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Carlos Madeiro

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Reportagem

STJ é acionado e vai julgar decisões que validam tese do 'racismo reverso'

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) recebeu na última quinta-feira (11) um pedido de habeas corpus para trancar ação penal do MP-AL (Ministério Público de Alagoas) contra um homem negro acusado de injúria racial (equivalente ao crime de racismo) praticada contra um italiano branco. A ação do MP foi aceita pela Justiça alagoana em primeira e segunda instâncias.

Os nove advogados que assinam a petição direcionada à Presidência do STJ alegam que o Judiciário alagoano acolheu a tese do "racismo reverso", que não tem fundamento legal no Brasil.

A defesa do réu está sendo feita pelo Ineg (Instituto do Negro de Alagoas). O pedido de liminar para trancar a ação de forma imediata será apreciado pelo ministro Og Fernandes, vice-presidente do STJ (no exercício da Presidência até o dia 16). Já o julgamento de mérito da causa será feito pela sexta turma, e o relator do caso é o desembargador convocado Jesuíno Rissato.

Os advogados alegam que a Lei nº 7.716/89 (leia mais abaixo), que tipifica o crime de racismo, tem como base a "proteção de grupos historicamente discriminados na sociedade brasileira".

As práticas discriminatórias da sociedade brasileira sempre se voltaram à população negra, que sofre um processo de marginalização e exclusão social e cultural. Desta maneira, o racismo, enquanto ideologia e mecanismo de manutenção e reprodução de poder, não constitui mero ato de xingamento, desprovido de um contexto histórico.
Texto de habeas corpus no STJ

A decisão do STJ é vista como crucial para enterrar ou validar a tese porque deve criar um precedente para todo o Judiciário nacional para casos similares. A preocupação nesse avanço levou a DPU (Defensoria Pública da União) a produzir uma nota técnica contra o uso da tese no Judiciário nacional.

A decisão, caso prospere, significa precedente de relevante gravidade, já que abre margem para que a tese do 'racismo reverso' passe a ser algo não apenas propagado no senso comum, mas aceito tecnicamente pelo Judiciário brasileiro.
Nota técnica da DPU

Entenda o caso

Sede da Promotoria de Coruripe (AL)
Sede da Promotoria de Coruripe (AL) Imagem: MP-AL/Divulgação

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O caso chegou à Justiça de Alagoas em setembro de 2023, quando um italiano foi à Justiça com uma queixa-crime contra um homem negro de Coruripe, no litoral de Alagoas. Em diálogo pelo WhatsApp em 6 de julho, o agora réu disse ao estrangeiro que "essa cabeça branca, europeia e escravagista não deixava enxergar nada além dele mesmo".

O caso foi para análise do MP porque, com a sanção da lei nº 14532/2023 (que tipifica a injúria racial ao crime de racismo), de janeiro do ano passado, a ação penal passou a ser pública — ou seja, só o MP pode fazer a denúncia de um suspeito.

Em janeiro deste ano, a promotora Hylza Paiva Torres de Castro decidiu fazer uma denúncia ao homem negro por "crime de injúria racial". O juiz Mauro Baldini aceitou denúncia.

Em maio, a Câmara Criminal do TJ-AL (Tribunal de Justiça de Alagoas) negou recurso do Ineg para trancar a ação e manteve o homem negro como réu no processo.

Lei não permite "racismo reverso", diz defesa e jurista

A defesa do homem negro afirma que não se pode aplicar a lei de racismo para proteger uma pessoa branca de supostas ofensas relacionadas à sua origem.

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Ainda sustenta que aceitar a denúncia com base nesses termos viola não só a lei, como a Convenção Interamericana contra o Racismo e Discriminação, promulgada pelo país em 2022.

Considerando o contexto histórico e brasileiro não se encontra a construção de estigmas negativos sobre o corpo branco e costumes europeus. Ao contrário, tais atos são valorizados e enaltecidos, valendo salientar que o intuito da colonização foi forçar aos nativos e escravizados a adotarem os padrões culturais e comportamentais europeus, que eram e são considerados exemplares a todos os povos, a despeito de toda brutalidade empreendida pelas potências europeias em suas colônias.
Texto de habeas corpus no STJ

Para encerrar o caso com celeridade, a defesa fez um pedido de liminar alegando que o Código de Processo Penal define que "se os documentos que instruírem a petição evidenciarem a ilegalidade da coação, o juiz ou tribunal ordenará que cesse imediatamente o constrangimento."

O que diz a lei

A Lei Nº 7.716, de 1989, que define os "crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor" no país, diz em seu artigo 20-C:

Na interpretação desta lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência

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Segundo Welton Roberto, advogado e professor titular de direito criminal da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), a lei deixa claro que o fato de um negro xingar um branco não pode se configurar injúria racial.

Existe aí o que chamamos de tipicidade material. No momento em que ele [réu] fala sobre a questão de europeu ser escravagista, está falando de grupos majoritários, não de minoritários. A lei não foi feita para isso. Eles [da Justiça alagoana] estão confundindo que um crime pode ser cometido por qualquer pessoa, que é a injúria simples, com a injúria racial.
Welton Roberto

Reportagem

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