Irã x Israel: como conflito surgiu? Terá guerra nuclear? Quem se beneficia?

As explosões registradas na noite de ontem (18) em uma região de instalações militares no Irã elevaram em mais um degrau o conflito no Oriente Médio. O ataque foi atribuído a Israel por fontes de inteligência dos Estados Unidos, mas Tel Aviv ainda não confirmou a autoria. O lançamento dos mísseis seria uma retaliação ao bombardeio iraniano realizado no sábado passado (13) contra a capital israelense.

O conflito entre os dois países se arrasta por décadas, mas o ataque direto da semana passada foi avaliado por especialistas como "sem precedentes" e colocou Israel em mais de um conflito prolongado, além do travado contra o Hamas há cerca de seis meses. Países como Líbano, Iraque e Iêmen também tendem a se envolver, o que pode causar uma guerra generalizada na região.

Veja abaixo o que se sabe sobre o conflito entre Irã e Israel até agora, quem são os outros envolvidos e quais são as primeiras consequências esperadas.

Israel nunca tinha sido atacado por um país

Conflitos entre Israel e vizinhos do Oriente Médio se arrastam por décadas, contudo os ataques diretos contra o país sempre foram atribuídos a grupos, e nunca a governos de fato.

O conflito com o sul do Líbano era atribuído ao Hezbollah; com o Iraque, ao Isis, braço da al-Qaeda; com a Palestina, ao Hamas.

Qual a relação entre os países e por que o novo conflito começou?

O Irã historicamente tem uma postura contrária à criação do Estado de Israel. O país se tornou inimigo real do vizinho regional após a Revolução Islâmica de 1979, quando o novo governo do Irã passou a atacar os Estados Unidos e Israel.

No dia 1º de abril, aviões militares de Israel atingiram a embaixada do Irã na Síria. A partir de então, o governo iraniano passou a avisar que faria uma retaliação, que acabou vindo no último sábado.

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Equipes de resgate atuam após ataque de Israel atingir a embaixada do Irã na Síria
Equipes de resgate atuam após ataque de Israel atingir a embaixada do Irã na Síria Imagem: Maher Al Mounes/AFP)

O risco de guerra é real?

Para especialistas ouvidos pelo UOL, o risco de uma guerra entre Irã e Israel é real.

"O Irã afirmou que o ataque contra Israel, que envolveu mais de 300 mísseis e drones, era único e não deveria haver outro. Isso se Israel não revidasse, mas Israel revidou", explica Karina Calandrin, assessora acadêmica do instituto Brasil-Israel e professora de relações internacionais das Universidades Uniso e Insper.

Isso vai escalar em um conflito maior, nunca estivemos tão próximos como agora de uma guerra real entre os dois países.
Karina Calandrin, especialista em Oriente Médio

Para o analista político Uriã Fancelli, o risco de uma guerra maior na região já se desenhava desde o ataque do Hamas a Israel.

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Já existe uma guerra regional. O grande receio desde o começo disso tudo, quando o Hamas atacou Israel no dia 7 de outubro do ano passado, era justamente esse. Essa guerra inicial começou a respingar em territórios diferentes do Oriente Médio.
Uriã Fancelli, analista político

"É o exemplo dos conflitos entre Israel e o sul do Líbano, onde está o Hezbollah, que é um grupo muito mais forte do que o próprio Hamas. Já respingou para o Iraque, já respingou na Jordânia e na Síria, também. A partir do momento em que houve o ataque à embaixada iraniana na Síria, o governo foi pressionado a mudar a sua postura".

Qual o poder bélico dos dois países?

De acordo com a classificação do Global Firepower, que analisa os recursos militares de 145 países, em 2024 o Irã ocupa a 14ª posição quando o assunto é poder bélico, e Israel, a 17ª.

Mas apesar de o Irã ter uma classificação melhor, os especialistas acreditam que o poder militar dos dois países é bastante similar e que, quando se trata de tecnologia, Israel sai na frente.

"O exército iraniano é maior do que o israelense, mas Israel consegue driblar isso com muito investimento em inteligência e tecnologia", diz Karina Calandrin.

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Na avaliação de Uriã Fancelli, o que pode fazer diferença para Israel é seu poderio aéreo.

Os dois países estão entre as 20 principais potências militares do mundo. Mas Israel acaba ganhando no ataque aéreo, o que faz muita diferença numa guerra entre países que não possuem fronteiras diretas.
Uriã Fancelli

Já Calandrin reforça um recurso iraniano: o apoio de grupos terroristas da região.

"A grande sacada que o Irã tem e Israel não são os proxies, grupos [terroristas] que atuam em prol do Irã. E principalmente o Hezbollah, o mais forte deles, estimado em 150 mil soldados", aponta ela. "Outro ponto são as dificuldades geográficas: o território iraniano é muito maior, Israel possui um território menor, não tem profundidade estratégica".

Pode ocorrer uma guerra nuclear?

A produção de armas nucleares pelos dois países também amedronta, mas os especialistas acreditam que a utilização é improvável, mesmo que ambos tenham trabalhado o enriquecimento de urânio nas últimas décadas.

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"É pouco provável [o uso]. Sobre as armas nucleares, é mais sobre ter do que sobre as usar. Mas ainda não podemos falar sobre uma guerra nuclear", afirma Fancelli.

Ele reforça que, ainda que Israel ataque instalações nucleares do Irã, isso não impediria o país de dar sequência ao seu projeto.

"O Irã já conseguiu provar nos ataques anteriores de Israel que destruir uma instalação nuclear não significa a destruição do conhecimento. Eles vão continuar sabendo produzir armas nucleares. E isso se deve ao governo Trump nos Estados Unidos, que saiu do acordo nuclear com o Irã - isso abriu espaço para que o Irã desenvolvesse os seus estudos sobre enriquecimento de urânio", explica ele.

Quem pode se beneficiar com a guerra

Para Calandrin, o conflito com o Irã deve beneficiar o governo do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Os ataques iranianos ocorrem após diversas manifestações da população de Israel, que pede a destituição de Benjamin Netanyahu.

"Netanyahu propôs reformas na constituição que minaram o poder da suprema corte e colocavam em risco o sistema democrático israelense. O resultado disso foi a perda do apoio da população e uma série de manifestações, inclusive contra a ofensiva em Gaza que foi avaliada pela população como pouco eficiente - tanto no sentido da catástrofe humanitária em Gaza, quanto pelo resgate dos reféns, que ainda estão sob domínio do Hamas", explica a especialista.

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Outros países, inclusive de outros continentes, estão diretamente ligados à guerra no Oriente Médio. Mas para os especialistas, apenas a Rússia pode se beneficiar de fato com a guerra no Oriente Médio.

Os Estados Unidos não têm interesse em que haja uma guerra. A China também não, já que isso atrapalha as rotas marítimas pelo mundo, dificultando a comercialização dos seus produtos. Para a Rússia, uma guerra Israel-Irã obriga os Estados Unidos a participar desta guerra. Isso seria vantajoso para os russos, porque assim os EUA são obrigados a realocar os seus recursos militares que estavam à serviço da Ucrânia.
Uriã Fancelli

Os Estados Unidos são os principais aliados de Israel no mundo e ao mesmo tempo veem o Irã como um dos seus principais inimigos. Hoje, o Irã também é aliado da Rússia, que está nessa disputa com os EUA. Não podemos esquecer que esse é um ano eleitoral nos EUA, que já está envolvido em outras guerras, gastando financeiramente e em poder bélico. Numa guerra contra o Irã, que os EUA precisam intervir, o gasto tem que ser muito maior. Eles são um ator central nesse conflito.
Karina Calandrin

Rússia, de Vladimir Putin, pode se beneficiar duplamente da guerra Irã x Israel: por causa dos Estados Unidos e do preço do petróleo
Rússia, de Vladimir Putin, pode se beneficiar duplamente da guerra Irã x Israel: por causa dos Estados Unidos e do preço do petróleo Imagem: Cao Yang/Xinhua

Produção e preço do petróleo podem ser afetados?

O Irã, assim como outros países do Oriente Médio, está entre os maiores produtores de petróleo do mundo, e uma guerra na região deve afetar muito os preços na balança mundial.

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A Rússia também pode se beneficiar da guerra neste ponto. Tanto ela quanto a Venezuela são grandes produtores de petróleo, mas recebem sanções internacionais frequentes. Com a guerra, elas podem sair ganhando em capacidade de negociação de petróleo, já que países que deixaram de comprar voltariam a negociar com ambas.

O risco na alta do preço do petróleo seria bom para a Rússia, já que é um grande produtor de petróleo altamente sancionado. Se o petróleo no Oriente Médio começar a ficar mais caro, países que estão deixando de comprar da Rússia terão de voltar. Semelhante ao que ocorreu com a Venezuela.
Uriã Fancelli

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