúchos em comício

Lula realizou nesta quarta-feira sua terceira visita ao Rio Grande do Sul depois que o estado foi alcançado pela maior hecatombe climática de sua história. A nova incursão teve um grande mérito e um notável defeito.

Nas visitas anteriores, Lula sobrevoou o dilúvio e reuniu-se com autoridades locais. Dessa vez, humanizou sua passagem pelo estado. Acompanhado de dez ministros, do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, e dos comandantes das Forças Armadas, visitou um abrigo na cidade de São Leopoldo, uma das mais atingidas pelas cheias. Abraçou e confortou vítimas do flagelo climático.

De resto, Lula estrelou uma solenidade na qual o governo federal anunciou providências destinadas ao socorro direto aos flagelados. Entre elas, o pagamento de um auxílio em parcela única de R$ 5,1 mil a cerca de 240 mil famílias e a promessa de prover moradia a 100% dos desabrigados que não terão como retornar às suas casas.

Numa evidência de que não perde a oportunidade de perder oportunidades, Lula apequenou sua nova passagem pelo flagelo gaúcho convertendo uma solenidade institucional em ato de campanha eleitoral. Ao discursar, foi aclamado por uma claque petista que entoou gritos alusivos às suas cruzadas eleitorais.

Podendo realçar o comportamento republicano que adotou na crise, Lula dedicou-se a falar bem de si mesmo e do seu governo. No seu discurso, as medidas de socorro às vítimas ficaram em segundo plano. A certa altura, declarou que pretende viver até os 120 anos, pois precisa "disputar umas dez eleições". Declarou que estará "de bengala disputando eleições."

Num flerte com óbvio, Lula afirmou que o preço da recuperação do Rio Grande do Sul é maior do que o custo das obras que poderiam ter evitado ou atenuado os prejuízos. Apresentando-se como um "síndico", disse que não gosta da palavra "governar". Prefere o vocábulo "cuidar". Teve quase um ano e meio para "cuidar" dos brasileiros apresentando um plano consequente de enfrentamento aos extremos climáticos.

Sem se dar conta de que Bolsonaro tornou-se um bode expiatório gasto, Lula injetou, do nada, o rival em sua fala. Disse que o país "foi desprezado por causa de um incivilizado que chegou à Presidência". Referia-se sobretudo ao negacionismo sádico que marcou a atuação de Bolsonaro na pandemia da Covid.

Ecoando Luís Roberto Barroso, que declarou ser "impossível" não condenar a "abominável onda" de desinformação sobre a catástrofe, Lula fustigou o bolsonarismo. Declarou que "esse tipo de gente, mais dia menos dia, vai ser banida da política brasileira".

Coroando a politização do dilúvio, Lula assinou, ao lado de um governador tucano Eduardo Leite de cenho crispado, o ato de nomeação do petista Paulo Pimenta, atual chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência, para a função de ministro extraordinário da reconstrução do Rio Grande do Sul.

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Pimenta é a opção do PT para a disputa do governo gaúcho em 2026. Não dispõe, portanto, da principal característica de um facilitador da reconstrução pós-enchente: a neutralidade. Um evento que deveria ter sido institucional ganhou, contornos de campanha petista.

Lula adotou na crise do Rio Grande do Sul um comportamento compatível com as dimensões inéditas do drama. Em vez de desperdiçar tempo e energia discutindo o problema, passou a enfrentá-lo. Federalizou, por assim dizer, a crise estadual. Pela lógica, os dividendos eleitorais viriam por gravidade. Além de desnecessária, a politização do drama é desrespeitosa.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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