Jamil Chade

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Opinião

Com satélites, tecnologia e fortuna, Musk já é ator da geopolítica mundial

Meses depois do começo da invasão da Ucrânia pela Rússia e enquanto governos buscavam entender a dimensão da crise, um novo ator desembarcou no debate com uma proposta de paz: Elon Musk.

Num primeiro momento, ele passou a fornecer serviços de internet aos ucranianos, algo que foi considerado como essencial para que Kiev pudesse resistir. Mas ele enfureceu o governo ucraniano ao apresentar um plano de paz, incluindo a anexação de territórios por parte dos russos. A proposta foi endossada pelo Kremlin.

Alvo de investigação por disseminação de desinformação na Europa e acusado de espalhar teorias conspiratórias e mentiras, Musk não apenas amplia seu peso econômico. Sua postura revela que ele se considera poderoso o suficiente para abandonar seu papel de empresário e também tentar influenciar na geopolítica.

Em 2022, ele admitiu que impediu que seus satélites fossem usados pelos ucranianos para atacar a Crimeia, desligando o serviços. Musk argumentou que isso colocaria sua empresa, a SpaceX, como "cúmplice de um ator de guerra e que poderia escalar o conflito".

Essa não foi a versão que o cientista político Ian Bremmer revelou. Nas redes sociais, ele contou que Musk havia admitido que tinha conversado com Vladimir Putin e que sabia quais eram as "linhas vermelhas" do Kremlin. Musk negou a versão de Bremmer. Mas o cientista político rebateu: "Ele não é um especialista em geopolítica".

Aquele não foi um caso isolado. Usando sua plataforma nas redes sociais, poder, dinheiro e satélites, o homem mais rico do mundo tenta forçar seu espaço como um ator da política internacional.

Ele assumiu a função de apoiador de Donald Trump nas eleições nos EUA em novembro, passou a classificar como autoritários governos que ameaçavam seus negócios e chega até mesmo a sugerir que Taiwan seja devolvida oficialmente para a China.

Mas Musk também coleciona desafetos. Seus comentários sobre ceder Taiwan para a China levaram o ministro de Relações Exteriores de Taipé, Joseph Wu, a contra-atacar. "Taiwan avisa a Elon Musk que não está à venda".

Autoproclamado líder da liberdade de expressão, Musk não vê problemas em ampliar seus investimentos na China, onde ele produz mais da metade dos carros da Tesla.

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Para observadores, a proposta de paz que agradou aos russos, o flerte com a China e tantas outras polêmicas mostraram que Musk não estará sempre ao lado dos interesses políticos dos EUA.

Mas, para líderes estrangeiros, encontros com Musk passaram a fazer parte de agendas de visitas ao exterior, em especial aos EUA. Só no ano passado, ele manteve encontros com os chefes de Estado e de governo da Índia, da Itália, da França, da Coreia do Sul, de Israel, da Turquia e de vários outros países. O argentino Javier Milei em 2024 visitou a fábrica de carros elétricos do bilionário em uma viagem aos EUA.

No caso de Emmanuel Macron, o flerte com Musk tinha como objetivo levar para a França a fábrica da Tesla. O francês encontrou espaço em três ocasiões para se reunir com o bilionário. Uma dessas conversas gerou polêmica, já que Musk estava, menos de dois dias antes, numa festa no México. Ao se encontrar com o francês, as câmeras captaram quando o bilionário afirmou que "teve de dormir num carro".

Um ano depois, Musk acredita que tem peso suficiente para cobrar de Macron explicações sobre a prisão do CEO do Telegram, Pavel Durov. "Seria bom que o público global entendesse os motivos pelos quais Durov foi preso", disse o bilionário. A prisão ocorreu no dia 24 de agosto, ao desembarcar em território francês. Macron, porém, insiste que não se trata de um ato político.

Já Benjamin Netanyahu, o primeiro-ministro de Israel, fez um desvio de alguns milhares de quilômetros em sua visita aos EUA em setembro de 2023, exclusivamente para encontrar o empresário. Além da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, o israelense voou até a California para se reunir com Musk.

Um ano depois, foi a vez de Musk viajar até Washington para acompanhar o discurso de Netanyahu ao Congresso americano. Um dia antes, ele anunciou que os serviços de internet da Starlink estavam funcionando num hospital de Gaza. Com o apoio de Israel.

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O gesto deixou claro que Israel passou a controlar de forma plena as comunicações em Gaza, em parte com o apoio de Musk.

Para analistas, o real poder do bilionário não é sua plataforma X, mas sim a capacidade de provar, uma vez mais na história, que a tecnologia está no centro da geopolítica.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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