Bolsonaro se filia ao PL e retoma 'casamento' com o centrão
O presidente Jair Bolsonaro se filiou ao PL na manhã de hoje (30) em um evento com clima religioso e conservador em Brasília. O chefe do Executivo federal criticou a esquerda e o PT e fez diversos acenos ao Congresso em um discurso que marcou oficialmente a retomada do "casamento" de seu governo com o centrão.
Sem partido desde 2019, quando deixou o PSL, pelo qual foi eleito, Bolsonaro já passou por oito legendas desde que iniciou sua vida política, em 1989. Ele saiu do PSL em meio a uma série de brigas internas e tentou fundar o Aliança pelo Brasil, mas fracassou —não obteve nem um terço das assinaturas exigidas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O PL, que é comandado pelo ex-deputado Valdemar da Costa Neto desde a década de 1990, por sua vez, deu "carta branca" ao presidente para tê-lo na legenda. O partido já compôs o governo Lula (PT), entre 2003 a 2010, tendo um filiado, José Alencar, como vice.
Confesso, prezado Valdemar, a decisão não foi fácil. Até mesmo o Marcos Pereira [presidente nacional do Republicanos], conversei muito com ele, bem como outros parlamentares também. E uma filiação é como um casamento. Agora, não seremos marido e mulher: seremos uma família"
Presidente Jair Bolsonaro, na filiação ao PL
O auditório do Complexo Brasil 21, em Brasília, estava lotado. Do lado de fora, apoiadores saudavam os políticos que chegavam em clima de carnaval, ao som de funk. Entre as autoridades, porém, houve diversas menções a Deus e duas orações por parte dos deputados Marcos Pereira (Republicanos-SP) e Marco Feliciano (PL-SP).
Na mesa sobre o palco e na plateia havia políticos e autoridades bolsonaristas de diferentes partidos, como o governador Claudio Castro (PL-RJ), onze senadores, mais de vinte deputados e diversos ministros, entre eles Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura), que também tem a expectativa de se filiar à legenda. A maioria não usava máscara.
Além de Bolsonaro, também se filiaram ao PL o senador Flávio Bolsonaro, de saída do Patriota, e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho.
Após o evento fechado, Bolsonaro subiu em um trio elétrico estacionado na frente do centro de convenções para falar com os apoiadores que não puderam entrar. A área externa, no entanto, estava muito mais vazia do que a interna, onde houve aglomeração.
Casamento com o centrão
"Estou me sentindo em casa", disse Bolsonaro aos diversos deputados presentes, passando a mão sobre os ombros do deputado Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, em referência aos 28 anos que passou na Casa. Seu discurso de pouco mais de dez minutos, recheado de bandeiras conservadoras, teve diversos afagos ao Congresso e marcou o casamento do seu governo com o centrão.
"Eu e o Valdemar não somos pessoas que vamos definir as coisas sozinhos. Em grande parte, a nossa visão vai passar por vocês. Nós queremos compor e, com essa composição, fazer o melhor para o Brasil", disse o presidente aos parlamentares, sob gritos de "mito".
"Em grande parte, o parlamento tem jogado junto com o Executivo. Isso é muito bom. Quando se fala em Judiciário tem a ver conosco também, sim. Amanhã [1º] está prevista a sabatina do nosso indicado [ao STF], André Mendonça. Espero que seja aprovado o nome dele", disse.
Bolsonaro também atacou a esquerda, da qual seu partido fez alianças, durante os governos petistas. "O futuro do Brasil está em nossas mãos. Nós tiramos o Brasil da esquerda. Olha para onde estávamos indo, olha para onde foi certos países, como a Venezuela. Nós não queremos isso."
O presidente também focou sua fala em temas conservadores, tom uníssono durante sua campanha em 2018. "Nós todos conseguimos fazer brotar, no coração do brasileiro, o sentimento de patriotismo, de amor à pátria, de falar em Deus, pátria e família, a termos nossos próprios lemas", disse Bolsonaro.
"Estou feliz de ele [Bolsonaro] estar se filiando ao PL, que é um partido grande, tem tempo de televisão, tem uma estrutura e está nos recebendo de braços abertos. Então tem tudo para dar certo, sim", declarou o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho mais novo do presidente, à imprensa.
Questionado se também se filiaria ao partido, ele disse que, "primeiro é o presidente, depois é o resto", mas acrescentou que "acha que sim".
Críticas a Lula e Moro
Se o discurso de Bolsonaro foi mais centrado contra a esquerda, o de seu filho Flávio focou diretamente em dois dos principais adversários do pai nas eleições presidenciais do ano que vem: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-ministro Sergio Moro (Podemos). Sem citar nomes, o senador falou em "ex-presidiário" e "traidor".
"A política pode até perdoar a traição, mas não perdoa o traidor. A decepção vem na proporção inversa da admiração que as pessoas possuíam por ela. Traidor é aquele que, por ação ou omissão, interfere na Polícia Federal. Num governo conservador, havia, por exemplo, uma orientação superior para que dificultasse, por exemplo, a aquisição de arma de fogo", disse Flávio em referência a Moro.
O ex-juiz da Lava Jato foi ministro da Justiça e Segurança Pública de Bolsonaro de janeiro de 2019 a abril de 2020, quando saiu após acusar o presidente exatamente de interferir na PF em prol de Flávio, na investigação das rachadinhas. Desde então, Moro, que lançou sua candidatura neste mês, tornou-se um dos principais desafetos do Planalto.
"Nós, juntos, vamos vencer qualquer traidor e qualquer ladrão de nove dedos pelo bem do Brasil", concluiu Flávio dessa vez em referência ofensiva a Lula.
Tropa bolsonarista
No Congresso, o PL tem se movimentado para atrair o maior número possível de parlamentares fiéis a Bolsonaro. Estima-se que, somente do PSL (partido pelo qual o presidente se elegeu em 2018 e que acabou rompendo no ano seguinte), ocorrerá uma migração de 20 a 30 nomes, segundo afirmou ao UOL um deputado da legenda.
Os cálculos são endossados pelo PL, que vive a expectativa de, alavancado pelo bolsonarismo, formar a maior bancada na Câmara no ano que vem —hoje, o partido é o terceiro, com 43 deputados, atrás do PT (com 53) e do PSL (54).
"As negociações em cada estado vão evoluir agora a partir dessa decisão do presidente e da filiação das pessoas próximas, que escolherão entre o PL, PP e Republicanos. Teremos ministros se filiando para mostrar a força dessa aliança de três partidos e outros que virão para a reeleição do presidente", declarou o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, à imprensa.
Uma das condições impostas por Bolsonaro para aderir ao PL foi a indicação de nomes para disputas de governos estaduais, entre os quais São Paulo, Rio de Janeiro e estados do Nordeste. Em SP, o presidente tenta convencer Tarcísio a investir na empreitada.
No local, ele foi saudado por apoiadores como "futuro governador de São Paulo", mas não comentou a possibilidade.
Procurados na última sexta-feira (26), membros do PL afirmaram que o convite a Tarcísio foi reforçado durante a última semana, mas que ainda não havia uma resposta. Segundo eles, o entrave momentâneo não seria a opção pela legenda em si, e sim a questão do cargo.
Tarcísio estava disposto a se candidatar a uma vaga no Senado, mas tem sido pressionado a aceitar a oferta para disputar o governo de SP.
Indagado se a decisão ficaria para a última hora, um representante do PL afirmou que tinha tudo para ser a "cereja do bolo".
Idas e vindas
O "casamento" entre Bolsonaro e o PL (forma como o presidente costuma se referir à aliança) teve algumas idas e vindas. A "discussão de relação" mais chamativa foi a que adiou a cerimônia de filiação, inicialmente marcada para 22 de novembro.
Uma semana antes, Valdemar da Costa Neto foi ao Palácio do Planalto para conversar pessoalmente com o presidente e acertar os detalhes da filiação. O fato foi imediatamente divulgado à imprensa.
Nos dias posteriores, houve um recuo por parte de Bolsonaro, que exigiu mais espaços de poder dentro da legenda (privilégio na indicação de candidatos e veto a costuras regionais entre o PL e partidos de esquerda).
O PL se mexeu internamente e, apesar dos focos de resistência a Bolsonaro —como a oposição do vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (AM)—, decidiu que o chefe do Executivo federal e concorrente à reeleição no ano que vem teria "carta branca".
Bolsonaro confirmou verbalmente o desfecho do impasse na última quarta-feira (24). "Está tudo certo para ser um casamento que seremos felizes para sempre."
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