Rodrigo Ratier

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Opinião

Escolas cívico-militares: um grande negócio, mas não para a educação

Quem sabe faz. Quem não sabe ensina. O adágio preconceituoso ilustra bem a desvalorização da profissão docente. O senso comum é de que ensinar seria algo intuitivo, um caminho desprestigiado para quem não deu certo no mercado. Como mostra a reportagem exclusiva do UOL, as escolas cívico-militares acrescentam uma terceira parte ao ditado popular: quem sabe faz; quem não sabe ensina; quem não sabe ensinar abre uma consultoria para prestar serviço a escolas e fica milionário.

Que algo do gênero iria acontecer era bola cantada. A expansão dos colégios militarizados criou um nicho de mercado pronto para ser preenchido. Acontece toda vez que uma iniciativa ganha status de política pública, mas essa se caracteriza pela ausência de concorrência. Para poder se candidatar a fornecedor, você precisa ser militar. Garantia de monopólio, um grande negócio com baixíssimo risco.

Defender que militares, policiais e bombeiros aposentados possam substituir professores e gestores educacionais é algo que escapa à racionalidade. Só se explica por um misto de populismo político (resolver problemas complexos com soluções simplistas — e erradas) e da desvalorização da docência que mencionei no início do texto. Ninguém cogita chamar um policial pra substituir um médico numa cirurgia, um engenheiro na construção de um prédio, um advogado na defesa de um réu.

Mas na educação, pode. Não faz nenhum sentido, mas é o que temos: recorrer a uma instituição com gravíssimos problemas em sua atividade fim (a segurança pública) para exercer uma tarefa para a qual não possuem nenhum preparo.

O policial aposentado, o bombeiro aposentado, o membro das forças armadas aposentado evidentemente não têm repertório para lidar de fato com os problemas e com as demandas da educação pública. Especialmente no atendimento à população mais vulnerável e que precisa mais da escola pública para garantir a aprendizagem, lidando com defasagens e passivos que vão se acumulando ao longo dos anos. Sabe-se bem o tipo de tratamento que a polícia dispensa a esse segmento social.

É conversa mole o papo de que "professores dão aula e os militares só administram", espécie de salvaguarda dos defensores do modelo cívico-militar. Não é possível separar gestão administrativa e pedagógica. Toda ação gestionária da escola é pedagógica. Decidir merenda, onde alocar recursos e materiais, como organizar os espaços e o funcionamento cotidiano: tudo isso é pedagógico e interfere nos processos de ensino e aprendizagem.

E há, sim, previsão de que militares deem aulas. O edital das escolas cívico-militares em São Paulo, por exemplo, prevê aulas de componentes cívicos e de combate às drogas no contraturno, ministradas por bombeiros e policiais aposentados.

Escolas militares atendem a interesses. Mas não são nem os dos alunos, nem dos professores, nem das comunidades, nem da educação.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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