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Maria Carolina Trevisan

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Projetar Moro como candidato forte à Presidência é, ainda, forçar a barra

10.nov.21 - Sergio Moro em sua filiação ao Podemos, em Brasília  - Lucio Tavora/Xinhua
10.nov.21 - Sergio Moro em sua filiação ao Podemos, em Brasília Imagem: Lucio Tavora/Xinhua

Colunista do UOL

06/12/2021 13h04

Projetar Sergio Moro como competitivo no cenário atual de disputa à Presidência, em que dois candidatos se destacam muito à frente nas pesquisas é, ainda, forçar a barra.

Moro teve 3% no voto espontâneo na última pesquisa Ipespe. Está em terceiro lugar, empatado com Ciro Gomes, tem mais rejeição (50% contra 43% de Ciro) e é pouco conhecido no Brasil. Na dianteira estão Lula (32%) e Bolsonaro (22%). Para desbancar o segundo colocado, o ex-juiz teria de crescer muito em pouco tempo.

Os bolsonaristas convictos definem Moro como traidor e oportunista. À esquerda ele também é visto oportunista, além de ser o juiz que corrompeu o sistema de justiça, ao se comportar de maneira parcial nos processos que envolveram o ex-presidente Lula e tira-lo da eleição em 2018. Parte dos eleitores que não são lulistas mas votarão em Lula no próximo pleito, compreendem essa manobra de Moro, atestada pelo Supremo Tribunal Federal. É uma vergonha para quem foi juiz e uma hipocrisia para quem tem o slogan "por um Brasil justo para todos".Sobra pouco espaço para Moro, que disputa eleitores "nem-nem" com João Doria (PSDB) e Ciro Gomes (PDT).

O ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro tem o apoio de uma parte dos descontentes com o governo Bolsonaro (os arrependidos), dos lavajatistas e antipetistas. Estima-se que essa parcela corresponda a cerca de 10 a 15% dos eleitores. Ainda não é o suficiente para virar em cima de Jair e não há muito como Moro crescer mais.

Não dá para desvincular da imagem de Moro o fato de o ex-juiz ter aceitado ser ministro de Bolsonaro, mesmo sabendo de sua inclinação à extrema direita, da falta de apreço com a democracia e da saudação a torturadores. Quando aceitou compor com Jair, atestou sua parcialidade e mostrou que tolera posicionamentos autoritários.

Moro tentou justificar a adesão como se tivesse ingenuamente acreditado no viés anticorrupção de Bolsonaro. Baseado em quê? Em seu livro "Contra o sistema da corrupção", o trecho sobre o convite a assumir um cargo na gestão bolsonarista, ele mais passa recibo de suas intenções e maneira pouco transparente de atuar do que sua lisura. Diz: "combinamos, entretanto, que a formalização do convite só ocorreria após o segundo turno das eleições para que o fato não tivesse qualquer influência sobre o pleito. Mais um indicativo, aliás, de que jamais pretendi influir na eleição presidencial de 2018". Combinar de anunciar depois não diminui em nada as suas intenções. Ao contrário, mostra sua maneira de agir.

Na Justiça, seu pacote anticrime tentou contemplar os anseios bolsonaristas, ao operar a flexibilização do acesso a armas, a diminuição da fiscalização de munições e tentar emplacar a excludente de ilicitude, cujo resultado pode ser o aumento da violência policial letal.

Moro também se coloca como a antipolítica. Se tem algo que não funciona para gerir um país é a bandeira da antipolítica. Não resolve o problema do Brasil. Não resolveu com Bolsonaro, não vai resolver com Moro. O que se conseguiu - isso sim - foi jogar o país no colo dos partidos do Centrão.

Não adianta entrar na disputa de 2022 com a cabeça de 2018. Os militares descontentes com Bolsonaro se ancoram em Moro, como o general Santos Cruz. Ele também herda um integrante da Lava Jato, o ex-procurador Deltan Dallagnol, mais um a atestar os interesses políticos da operação, que foi fraudulenta. Os dois agora se filiaram ao Podemos. São ambas figuras que estão associadas ao passado recente, já ultrapassado como mostra a tragédia que é o Brasil de Bolsonaro. Moro não traz nada de novo.

Vivemos uma pandemia com um gestor negacionista, que boicotou a vacina e se enfiou em negociações em que há indícios de corrupção. Mais de 600 mil pessoas morreram. A economia foi à lama: inflação alta, energia elétrica cara, preço do gás e dos alimentos subindo, gasolina nas alturas, dólar como nunca se viu. A fome voltou a atingir mais de 19 milhões de brasileiros e até o agronegócio, que demorou a arredar pé do apoio ao governo, perdeu dinheiro. Há desmonte na ciência e desqualificação da educação, como vimos nas crises da Capes e do Enem. O governo da antipolítica é um fracasso.

Na campanha de 2022, Moro pode atrapalhar o bolsonarismo, enfraquecer seu candidato. Sua função será tornar mais claro o derretimento de Bolsonaro. Mas virar, fica difícil, apesar de o antipetismo ainda não ter entrado no jogo para valer.

Enfraquecido, Bolsonaro poderia optar por disputar o Senado. Para isso, seria necessário se licenciar em abril. Jair não quer perder o foro privilegiado, sabe que corre o risco de ser preso. Se Bolsonaro desistir da disputa presidencial, Moro seria candidato mais fácil para Lula. Mas teria de enfrentar Doria, mais preparado como candidato.

Que não se engane quem pensa que Moro é moderado. Ou que o ex-juiz seria uma opção da "antipolítica". Moro não é "o novo". É mais do mesmo: um homem vaidoso, autoritário, sem empatia, que finge não almejar a política quando no fundo queria mesmo era ser presidente. No fundo, ele traiu os princípios da antipolítica.

Não há fono que salve quando falta conteúdo, experiência e competência.