Entidade israelita do RS declara governador Tarso Genro "persona non grata"
Irritada com o que identificou como "desprezo e total desconsideração com a nossa comunidade" em razão de demonstrar posicionamento pró-Palestina, uma entidade israelita gaúcha declarou o governador Tarso Genro (PT), cuja mãe era judia, persona non grata em sua sinagoga.
A decisão, tomada pela diretoria da Sibra (Sociedade Israelense Brasileira Cultura Beneficência), foi comunicada por e-mail à presidência da Firs (Federação Israelita do Rio Grande do Sul) no último dia 5 de agosto.
Com isso, Tarso não será convidado, muito menos recebido, nos eventos e festividades da comunidade judaica que ocorrerem até o fim deste ano nas dependências da Sibra.
A reportagem do UOL recebeu uma cópia do texto assinado pelo presidente da entidade, Sérgio Caraver, endereçado ao presidente da Firgs, Mario Cardoni. Seu conteúdo, inclusive, foi publicado no Facebook de forma pública pelo perfil da Sibra com o título "Posicionamento da Sibra [carta remetida a Firs]".
Procurado, o remetente se negou a comentar o assunto. Por telefone, Caraver foi veemente: "Não tenho que dar satisfação para ninguém. O que posto no Facebook não diz respeito ao UOL". E afirmou que qualquer pergunta deveria ser enviada de maneira oficial para ser apreciada pelos seus advogados antes de respondida.
No último dia 8, a reportagem enviou alguns questionamentos a ele, que, até o momento da publicação desta reportagem, nesta segunda-feira (11), não havia dado retorno.
Carta diz que Tarso mostra desprezo e desconsideração pela comunidade judaica
Na carta enviada ao presidente da Firs, Caraver explica que, em reunião com os diretores da Sibra sobre as ações que serão aplicadas nas festividades deste ano, "uma das determinações é de que nossa instituição não irá receber o Sr. Tarso Genro em nossas dependências".
Caraver comenta na correspondência: "Acreditamos que o cargo de Governador do Estado do Rio Grande do Sul não pode estar sendo representado dentro de nossa sinagoga, em um momento tão importante, por uma pessoa que a cada momento mostra seu desprezo e total desconsideração com a nossa comunidade".
Questionado pela reportagem, Caraver não quis identificar quais atitudes de Tarso demonstrariam desprezo e desconsideração pela comunidade judaica.
A carta enviada à Firs segue: "A Sibra sempre acreditou no diálogo e na convivência entre todos, mas nesse momento em que o antissemitismo aflora na comunidade do RS, não podemos aceitar a postura do líder de nosso Estado, que manda mensagens claras de ser pró-Palestina. Em respeito a todos os integrantes da comunidade judaica do Rio Grande do Sul, principalmente aos nossos associados, não iremos impor uma presença tão incômoda como a do Sr. Tarso Genro", encerra.
Presidente da Firs diz que posição de Tarso "não é algo que gostaríamos de ver"
Procurado pela reportagem, Cardoni explicou que a Sibra é uma entidade que pertence à comunidade israelita gaúcha, mas que é independente em suas decisões.
"Acho legítimo que entidades que tenham um grupo de pensamento dentro da democracia possam ter suas decisões respeitadas. De fato, existe uma inclinação [por parte do governador Tarso] que nós não gostaríamos de ver. O governo do Estado é um governo de todos. Quando se apontam algumas indicações, quando se indica uma certa tendência unilateral, as pessoas podem tomar essa decisão [como fez a Sibra]", disse Cardoni, não exemplificando as atitudes que desagradam seus comuns.
Firs não quer politizar o assunto; Tarso não comenta questão
Cardoni afirma que levará o assunto às demais entidades para sugerir uma decisão unitária.
"Faço a coordenação de 34 entidades, e não de uma só. Nossa decisão também é democrática e vamos debater essas questões com mais tranquilidade, fora do calor do momento, que é muito complicado. A tragédia no Oriente Médio não pode ser instrumentalizada politicamente."
Procurado, o governador Tarso Genro informou que não se manifestará sobre o assunto. Sua assessoria ressaltou, entretanto, que "o governador tem mantido diálogo permanente com a comunidade judaica do RS e o objetivo é evitar que a situação na Faixa de Gaza prejudique a relação entre judeus e palestinos no Estado".
Entidade palestina pede boicote do governo do RS a companhia israelense
Na semana passada, o BNC (sigla em inglês para Comitê Nacional Palestino pelo Boicote, Desinvestimentos e Sanções) publicou uma carta aberta a Tarso, pedindo que o governador não assine um memorando de entendimento entre o governo do RS e a AEL, subsidiária da Elbit Systems - companhia militar de Israel - em solo gaúcho. O objetivo da assinatura é a construção de um microsatélite militar.
Em abril de 2013, Tarso percorreu o Oriente Médio capitaneando uma comitiva em agenda de compromissos de negócios, momento em que assinou protocolo com a Elbit para uma parceria no polo aeroespacial gaúcho.
Na ocasião, Tarso recebeu reclamações de diversas entidades pró-Palestina, já que a Elbit é denunciada por sua colaboração na construção do muro que separa os territórios palestinos e fornecedora de equipamentos de segurança às colônias judaicas.
Na época, Tarso declarou: "Se isso é um problema, não é do Rio Grande do Sul, mas do governo brasileiro. A colaboração na área de defesa é uma pauta nacional."
Governo gaúcho participa de ações pró-Palestina
Na semana passada, o governo gaúcho definiu algumas ações conjuntas com a Embaixada da Palestina no Brasil para ajudar as famílias da Faixa de Gaza que tiveram perdas materiais e humanas nos bombardeios. Arrecadação de alimentos, remédios e preparação de equipes de saúde foram algumas das ações conjuntas definidas.
Além de Tarso e do embaixador palestino Ibrahim Al Zeben, outros nove embaixadores da Liga Árabe, entre eles o do Egito, Argélia, Iraque e Mauritânia, participaram do encontro na sede da Embaixada da Palestina, em Brasília.
"O RS tem o mesmo apreço pelas comunidades palestina e judaica e suas presenças culturais e afetivas são totalmente integradas na vida do nosso Estado. Na missão que realizamos no ano passado, recebemos a solicitação da Autoridade Palestina e de representantes do Governo de Israel para não permitir que os conflitos em Gaza contaminem o convívio dos povos no nosso Estado. Vamos aproveitar essa convivência harmônica para convocar todas comunidades, a alemã, italiana, portuguesa, árabe, judaica, japonesa, todas elas, para participar desta campanha humanitária", afirmou o governador.
No encontro, Tarso reiterou a manifestação de solidariedade ao povo palestino e apoio ao posicionamento do Brasil de considerar desproporcional a resposta de Israel aos ataques do Hamas.
O governador disse ainda que, caso procurado pelo embaixador de Israel no Brasil, manifestará a mesma disposição de manter o diálogo para evitar que a situação na Faixa de Gaza prejudique a relação entre israelenses e palestinos no RS.
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