Crise hídrica no rio Doce pode piorar devido à enxurrada de lama
A enxurrada de lama no rio Doce provocada pelo rompimento das barragens da mineradora Samarco em Mariana (MG) pode agravar a crise hídrica que acomete cidades banhadas pelo rio no oeste de Minas Gerais e no Espírito Santo. Isso porque o barro, composto por rejeitos de ferro e manganês da atividade de mineração, deve assorear o leito do Doce.
Devido à falta de chuvas nos últimos meses, o rio Doce passa por uma de suas maiores crises na história. A redução do volume de água chegou a provocar o fechamento da foz do rio no meio do ano.
Em agosto, o volume do rio diminui tanto que ele deixou de ter força para encontrar com o mar. A profundidade do rio Doce, no nordeste do ES, ficava em uma média de 1,5 metro, e chegou a medir apenas 26 centímetros. Um mês depois, a Agência Nacional de Águas (ANA) afirmou que no município de Colatina, também no noroeste do ES, o nível chegou aos três centímetros. O local que marcava a foz do rio tinha se transformado em um banco de areia.
Já há uma escassez hídrica enorme causada pela diminuição de chuvas. O assoreamento do rio compromete ainda mais a disponibilidade de água.
Marcus Vinicius Polignano, ambientalista coordenador do Projeto Manuelzão, que monitora impactos ambientais nas bacias hidrográficas dos principais rios mineiros pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Segundo o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), estima-se que foram lançados 50 milhões de m³ de rejeito de mineração (o suficiente para encher 20 mil piscinas olímpicas). Especialistas dizem que a quantidade de lama despejada no rio é tão grande que torna inviável a recuperação de ecossistemas locais.
Para Polignano, o depósito de material no leito do rio dificulta a recuperação de seu volume de água. Ele explica que o assoreamento "traz consequências a médio e longo prazo, pois compromete a capacidade de resistência e resiliência do rio".
A coordenadora da Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica. Malu Ribeiro, afirma que o rio já não estava saudável e que tragédia pode fazer com que ele desapareça. "A bacia vinha sofrendo com um período de seca, estava doente. Essa fragilidade imposta pela seca faz com que o desgaste do rio seja ainda maior, ele não tem força para encarar a lama".
A ambientalista explica ainda que se o rio estivesse em um período de cheia, ou com o volume acima da média, ele teria maior poder de diluição e força para passar pelos escombros.
Cidades que estão no curso do rio Doce por onde a lama já passou, como Governador Valadares (MG), estão sem fornecimento de água, que parou de ser captada devido à falta de conclusões sobre sua potabilidade. Outras por onde a lama deve passar estão estocando água e devem ter interrupção no fornecimento.
A vinda da temporada de chuvas, que poderia significar um alívio para a crise hídrica, representa agora mais uma ameaça de agravamento dos efeitos do desastre ambiental. "Com as chuvas ocorre uma segunda onda de comprometimento da água", diz Polignano. "Todo sedimento [de rejeitos de minério] acumulado vai sendo liberado", completa o ambientalista. Essa "lavagem" da lama que ficou para trás intensificaria o processo de assoreamento e a degradação da bacia hidrográfica do rio Doce.
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