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Delegada da PF é exonerada de órgão que pediu extradição de Allan do Santos

Allan dos Santos e Jair Bolsonaro - Reprodução de vídeo
Allan dos Santos e Jair Bolsonaro Imagem: Reprodução de vídeo

Weudson Ribeiro

Colaboração para o UOL, em Brasília

10/11/2021 12h37

Depois de tomar medidas para iniciar o processo de extradição do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, que mora nos Estados Unidos há mais de um ano, a delegada da Polícia Federal Amélia Fonseca de Oliveira foi exonerada da chefia do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional). A Casa Civil publicou hoje a decisão em portaria no Diário Oficial da União.

O órgão, vinculado ao Ministério da Justiça, é responsável pela interlocução com autoridades estrangeiras e faz a intermediação de acordos de cooperação internacional. "A mudança é parte de um ajuste natural de equipe", informou a pasta, em nota. O governo não anunciou quem deverá substituir a ex-titular. A delegada foi nomeada em julho de 2020 para ocupar a vaga deixada por Érika Marena, que havia sido indicada ao cargo pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro.

Em decisão no fim de outubro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou que o Ministério da Justiça iniciasse o procedimento de extradição de Santos. O trâmite é intermediado pelo departamento que era comandado pela delegada Amélia Fonseca. Allan foi incluído na lista de difusão vermelha da Interpol, voltada a localizar foragidos no exterior.

Moraes agiu a pedido da PF no inquérito das milícias digitais, que apura a atuação de grupos na internet contra a democracia e as instituições. Allan foi uma das 66 pessoas indiciadas no relatório final da CPI da Covid. Apontado como propagador de fake news prejudiciais no combate à pandemia, Santos foi enquadrado no relatório por incitação ao crime, que prevê de três a seis meses de prisão e multa. O blogueiro é considerado foragido no Brasil desde que teve a ordem de prisão expedida.

Consultado sobre o andamento do processo de extradição, o Ministério da Justiça não se manifestou. O caso corre em segredo de Justiça.

As investigações

A PF investiga Santos no inquérito das fake news, que corre desde 2019, e o das milícias digitais, aberto em julho para apurar a existência de uma organização criminosa que visa atentar contra a democracia. Esse último foi aberto depois do arquivamento do inquérito dos atos antidemocráticos, e foi prorrogado em outubro por mais 90 dias.

Além de estender as investigações, Moraes também determinou a suspensão da conta de Santos no Twitter. No começo de outubro, reportagem da Folha de S.Paulo revelou que Santos usou uma estagiária do gabinete do ministro Ricardo Lewandowski como informante.

PF citou vínculo de Allan com invasores do Capitólio

De olho em embasar a determinação de prisão de Allan dos Santos, o ministro do STF Alexandre de Moraes citou um trecho da representação em que a Polícia Federal aponta suposta proximidade entre o blogueiro bolsonarista e o norte-americano Owen Shroyer, colaborador do site de notícias falsas Infowars. Shroyer atualmente responde à Justiça dos EUA, acusado de invadir a sede do Legislativo norte-americano, em janeiro.

"Identifica-se articulação de [Allan dos Santos] com pessoas diretamente envolvidas na invasão ao Capitólio, inclusive utilizando o canal de [Jonathan] Owen Shroyer [...] para reiterar e reverberar, dessa vez em solo americano, a difusão de teorias conspiratórias voltadas a desacreditar sistema eleitoral brasileiro", afirmou a representação da PF, assinada pela delegada Denisse Ribeiro, em setembro.

Apoiador do ex-presidente republicano Donald Trump, Shroyer é um dos proponentes da tese de que o pleito presidencial de 2020 foi fraudado por integrantes do establishment norte-americano favoráveis ao atual presidente Joe Biden. Segundo a PF, Allan Santos usa essa mesma teoria como "base da argumentação [...] para questionar a lisura do processo eleitoral brasileiro".

Essa suposta associação, para a PF, fundamenta o pedido de prisão preventiva do bolsonarista. "Cumpre ressaltar, inclusive, que a residência de [Allan dos Santos] nos Estados Unidos é mais um fator que aponta o seu periculum liberatis".

A ordem de Moraes, de prisão e extradição, foi proferida em 5 de outubro e tornada pública no fim de outubro. "A despeito da manifestação da Procuradoria-Geral da República, contrária à decretação da prisão, o quadro fático que tem se consolidado desde o ano passado permite concluir pela adequação e proporcionalidade da medida extrema de restrição de liberdade, pois as medidas cautelares anteriormente impostas se demonstraram ineficientes para coibir as práticas criminosas", escreveu Moraes.

Steve Bannon: o elo do Brasil com a ultradireita norte-americana

Em live realizada em agosto de 2020, o blogueiro bolsonarista Allan Santos conversava com Steve Bannon, ex-estrategista-chefe da Casa Branca durante o governo Trump. Allan dizia que vai "fazer as fake news explodirem no Brasil". Bannon responde: "Que a conspiração comece".

Bannon é apontado como um dos entusiastas da invasão ao Capitólio, em 6 de janeiro. Suspeita-se, inclusive, que ex-estrategista possa ter tomado conhecimento prévio do ataque à sede do Legislativo dos EUA: em 5 de janeiro, um dia antes da insurreição que deixou cinco mortos e 140 policiais feridos, Bannon falava em seu podcast, Bannon's War Room, que "o inferno explodiria" no dia seguinte, em que apoiadores de Trump invadiram a sede do Legislativo dos EUA.

Absolvido em primeira instância do crime de racismo após ter feito um gesto popularizado por nacionalistas brancos norte-americanos, o assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Filipe G. Martins, é um dos responsáveis pela aproximação de Bannon com a ala ideológica do governo Bolsonaro. Quando era editor-chefe do site Breitbart News, o ex-estrategista de Donald Trump ajudou a impulsionar a popularidade de figuras como o provocador britânico Milo Yiannopoulos e o autodeclarado nacionalista branco Richard Spencer.

No Brasil, a Polícia Federal monitora as ações de Bannon relacionadas às eleições no Brasil em 2022. Crítico do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Bannon constantemente levanta dúvidas quanto à segurança das urnas eletrônicas brasileiras. A justificativa da PF é que os seguidores de Bolsonaro usam métodos de desinformação em redes sociais iguais aos que Bannon coordenava em favor de Trump quando era conselheiro sênior da Casa Branca.