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Como Trump pode judicializar a decisão das eleições nos EUA

O presidente Donald Trump, em pronunciamento sobre a eleição, na madrugada de quarta-feira (4) - Reprodução/BandNews
O presidente Donald Trump, em pronunciamento sobre a eleição, na madrugada de quarta-feira (4) Imagem: Reprodução/BandNews

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

05/11/2020 15h56Atualizada em 05/11/2020 17h29

À medida que o democrata Joe Biden começou a abrir vantagem sobre Donald Trump na apuração dos votos de estados-chave nas eleições americanas —impulsionado principalmente pelos votos pelo correio —, a campanha do presidente passou a judicializar o processo e pedir recontagem em algumas localidades.

Até agora, a equipe do presidente levantou a possibilidade de fraude e questionou o resultado em pelo menos quatro estados: Geórgia, Michigan, Pensilvânia e Wisconsin. Só nesta quinta (5), já teve derrota judicial em dois.

A apuração já foi questionada antes — em 2000, a eleição norte-americana foi decidida após uma decisão da Suprema Corte sobre um pedido de recontagem.

Veja o que esperar em cada estado:

Pensilvânia

A Pensilvânia é considerada um estado-chave democrata. Mas Trump ganhou por lá em 2016 e está na dianteira neste ano. Mesmo assim, a campanha republicana também vê a margem sobre o adversário diminuir e anunciou que irá à Suprema Corte para questionar o recebimento de cédulas pelo correio até três dias após o dia das eleições (próxima sexta, 6).

Segundo o New York Times, são pouco menos de 100 votos em questão.

Wisconsin

Depois de levar a primeira virada, a campanha anunciou o primeiro pedido de recontagem, na tarde de quarta. Segundo a legislação estadual, essa possibilidade se dá quando a diferença entre os candidatos for inferior a 1 ponto percentual.

Com mais de 98% das urnas apuradas, Biden lidera com 49,4% contra 48,8% Trump, o que dá uma diferença de pouco mais de 20 mil votos.

Geórgia e Michigan rejeitaram

No início da tarde desta quinta (5) Geórgia, estado tradicionalmente republicano, foi o primeiro a negar o recurso da campanha de Trump anunciado na última quarta (4), quando Biden começou a encurtar a diferença entre os dois —agora, para menos de 20 mil votos.

A campanha questionava a contagem de supostas cédulas ilegais —53, segundo o jornal The New York Times— no distrito de Chatham County, onde o democrata está vencendo. Nesta quinta, o pedido foi rejeitado pelo Tribunal Superior de Chatham, que ainda não deu mais explicações sobre sua decisão.

A derrota se repetiu no Michigan, onde Biden venceu após uma virada sobre Trump. A campanha republicana pediu que a contagem fosse interrompida e cogitou pedir recontagem. A lei do estado permite a solicitação por parte de candidatos desde que o requerimento tenha "alegações específicas sobre erros ou fraudes". O Tribunal de Apelação do Michigan também rejeitou o pedido.

Os estados decidem e há prazo

Como os Estados Unidos não têm um órgão nacional que regula as eleições, como o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no Brasil, cabe aos estados anunciarem o vencedor em seus territórios e às Justiças estaduais apurarem as denúncias das campanhas.

De acordo com Carlos Gustavo Poggio, professor de Relações Internacionais da FAAP, nos casos de recontagem os pedidos não devem fazer diferença, pois, geralmente, após o novo cálculo, a resultado sofre pouca alteração, de "uns 200 a 300 votos".

Nos casos de questionamento dos votos pelo correio é diferente. Os estados podem decidir, por exemplo, desconsiderar parte dos votos recebidos pelo correio, onde Biden conquistou grande maioria do eleitorado, e mudar o cenário.

"Vai depender muito de como as legislações estaduais vão interpretar essa questão da chegada dos votos pelo correio e de como fechar o pleito. Se Biden vence por uma margem maior do que ele em 2016, vai fazer o quê?", questiona o professor.

Se Trump, apesar do estreitamento das margens, vencer na apuração nesses estados, a judicialização não deve ir para frente.

Em todos os casos, os estados teriam até o dia 8 de dezembro, uma semana antes do envio dos delegados representantes (14 de dezembro), para decidir o partido que ganhou o colégio eleitoral.

Trump pode causar problemas

Poggio diz "não ver cenário" para uma interferência da Suprema Corte, por mais que Trump anuncie que recorrerá até a ela. Por outro lado, ele lembra que o atual presidente é imprevisível.

"Antigamente, o que parava [possíveis judicializações] era um respeito às instituições, aos participantes democráticos. Mas essas coisas não existem na Casa Branca do Donald Trump, é a lógica do mercado imobiliário de Nova York. Vindo dele, não há como saber [até onde pode ir]", afirma o professor da FAAP.

Se algum caso chegar ao Supremo, o processo fica suspenso e o estado espera a decisão em questão para anunciar seu vencedor.

Em 2000, eleição foi decidida na Suprema Corte

Em 2000, aconteceu isso. Há 20 anos, a eleição presidencial foi anunciada após uma decisão da Suprema Corte sobre um pedido de recontagem. O republicano George W. Bush acabou eleito com vitória na Flórida sobre o democrata Al Gore, depois de cinco semanas da votação.

No dia da eleição, 7 de novembro, o resultado no estado estava tão apertado que, depois de anunciarem vitória para ambos, as redes de televisão decidiram esperar o final total da contagem de votos para declarar o resultado. Depois de alguns dias, o estado declarou vitória de Bush por 537 votos.

Os democratas pediram recontagem manual e, durante o processo, descobriu-se que alguma das células, chamadas células-borboleta, estavam apresentando falhas, com votos para os dois os candidatos ou para nenhum, e isso poderia dar vitória para Al Gore. Os dois partidos recorreram ao Supremo.

Em 12 de dezembro, mais de um mês depois, a Suprema Corte decidiu que a recontagem manual estava violando uma emenda constitucional e não deveria ser feita. Bush foi declarado vitorioso no estado e somou 271 delegados contra 266 de Gore.

O democrata decidiu, então, aceitar a decisão e não recorreu do resultado. "Optou por resguardar o processo democrático americano", afirma Poggio. Algo que, reflete o professor, não se pode garantir sobre Donald Trump.