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PMs condenados por massacre do Carandiru continuam em liberdade

Matheus Lombardi*

Do UOL, em São Paulo

21/04/2013 12h07Atualizada em 21/04/2013 20h05

Os 23 policiais militares condenados na madrugada deste domingo (21) pela morte de 13 detentos que estavam no segundo pavimento do pavilhão 9, na extinta Casa de Detenção, no episódio que ficou conhecido como massacre do Carandiru, vão continuar em liberdade.

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Mesmo com penas de 156 anos de prisão em regime fechado, os policiais têm o direito garantido pela Justiça de responder ao processo em liberdade até que sejam esgotados todos os recursos jurídicos previstos em lei.

"É uma garantia constitucional de que ninguém é considerado culpado até que a sentença condenatória transite em julgado [quando não cabem mais recursos de apelação]", disse a advogada criminalista Camila Austregésilo Vargas do Amaral.

Os policiais só poderiam ter sido presos se tivessem atrapalhado o processo, ameaçado testemunhas ou tentado fugir do país, por exemplo. "Eles só poderiam ser presos se alguma conduta deles tivesse colocado em risco a ordem pública", disse.

Após a condenação pelo júri, os policiais têm direito a mais um recurso, que será julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Caso a decisão pela condenação seja mantida, eles ainda podem tentar recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Porém, para especialistas no assunto consultados pelo UOL, esse tipo de recurso [ao STJ e ao STF] é muito difícil de ser aceito, apesar de existir a hipótese na lei.

DRAUZIO VARELLA

Bruno Pedersoli/UOL
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Advogada de policiais já entrou com recurso

 A advogada Ieda Ribeiro de Souza, que defende os 23 PMs condenados pelo massacre do Carandiru, afirmou que já recorreu da decisão do Tribunal do Júri.

Em entrevista aos jornalistas logo após a leitura da sentença, a advogada disse que avalia "com muita frustração" a decisão dos jurados. "Foi uma decisão por maioria de votos, na verdade por diferença de um voto, e isso não reflete a vontade da sociedade brasileira. Não é essa a vontade da sociedade brasileira."

O promotor Fernando Pereira da Silva, indagado se o resultado desse primeiro júri pode repercutir para o dos demais, declarou: "É uma resposta que a sociedade dá, assim como o Tribunal do Júri deu em relação ao coronel Ubiratan [condenado em júri popular em 2001], no sentido de reconhecer que o que aconteceu no dia 2 de outubro de 1992 no pavilhão 9 foi um massacre."

Julgamento terminou durante a madrugada

A sentença começou a ser lida em plenário pelo juiz José Augusto Nardy Marzagão à 1h10, quase 16 horas após o início da sessão de sábado (20), voltada aos debates entre acusação e defesa.

Inicialmente, os réus eram julgados pela morte de 15 presos. No entanto, a Promotoria pediu a retirada de dois homicídios do processo porque os presos tinham ferimentos por arma branca, não por tiros. A pena para cada um dos PMs foi estabelecida com base no mínimo previsto no Código Penal para homicídios, que é de 12 anos --número multiplicado pelo total de mortes.

A primeira tentativa de julgar os policiais começou no último dia 8, mas teve de ser adiada porque uma jurada passou mal e foi dispensada. Pelas regras judiciárias, uma vez sorteados os sete jurados que formam o Conselho de Sentença, a saída de algum deles implica em se formar um novo conselho. Remarcado para o dia 15 seguinte, o julgamento chegou a ser suspenso durante um dia e meio, na quarta e quinta-feira, porque novamente um jurado passou mal. Avaliado pela equipe médica do Tribunal de Justiça, o rapaz foi liberado no mesmo dia e o júri foi retomado.

Ao todo, 79 policiais militares foram denunciados. Eram 84, mas cinco deles já morreram. O juiz definiu que o episódio seria julgado por etapas, até o final deste ano, para seguir a ordem da denúncia --que citou número de policiais que, por pavimento, foi responsável pelas mortes. Marzagão não concedeu entrevista depois do julgamento.

A primeira data designada para o júri havia sido 28 de janeiro deste ano, mas foi adiada pela Justiça a pedido de Ministério Público e da defesa dos réus para que nova perícia de confronto balístico pudesse ser feita. Em março, o Instituto de Criminalística respondeu que novo laudo era inviável por razões técnicas.

Na fase de debates, porém, o Ministério Público afirmou que o laudo foi prejudicado porque 160 projéteis retirados dos corpos das vítimas desapareceram do Dipo, órgão do TJ que fica no segundo andar do Fórum Criminal da Barra Funda e para onde são remetidos os inquéritos policiais. O caso foi comunicado ao Tribunal este ano e segue sob investigação.

Júri teve sobreviventes e ex-governador Fleury entre testemunhas

O primeiro dia do julgamento teve o depoimento de ex-detentos testemunhas da ação da polícia. Um deles relatou que não atendeu ao pedido dos PMs feito no pátio da cadeia, logo após a invasão, de levantar o braço para dizer que ainda estava vivo.

 

"Parece que um anjo me disse: não faça isso", disse o pedreiro Marco Antonio de Moura, 44. "Os presos que estavam feridos e ergueram as mãos nós nunca mais os vimos", disse.

No segundo dia do julgamento, foi a vez do depoimento mais aguardado. O ex-governador de São Paulo Luiz Antonio Fleury Filho, no cargo à época da ação, disse que a invasão foi "legítima e necessária".

O ex-governador, que depôs como testemunha de defesa dos policiais, afirmou tinha responsabilidade política sobre a ação. "A responsabilidade política era minha; a criminal, caberá aos jurados esclarecer."]

No terceiro dia, o julgamento foi suspenso por conta de um mal-estar de um jurado --que posteriormente foi avaliado por uma equipe de médicos do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo).

No quarto dia, o julgamento teve a leitura de peças que constavam no processo. Na sessão do Tribunal do Júri, o Ministério Público lançou mão de reportagens em vídeo sobre o massacre e sobre excessos da Polícia Militar diante de vítimas sem chances de defesa.

O interrogatório de quatro réus ocorreu no quinto dia de julgamento. Todos disseram que somente revidaram o ataque dos presos, que teriam armas de fogo. 

O último dia do julgamento foi dedicado aos debates entre defesa e acusação. A advogada dos réus, Ieda Ribeiro de Souza, os classificou como "heróis" e disse sentir orgulho deles "por serem efetivamente o que a sociedade espera que sejam". Ela ainda analisou que PMs, de um modo geral, são "seres invisíveis por quem a gente passa na rua e nem olha na cara --ainda que ele vá salvar meu filho, pai ou irmão".

O Ministério Público, responsável pela acusação, usou como exemplo a condenação do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu como chefe do esquema do mensalão, em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal), ano passado, para pedir aos jurados do Carandiru que condenem os 26 policiais militares pela morte de 15 presos mesmo sem a individualização das condutas. O argumento foi utilizado na fase de réplica dos debates entre acusação e Promotoria, que antecedem a reunião em que os jurados dirão se os réus são culpados ou inocentes.

* Com reportagem de Janaina Garcia e Gabriela Fujita, em São Paulo

Musa do Carandiru, Rita Cadillac ainda encontra ex-detentos nas ruas de SP

  • "Oi, madrinha. Como vai, madrinha?". Os "afilhados" são ex-detentos do complexo penitenciário do Carandiru. A "madrinha" é a dançarina e cantora Rita Cadillac, 59, que, talvez para muitos da extinta casa de detenção, a figura de musa coubesse melhor no imaginário que o de figura maternal.