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Jamil Chade

Análise do Parlamento Europeu considera Corte de Haia para salvar Amazônia

Foco de incêndio em ponto da Amazônia em agosto de 2020 - Christian Braga / Greenpeace
Foco de incêndio em ponto da Amazônia em agosto de 2020 Imagem: Christian Braga / Greenpeace

Colunista do UOL

02/09/2020 11h17

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Resumo da notícia

  • Documento encomendado por deputados sugere que se considere um alerta por crimes contra a humanidade na Amazônia brasileira
  • Análise apresenta propostas para reforçar também a cooperação

Emitir um alerta ao Tribunal Penal Internacional sobre a situação do desmatamento no Brasil poderia ser uma das opções que a Europa teria para lutar pela preservação do meio ambiente e da Amazônia. A referência faz parte de um documento de análise do Parlamento Europeu e que aponta que o que acontece no Brasil poderia ser qualificado de "crime contra a humanidade".

O documento é de junho de 2020 e foi produzido pelo Direção Geral de Política Externa do Parlamento. Os informes de análise da administração servem para subsidiar os trabalhos dos parlamentares e dar orientação sobre possíveis ações a serem tomadas.

A análise específica sobre a Amazônia foi solicitada pelo Sub-comitê de Direitos Humanos do Parlamento Europeu.

Deputados que conversam com a coluna na condição de anonimato indicam que não se trata de uma proposta concreta e nem de uma decisão. Mas o fato de a ideia constar do documento oficial de análise revela que a opção não está descartada.

Num dos trechos, a análise sugere que se considere a viabilidade de alertar o Tribunal Penal Internacional TPI para um possível crime contra a humanidade na Amazônia brasileira.

Queixas contra o governo Bolsonaro no Tribunal já existem. Mas essa é a primeira que poderia vir de um ator estrangeiro. Haia recebe mais de 700 queixas por ano contra diferentes governos e apenas uma fração mínima desses casos se transforma em uma abertura oficial de investigação. Um número ainda menor de casos termina numa denúncia legal.

Mas, segundo o documento do serviço do Parlamento Europeu, o TPI já teria dado indicações que essa possibilidade climática está em sua agenda.

"Em 2016, o Escritório do Procurador do Tribunal Penal Internacional disse que daria prioridade aos casos que causam destruição ambiental", disse. O documento indica que "o Escritório dará especial consideração à perseguição dos crimes do Estatuto de Roma que sejam cometidos por meio de, ou que resultem, inter alia, na destruição do meio ambiente, na exploração ilegal dos recursos naturais ou na desapropriação ilegal de terras".

No caso específico do Brasil, a análise no Parlamento indica que "o atual governo (Bolsonaro) está potencialmente ameaçando a vida dos habitantes indígenas, particularmente aqueles em isolamento voluntário ou sem contato".

"Em um esforço para estabelecer uma maior proteção legal do meio ambiente, a análise propõe que:

- o Parlamento Europeu considere a viabilidade e implicações legais de alertar o Tribunal Penal Internacional (TPI) para um possível crime contra a humanidade na Amazônia brasileira afetando a integridade do bioma amazônico, causando a desapropriação ilegal das terras dos povos indígenas e ameaçando a vida dos povos indígenas em isolamento voluntário".

O documento também sugere que se "considere um estudo para examinar o caso de dar personalidade jurídica à natureza, fortalecendo assim a proteção legal do meio ambiente e criminalizando ações deliberadamente ameaçadoras para a biodiversidade".

Ações

Esse não é o único caminho sobre a mesa. Para os europeus, o Velho Continente pode desempenhar um papel positivo. Mas deixam claro que a ação é urgente.

"A Amazônia está em crise. Alguns cientistas acreditam que faltam 10 anos para que ela atinja um ponto de não retorno quando não estará mais absorvendo CO2, mas contribuindo para sua geração", alerta. "Nas últimas décadas, os governos da região têm feito esforços para retardar o desmatamento através de novas leis, monitoramento por satélite, policiamento e o estabelecimento de áreas protegidas e territórios indígenas onde a floresta pode ser regenerada e utilizada de forma sustentável", disse.

"Estas políticas de restauração, no entanto, enfrentam pressões das atividades de desenvolvimento que procuram extrair riqueza através da extração de minerais, petróleo, gás e madeira, geração de energia, agronegócio e pecuária, facilitada pela construção de estradas ambiciosas e potencialmente destrutivas", alertou.

Uma advertência específica ao Brasil é feita. "O atual governo do Brasil deixou claro que tudo fará para abrir ainda mais a região amazônica a estes interesses, até mesmo ao ponto de permitir estes desenvolvimentos em áreas protegidas e territórios indígenas", disse.

"As ameaças e a violência contra os povos indígenas e defensores do meio ambiente estão aumentando e o assassinato de ativistas que se opõem a esses desenvolvimentos e tentam proteger a floresta atingiu um nível sem precedentes", indicou o texto.

Para o Parlamento, os tratados internacionais sobre meio ambiente e direitos humanos compromete o Brasil explicitamente a respeitar os direitos humanos dos povos indígenas, reconhecendo suas terras, territórios e recursos e sua autodeterminação na definição de suas prioridades de desenvolvimento, bem como a proteger o meio ambiente e a biodiversidade e a implementar as metas estabelecidas pelo Acordo Climático de Paris.

O documento sugere, portanto, uma responsabilidade da Europa diante da crise. "A UE deve implementar mais mudanças em relação às suas atividades comerciais, financeiras e de desenvolvimento para estabelecer uma estrutura legal que proíba ações que deliberada ou inadvertidamente minariam o Acordo Climático de Paris", propõe.

Além do alerta ao tribunal, o documento sugere mais assistência técnica e financiamento aos "povos indígenas para apoiar o auto-governo, o controle e a gestão territorial", além de facilitar a entrada de produtos indígenas ao mercado europeu. ?

A análise fala em apoio à sociedade civil, ativistas, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), apoio aos governos para ampliar e reabilitar as Áreas Protegidas e defender medidas para fortalecer o Estado de Direito na região.