Denúncia é "delírio" de Garotinho, e câmeras não gravaram qualquer agressor em cadeia, diz sindicato
O agente penitenciário responsável pelo turno da madrugada na ala onde Anthony Garotinho (PR) está detido negou à polícia, na tarde desta sexta-feira (24), a versão do ex-governador do Rio de Janeiro de que ele teria sido agredido por um homem com um cassetete dentro de sua cela na Cadeia Pública Frederico Marques, em Benfica, zona norte do Rio. No presídio, encontram-se detidos os réus da Operação Lava Jato no Rio.
Segundo o presidente do Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Rio, Gutembergue de Oliveira, as câmeras do presídio não capturaram qualquer pessoa entrando na cela de Garotinho. "Não existe a versão do Garotinho. As câmeras não têm esse registro", disse ele, que afirmou, contudo, não ter tido acesso às imagens.
"O Garotinho teve um delírio. Ele está numa galeria sozinho, numa cela sozinho. É impossível que alguém tenha entrado", afirmou.
A reportagem do UOL tenta localizar a defesa do ex-governador para que comente o depoimento do agente penitenciário. O advogado de Garotinho, Carlos Azeredo, afirma que ele corre risco de segurança por estar detido no mesmo presídio onde estão seus rivais políticos. Eles estão, contudo, em alas separadas. O defensor disse que Garotinho passou o primeiro lendo em sua cela. Ele tem evitado o banho de sol, onde poderia encontrar o ex-governador Sérgio Cabral e outros peemedebistas.
Pisão no pé e bastão de beisebol
Segundo o dirigente do sindicato, o ex-governador aparentava estar sob efeito de medicamentos. "Confio na na honradez do coordenador de segurança [da cadeia]. Garotinho fez o que qualquer preso que deseja transferência faz: imputou um falso crime a um agente de segurança", disse.
Oliveira afirmou que o agente foi alertado por uma "gritaria na galeria A" do presídio, "que ouviu o Anthony fazer um barulho. Aí o servidor foi lá e viu ele alegando que pisaram no pé dele, que bateram com um bastão de beisebol nele. Uma coisa fantasiosa, para não dizer mentirosa", relatou.
"A briga dele todos nós sabemos qual é. É com o PMDB e nisso não queremos nos meter." "Agora ele está indo ao IML [Instituto Médico Legal], e o IML pode constatar que foram autolesões", acrescentou.
"Garotinho disse que não tem nada a ver com a gente, mas, indiretamente, ele atenta contra a reputação da gente, porque para chegar na cela, precisa da autorização de um agente penitenciário", prosseguiu o sindicalista. Segundo ele, o agente penitenciário está muito "chateado".
Oliveira informou que as imagens do circuito interno de segurança serão apresentadas às autoridades.
O MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) pediu à Justiça nesta sexta que Garotinho seja transferido para outro presídio. O motivo não foi informado.
Preso pela Polícia Federal por suspeita de corrupção e financiamento ilegal de campanha eleitoral, Garotinho relatou à Polícia Civil ter sido agredido dentro de sua cela. A 21ª DP (Bonsucesso) instaurou um inquérito para investigar o caso.
De acordo com seu advogado, Carlos Azeredo, Garotinho disse que a agressão se deu na madrugada desta sexta-feira por um homem com cassetete. "Na madrugada, um elemento invadiu a cela e deu, com um taco de beisebol, um porrete, no joelho dele e um pisão no pé", informou.
"A cela estava fechada. Essa pessoa abriu. A pessoa disse que ele fala demais e deu uma porretada nele", acrescentou o defensor. Segundo o advogado, o ex-governador está com o joelho inchado e dois dedos do pé roxos.
Segundo Garotinho, o suposto agressor trajava calça jeans, camisa azul e sapatos. A Polícia Civil informou ainda que "vai requisitar as imagens do presídio para análise". Agentes penitenciários também prestaram depoimento na delegacia na tarde de hoje.
Após o depoimento, Garotinho foi levado, por volta das 16h, para o IML (Instituto Médico Legal) para passar por exame de corpo delito.
Por meio de nota, a Seap (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária) informou que aguarda laudo do IML "que vai definir acerca das lesões alegadas pelo interno Anthony William Garotinho Matheus de Oliveira".
Ex-secretário de Saúde preso atendeu Garotinho
Segundo o advogado, Garotinho teria sido socorrido pelo ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes, réu da Lava Jato, que é médico e também está preso na cadeia de Benfica. Azeredo disse que "é uma situação constrangedora, mas naquela situação, ele estava como médico e Garotinho como paciente agredido".
O ex-governador do Rio publicou em seu blog, em 2012, fotos de confraternização do também ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) com ex-secretários e empresários em hotel em Paris. O episódio ficou conhecido como "Farra dos Guardanapos". Sérgio Côrtes era um dos convidados.
Para o defensor, Garotinho corre risco na cadeia onde estão os réus da Lava Jato no Rio."É inconcebível que uma pessoa que denunciou todo mundo que está preso lá esteja junto", disse Azeredo.
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Na quinta (23), o TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do RJ) negou pedido de soltura para o ex-governador. A decisão foi tomada em caráter monocrático pela desembargadora Cristina Feijó e ainda será analisada pelo pleno do Tribunal. A defesa afirmou que vai recorrer ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) antes mesmo do julgamento definitivo.
O Ministério Público do Estado do RJ e a Polícia Federal apuram se Garotinho e a mulher, Rosinha Garotinho, participaram de um esquema de cobrança de propina, além dos crimes de concussão (quando o agente público pratica extorsão), participação em organização criminosa e falsidade em prestação de contas eleitorais.
Rosinha também está na Cadeia Pública José Frederico Marques --ela ocupa uma cela na ala feminina. No mesmo presídio, estão o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), o presidente licenciado da Alerj (Assembleia Legislativa do RJ), Jorge Picciani (PMDB) e outros políticos acusados e/ou investigados pela Operação Lava Jato.
Medo de rivais
A defesa de Garotinho afirmou que o ex-governador tem evitado as duas horas de banho de sol as quais teria direito para não encontrar seus rivais políticos na cadeia de Benfica.
"Eu perguntei se ele encontrou algum preso da Lava Jato, ele falou que não, mas que ele teme pela segurança dele por estar sozinho em um corredor e em uma cela, sozinho. Parece que é um corredor intermediário, e o próximo corredor seria o dos presos da Lava Jato", declarou o advogado do casal, Carlos Azeredo.
"Ele está com medo, né? Na presença de todas essas pessoas que ele denunciou, ele corre sério risco de vida", completou.
Na quarta, após a prisão do político, a defesa dele enviou uma nota na qual acusa Picciani de ter declarado a Cabral, em uma suposta reunião dentro da penitenciária, que daria um "tiro na cara de Garotinho". Também em nota, a Seap informou apenas que "garante a integridade física dos internos do sistema penitenciário fluminense".
Caixa 2
A família Garotinho tem base política na cidade de Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, onde Rosinha foi prefeita de 2008 a 2016. A PF suspeita que o marido, que também já governou o município, cobrava propina nas licitações da prefeitura, exigindo pagamentos ilícitos para que contratos fossem honrados pelo poder público.
Além disso, segundo as investigações, "uma grande empresa do ramo de processamento de carnes", a JBS, firmou contrato fraudulento com uma empresa sediada em Macaé, também no norte fluminense, para prestação de suposto serviço de informática. A PF apura se o acordo seria fictício, com objetivo único de repassar R$ 3 milhões para campanhas eleitorais em Campos dos Goytacazes.
"Suspeita-se que os serviços não eram efetivamente prestados e que o contrato, de aproximadamente R$ 3 milhões, serviria apenas para o repasse irregular de valores para utilização nas campanhas eleitorais", informou a PF, em nota.
Além da própria carreira política, o casal Garotinho tem grande influência em relação a vereadores e lideranças partidárias na cidade do norte fluminense, relatam os investigadores.
Um dos delatores da JBS, o executivo Ricardo Saud, disse, em depoimento prestado em agosto, que houve um repasse de R$ 2,6 milhões a Anthony Garotinho.
As prisões foram determinadas pelo magistrado da 98ª Zona Eleitoral, Glaucenir de Oliveira. Também foi detido na ação o ex-secretário de Governo da Prefeitura de Campos dos Goytacazes Suledil Bernardino. No total, foram expedidos pelo juiz eleitoral nove mandados de prisão e dez de busca e apreensão.
Segundo o advogado Carlos Azeredo, não há motivos para Rosinha estar detida. Ele considera ainda que Garotinho é vítima de perseguição da Justiça.
“Na verdade, não houve acusação contra a Rosinha. Ela não foi acusada de nada até agora. Não há motivos para a prisão. Já o caso do Garotinho é mais peculiar. Ele sofre uma perseguição desde que denunciou irregularidades praticadas pelo desembargador Luiz Zveiter. O caso dele contraria as demais decisões da Lava Jato, onde também ocorreu caixa dois. Todas as decisões ocorreram na esfera da Justiça Federal. Só o caso dele que não, o que reforça o depoimento de perseguição."
Outras detenções
Na primeira das três vezes em que determinou a prisão de Garotinho, em novembro de 2016, o juiz Glaucenir afirmou que o ex-governador comandava com "mão de ferro" um "verdadeiro esquema de corrupção eleitoral" no município, onde ele e sua família formam uma espécie de clã político. Anthony Garotinho foi preso na ocasião.
Detido, ele causou tumulto ao tentar resistir a deixar um hospital. Dias depois, a Justiça mandou soltá-lo.
A prisão foi no âmbito da Operação Chequinho, que tem como base uma investigação da Polícia Federal referente a denúncias de irregularidades no Cheque Cidadão, programa de assistência social que teria sido usado pelos denunciados para cooptar eleitores nas eleições de Campos do ano passado.
No esquema denunciado à Justiça no ano passado, o magistrado relatou que os acusados ofereciam cadastro ilegal no Cheque Cidadão e, em troca, os beneficiários prometiam votar nos candidatos apoiados por Garotinho e seu grupo político. Cerca de 18 mil novos cadastros teriam sido realizados no programa social com fins eleitoreiros --até o ano passado, o Cheque Cidadão contava, no total, com 30 mil cadastrados.
A compra de votos ocorria sobretudo com eleitores de baixa renda, segundo as investigações. Na eleição, porém, o grupo de Garotinho sofreu uma derrota em Campos. O candidato de Garotinho, Dr. Chicão (PR), foi derrotado por Rafael Diniz (PPS), que venceu no primeiro turno.
Em setembro deste ano, Anthony Garotinho voltou a ser preso, desta vez foi alvo de um mandado de prisão domiciliar e levado por policiais enquanto apresentava um programa de rádio ao vivo. Além da prisão domiciliar, Garotinho também foi condenado à prisão em regime fechado por corrupção eleitoral, associação criminosa e supressão de documentos públicos.
Cerca de duas semanas depois, novamente a Justiça mandou soltá-lo.
Anthony Garotinho, que foi governador do Estado entre 1999 e 2002 e deputado federal (exerceu mandato até 2015), era secretário municipal de Segurança em Campos quando foi preso pela primeira vez. Já Rosinha sucedeu o marido no comando do Estado, entre 2003 e 2006. Rosinha também sofreu derrotas na Justiça. Em outubro do ano passado, o TRE-RJ aprovou a cassação do mandato dela à frente da Prefeitura de Campos. Com a decisão judicial, ela ficou inelegível por oito anos por abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação.
(Com Estadão Conteúdo)
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