Bolsonaro autorizava Cid a falar com comandantes, diz ex-chefe do Exército

Generais do atual Alto Comando ouvidos pela coluna salientam que a afirmação de Freire Gomes reforça que o tenente-coronel Mauro Cid "extrapolou muito suas missões".

Normalmente, o ajudante de ordens fala com os assistentes do comando e há uma intermediação para que o presidente da República e o comandante da Força conversem.

O impacto dos depoimentos na caserna

A cúpula do Exército ainda está tomando ciência do teor de todos os depoimentos revelados hoje, mas a primeira avaliação é que está sendo demonstrada a atitude legalista adotada por Freire Gomes.

Além disso, militares ouvidos pela coluna destacaram como positivo o fim do sigilo dos depoimentos, já que, ao revelar o teor dos questionamentos e das respostas, será possível esclarecer dúvidas e deixar o "roteiro" mais claro.

Freire Gomes diz ter orientado Cid

Em seu depoimento, Freire Gomes afirmou que chegou a ter Cid como seu subordinado na época em que ele comandava o Batalhão de Ações e Comandos, mas que só veio a reencontrar o tenente-coronel quando já estava no comando do Exército e Cid servindo a Bolsonaro.

Segundo Freire Gomes, a relação entre os dois era "meramente protocolar", mas que ele "sempre lembrou a Mauro Cid, que tinha de adotar, como ajudante de ordens, uma postura institucional".

Apesar dos alertas feitos pelo comandante, Cid usava com frequência essa autorização dada por Bolsonaro para se reportar diretamente a Freire Gomes.

Segundo militares de alta patente ouvidos pela coluna, era "muito comum" que Cid ligasse com frequência para os comandantes e também para ministros do governo.

Cid fazia demandas e passava recados por ordem de Bolsonaro, o que seria alto "muito maior que o poder de sua cadeira", de acordo com relatos de generais.

Promoção comprometida

Cid fechou em setembro um acordo de delação premiada com a PF e acusou o ex-presidente de envolvimento em uma trama golpista para não aceitar o resultado das eleições, como revelou o UOL.

Afastado e sem cargo no Exército, o tenente-coronel continua a receber seu salário de cerca de R$ 27 mil, mantém moradia na vila militar e usar o plano de saúde de um oficial.

Apesar de ainda usufruir dos benefícios concedidos aos militares —mesmo os afastados—, Cid não deve ser promovido na carreira. Neste ano, a turma de formação de Cid passará pela avaliação que concede melhorias na patente, mas a cúpula do Exército admite que o militar "vai perder pontos" que irão atrapalhar sua promoção.

Além disso, nos bastidores, integrantes da cúpula militar reconhecem que seria uma sinalização muito negativa uma eventual promoção de Cid.

Segundo apurou a coluna, Cid chegou a ser orientado por alguns militares a tentar antecipar sua aposentadoria via cota compulsória (quando algumas vagas extras acabam sendo abertas para quem ainda não tem as condições para pedir para ir para reserva). Cid, porém, não aceitou a "sugestão" e segue nos quadros do Exército.