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Resistência do 2 de Julho pode inspirar os protestos atuais contra governo
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O Brasil que tem ido às ruas protestar contra o governo Bolsonaro tem na data de hoje uma forte inspiração histórica. A quem interessa o discurso de passividade política do povo brasileiro? Por que ainda ignorar a participação popular na construção da cidadania neste país?
A data de hoje, 2 de julho, atesta o poder de mobilização das camadas populares para as transformações necessárias à democracia. É o dia da Independência do Brasil na Bahia.
A história de independência do Brasil do domínio português não pode ser resumida ao grito dado por Dom Pedro I às margens do rio Ipiranga, em São Paulo, em 7 de setembro de 1822.
Para a consolidação da "Independência ou Morte", muitas lutas populares foram travadas no território nacional, desde o final do século 18 e início do século 19. O dia 2 de julho de 1823 é um dos marcos mais importantes neste processo e deveria ser mais conhecido pelos brasileiros a inspirar momentos como este em que vivemos os riscos da tirania no poder.
Independência do Brasil na Bahia
Ainda presente nos livros didáticos de história como a Independência da Bahia, a data registra a expulsão das tropas lusitanas que ainda se mantinham resistentes mesmo após a emancipação do Brasil declarada pelo filho do rei, no mítico Grito do Ipiranga.
As batalhas ocorridas em cidades do Recôncavo da Bahia e a vitória definitiva em Salvador contribuíram para efetivar a libertação política do país. Não era só a Bahia que se tornava independente e sim o território nacional. Portanto o 2 de julho é parte fundamental da Independência do Brasil.
O caráter popular das tropas brasileiras neste episódio, reunindo pessoas de diferentes classes sociais, entre negros libertos, mulheres, indígenas, proprietários de terras, entre outros grupos sociais, tornou a conquista uma vitória democrática.
Os baianos sabem da importância destas lutas para a consolidação da soberania nacional, por isso há tanto orgulho nos festejos à data.
Os símbolos máximos das celebrações são as figuras do caboclo e da cabocla, que desfilam por cidades como Cachoeira, Itaparica e Salvador, representando o povo brasileiro.
Há muita devoção e fé, em meio a fatos históricos e recriações populares.
Diferente do sisudo desfile cívico do 7 de setembro, as comemorações do 2 de julho possuem caráter livre e espontâneo. Grupos políticos, rodas de amigos, fanfarras de escolas públicas, levantes culturais, artistas e movimentos sociais desfilam a esperança na liberdade.
Em Salvador, o cortejo parte justamente do bairro que leva o nome do sonho maior que motivou as lutas pela independência —é na Liberdade que está o Pavilhão onde ficam as imagens do Caboclo e da Cabocla, que, segundo os historiadores, participam desde as primeiras celebrações à data.
Pelas ruas do Centro Histórico de Salvador, o desfile passa por monumentos e casas simples, orgulhosamente enfeitadas para testemunhar o recontar dos fatos.
O verde e amarelo se mistura ao vermelho, azul e branco, cores dos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que rapidamente chegaram por essas terras ainda no século 18.
Exército popular e democrático
O famoso quadro pintado por Pedro Américo, em 1888, expressa bem a narrativa oficial sobre o processo de Independência. Na cena, Dom Pedro I declara a separação do Brasil de Portugal com um brado retumbante para aclamação de uma plateia plácida como as margens do rio.
Essa imagem reforça o discurso de dádiva oferecida de forma cordial pela coroa portuguesa. Assemelha-se à história de benevolência da princesa Isabel ao abolir a escravidão. Apaga-se, com isso, os sangues derramados e as vidas perdidas para e garantir essas conquistas.
Algumas dessas vidas são resgatadas e valorizadas, todos os anos, nas comemorações ao 2 de Julho, que mobilizam as populações de Salvador e cidades da Bahia. Entre essas personagens, estão nomes que mereciam serem populares no Brasil, como Maria Quitéria, Joana Angélica e Maria Felipa.
Três heroínas que desempenharam papéis decisivos na nossa independência e se mantiveram no imaginário popular não apenas pelos registros históricos mas também pela encenação festiva que todos os anos reconta esses fatos nas ruas da Bahia.
A obra "Primeiro passo para a Independência", de Antônio Parreiras, pintada em 1928, registra a reunião ocorrida na Vila de Cachoeira, em 25 de junho de 1822 (três meses antes do Grito do Ipiranga), convocada pela Câmara para declarar apoio ao príncipe Dom Pedro.
Neste dia, a cidade teria sido atacada por uma frota portuguesa. A resistência e a vitória do exército local, formado por populares das cidades vizinhas, ilustram o quadro, inclusive com os personagens atingidos como o soldado Tambor Soledade.
Tecnologia para difundir essa história
Os brasileiros podem conhecer mais detalhes desta história por meio de um rico acervo de pesquisas históricas disponíveis em livros, revistas, materiais didáticos, produtos audiovisuais, games e até aplicativo de realidade aumentada, que utiliza a tecnologia para possibilitar acesso ao conteúdo histórico de forma lúdica e interativa.
Não há mais razões para o desconhecimento desta história de mobilização popular e orgulho nacional.
Em 2021, a indignação dos brasileiros com os abusos e violências cometidas pelo atual presidente tem levado multidões às ruas, mesmo com os riscos colocados pela pandemia de covid-19. Um dos principais motivos é justamente a falta de responsabilidade do governo federal no controle da doença, na distribuição de vacinas e na priorização da ciência e da vida.
A tônica das manifestações, incluindo as agendadas para amanhã, 3 de julho, é de que o governo genocida é mais perigoso que o vírus.
Torna-se, portanto, mais do que necessário que se conheça a história de resistência consolidada no 2 de Julho e seus heróicos personagens para inspirar as marchas e mobilizações dos dias atuais.
Que as ruas consolidem a liberdade, regidos pelos Caboclos que determinam: "toca a zabumba que a terra é nossa".
Xetruá!
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