Wálter Maierovitch

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Opinião

Julian Assange: Biden recua, e acordo com liberdade está próximo

O fantasma do russo Alexei Navalny deve estar ativo nos pesadelos atormentadores das noites de sono do presidente americano Joe Biden.

Opositor do governo autocrático de Vladimir Putin, o advogado e ativista político Navalny foi envenenado, em agosto de 2020, pelo serviço secreto russo. Usou-se o agente nervoso, paralisante, Novichock.

Depois de salvo no hospital Charité de Berlim, Navalny resolveu voltar à Rússia para continuar a oposição e lutar pela liberdade de expressão e de pensamento. O governo Putin, por uma Justiça de fancaria, pró-regime, o colocou na prisão.

Na verdade, Navalny virou um preso político com inventadas condenações por delitos comuns. Foi parar, longe da família, num cárcere-duro siberiano. Lá faleceu sem ninguém acreditar no laudo cadavérico oficial a apontar morte súbita, após passeio matinal na gelada região.

Navalny era um preso político que Putin silenciou. E o jornalista australiano Julian Assange, do WikiLeaks, seria, por vingança do Estado americano, o preso político silenciado por Biden?

Alexei Navalny durante transmissão de vídeo com advogados de sua prisão, em junho de 2023
Alexei Navalny durante transmissão de vídeo com advogados de sua prisão, em junho de 2023 Imagem: NATALIA KOLESNIKOVA/AFP

Acordo em costura

Biden pode imaginar em época eleitoral o estrago político derivado do acolhimento da extradição do jornalista Julian Assange.

O presidente americano acabou de assistir às manifestações nas universidades contra a guerra em Gaza. Sabe bem que ativistas, interna e externamente, não deixarão de protestar em favor de Assange — um jornalista que mostrou, por documentos oficiais com timbres de secretos, as consumações de bárbaros crimes de guerra cometidos pelas forças americanas no Iraque e Afeganistão.

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Um governo democrático colocar por 175 anos na cadeia um jornalista seria um ataque à liberdade de expressão e de imprensa: Assange foi acusado por 17 crimes de espionagem e as penas, caso somadas, chegam a 175 anos. Fala-se, também, por atentado contra a segurança do Estado, em risco de pena de morte.

No momento, e correndo contra o tempo dado pela Justiça britânica para Assange apelar da decisão de extradição, o Departamento de Estado americano está atrás de um acordo. Lógico, sem extradição, sem privação de liberdade.

Assange é defendido por uma equipe que tem à frente a advogada Stella Moris, sua esposa. Os advogados já iniciaram os primeiros contados com o Departamento de Estado dos EUA, enquanto Assange, abatido psicologicamente, permanece em cela. Não teve condições psicológicas para acompanhar o julgamento resultante no reconhecimento do direito de apelar: nas democracias, decisões em instância única não são recomendadas.

A proposta do Departamento de Estado de acordo seria do tipo "plea bargaining" — Assange reconheceria a culpa por um delito menor de modo a obrigar-se a nunca ingressar em território norte-americano. Mais ainda: cairia o seu enquadramento na Lei de Espionagem, uma legislação do tempo da Primeira Guerra Mundial. Por outro lado, haveria o compromisso de fixar residência na sua natal Austrália, sem giros pelo mundo.

Com isso, Biden colocaria um fim no caso Assange, uma saga judicial que dura 14 anos.

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Um pouco de cinzas

Para evitar a extradição, Assange refugiou-se em 2012 na Embaixada do Equador em Londres. O governo equatoriano mudou e assumiu um presidente direitista. Em julho de 2019, o jornalista restou arrancado à força da embaixada pela polícia britânica, com autorização do presidente do Equador.

No aguardo da definição do pedido de extradição feito pelos EUA, está custodiado no cárcere de Belmarsk, considerado o mais seguro e duro, faz cinco anos.

Pano rápido

A jornalista Natalia Viana, que trabalhou com Assange e testemunhou seu martírio, bem ressaltou em artigo na Folha, em fevereiro: "Se a extradição for adiante, quem estará no banco dos réus não é só Assange, mas todos os jornalistas que se engajam em publicar informações de interesse público".

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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