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Ex-ministros disseram ao TSE que Bolsonaro foi o responsável por reunião

Do UOL, em São Paulo

28/06/2023 13h17

Ex-ministros e pessoas próximas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disseram em depoimento ao TSE que ele foi o responsável pela reunião com embaixadores em que questionou, sem provas, o sistema eleitoral. O caso é julgado pela Corte — o relator, ministro Benedito Gonçalves, votou pela inelegibilidade de Bolsonaro, e o julgamento será retomado amanhã, com votos dos demais ministros..

O que aconteceu

Trechos dos depoimentos de três ex-ministros e de um ex-secretário constam no voto de Benedito. Anderson Torres (Justiça), Carlos França (Relações Exteriores), Ciro Nogueira (Casa Civil) e o almirante Flávio Augusto Viana Rocha foram ouvidos como testemunhas pelo TSE.

Com exceção de Torres, Benedito descreveu os relatos dos três como de "meros espectadores" em ações de Bolsonaro. O ex-ministro da Justiça participou de uma live que Bolsonaro fez, em julho de 2021, com ataques às urnas, assim como o deputado federal Filipe Barros (PL-PR), que também foi ouvido.

Benedito afirmou que vê o ex-presidente como o responsável "integral e pessoalmente" pela "concepção intelectual" da reunião. O encontro foi realizado em julho de 2022, às vésperas da campanha eleitoral, e transmitido pela estatal TV Brasil.

O que eles disseram nos depoimentos

Torres afirmou que nunca teve acesso a documentos que respaldassem alegações de fraude. Sobre a live em que participou ao lado de Bolsonaro, ele admitiu que "não sabia ao certo, sequer, o contexto de elaboração dos relatórios de onde tirou trechos para leitura".

A testemunha [Torres] foi, por sete vezes, confrontada em audiência com sete afirmações factuais feitas por Eduardo Gomes [ex-assessor da Presidência] e Jair Bolsonaro a respeito de indícios ou mesmo de efetiva de adulteração de votos no sistema eletrônico de votação. Por sete vezes, declarou não possuir documentação que as respaldasse.
Trecho do voto oral do ministro Benedito Gonçalves

Ciro Nogueira afirmou que discordava da reunião e que o evento era "superdimensionado e evitável". Segundo o documento, o ex-ministro expressou sua confiança no sistema e afirmou que a preocupação de representações estrangeiras não era com problemas na urna, mas com a possível recusa de Bolsonaro em aceitar os resultados.

A testemunha [Ciro Nogueira] deixou evidente que esteve alheia ao planejamento da reunião de 18/07/2022. O ex-chefe da Casa Civil informou que não foi consultado sobre nenhum aspecto relevante da reunião com embaixadoras e embaixadores. Não teria tido, pelo que relata, oportunidade para informar ao então Presidente da República que era desfavorável ao plano. No entanto, em juízo, não se furtou a registrar sua impressão sobre o encontro que qualificou como superdimensionado e evitável.
Trecho do voto oral do ministro Benedito Gonçalves

Carlos França isentou o Itamaraty e disse que a reunião foi um pedido da Presidência. Segundo o ministro do TSE, "o ineditismo da reunião" ficou assinalado nas respostas do ex-chanceler".

A testemunha [Carlos França] relatou que não teve envolvimento com a produção dos slides exibidos na apresentação de Jair Messias Bolsonaro. O Itamaraty foi acionado apenas para fornecer equipamento e tradutor para a tradução simultânea. Conclui o trecho dizendo 'Nós não tivemos acesso a esse material, e nós não fomos acionados para revisar esse material [...] Não houve participação do Itamaraty na substância desse evento'.
Trecho do voto oral do ministro Benedito Gonçalves

Então secretário de Bolsonaro, Viana Rocha descreveu ter tido uma "atuação periférica", segundo Benedito. "Disse não ter informação sobre a confecção dos slides exibidos pelo então presidente e, de resto, sobre nenhum diálogo a respeito da temática eleitoral".

Filipe Barros negou qualquer intenção de atacar o sistema eleitoral. O parlamentar foi quem obteve cópia do inquérito da PF sobre um ataque hacker ao TSE em 2018 — a invasão não atingiu as eleições, mas o episódio foi usado para Bolsonaro atacar o sistema.

No depoimento, Filipe Barros admitiu que não possui conhecimento de informática e que, embora para suprir esse ponto tenha se aconselhado com diversos especialistas, nenhum deles lhe disse que era possível extrair dos documentos a informação de que tentativas de voto no número "17" [número usado por Bolsonaro na urna em 2018] foram adulteradas para "13" [número de Fernando Haddad na urna em 2018] ou transformadas em voto nulo. Não obstante, diante de uma ampla audiência, o presidente da República e o deputado federal afirmaram por várias vezes que esse fato, singelamente exposto, ocorreu.
Trecho do voto oral do ministro Benedito Gonçalves