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Moraes x Telegram: após ciberterrorismo, caso virou pau-de-arara virtual
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Com mentiras, incivilidades e abuso de poder econômico, o Telegram executou, na terça feira (9), ações voltadas a demolir o projeto legislativo das fake news, com trâmite no Congresso Nacional desde 2020. E até já aprovado no Senado. No momento, está na Câmara e, se modificado, voltará ao Senado
O Telegram praticou ciberterror. Fez mal uso das suas redes para induzir e incitar. Difundiu o pânico no ambiente telemático virtual.
Atenção. O Telegram até ameaçou deixar o Brasil — com uso de verbo no condicional. Fora disso, partiu para a campanha contra o projeto (PL 2.630).
Como ensinavam os pretores ao tempo que Roma era chamada de capital do mundo ("caput mundi"), para tudo existe limite: "modus in rebus", no jargão pretoriano. Num Estado Democrático de Direito como o nosso, o Telegram passou dos limites estabelecidos na Constituição e nas leis.
Mas e ainda no caso, não só o Telegram merece reprovação. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, começou bem sua decisão e terminou mal ao exigir adesão à publicação de texto da sua lavra.
Exigiu uma confissão, quando a Constituição estabelece, como garantia — incluídas pessoas físicas responsabilizáveis por atos de pessoas jurídicas —, o princípio da não obrigatoriedade de produção de prova contra si própria. Ou seja, o civilizado princípio latino do "nemo tenetur se detegere"
Por partes.
O ciberterrorismo praticado pelo Telegram exigia resposta cautelar da Justiça à sociedade civil. Ela foi dada com a presteza pelo STF. Por meio de decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes e no chamado inquérito das Fake News.
O Telegram, num Brasil ainda impactado pela frustrada tentativa de golpe ocorrida em 8 de janeiro último, difundiu o medo. Chegou ao absurdo de afirmar que a Democracia brasileira estava sob ataque. Sustentou, também, estar o país prestes a aprovar uma lei que iria acabar com a liberdade de expressão.
Em outra passagem da mensagem postada e disseminada, o Telegram colocou uma mentira ao frisar estar a lei, caso aprovado, dando ao "governo poder de censura, sem supervisão judicial prévia". Isso não está no projeto.
Legislação já existente
Importante lembrar: no mundo civilizado, já existe legislação a disciplinar — no interesse público — as plataformas e as redes. No âmbito da União Europeia já vigora a regulamentação e as plataformas se enquadraram.
Mais ainda, o projeto legislativo brasileiro seguiu o padrão europeu. E o ministro Flávio Dino foi preciso ao concluir não ser possível "ficarmos num faroeste". Basta puxar pela memória para recordar o tempo em que o bolsonarismo inundou o Brasil com fake news, difundiu o ódio e causou raivosa polarização política.
Nesse vale-tudo, pelas redes passaram ataques racistas. Postagens incentivaram violações a direitos humanos, ataques às escolas. Tivemos até mortes.
Exemplo internacional
No campo democrático do respeito, cabe fazer-se uma importante e histórica comparação.
No ano de 1988, os Estados-membros das Nações Unidas reuniram-se a fim de elaborar a Convenção de Viena sobre tráfico internacional de drogas proibidas.
O secretário-geral da ONU era o saudoso ganês Kofi Annan. E coube a ele informar que o sistema bancário internacional estava a lavar dinheiro do narcotráfico internacional.
Ao contrário do Telegram e de outras plataformas, os bancos, naquela época, partiram para providências rápidas. No mesmo ano promoveram o Pacto da Basileia.
Além da recomendação do conheça o seu cliente antes de aceitá-lo como correntista ou investidor, chegou com tudo (pleno apoio das instituições financeiras) o chamado dever de vigilância bancário. As leis, inclusive a brasileira, cuidaram de estabelecer o supracitado dever de vigilância bancário. Desse dever, nasceram as unidades de inteligência financeira: no Brasil, criou-se o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Um exemplo. A potente e gigantesca rede interbanck Swift — resultante de uma associação de bancos — cuidou de implantar filtros. Ou seja, vigiar, fiscalizar.
Os bancos bem cumpriram a sua responsabilidade social, diante daquela alarmante situação revelada às Nações Unidas por Kofi Annan. O Telegram não cumpre com o seu dever. No episódio, deu de ombros e fez campanha aterrorizante e arrogante.
Xerife de filmes de faroeste
Como já mencionei nesta coluna, o ministro Alexandre de Moraes, muitas vezes, esquece a suprema toga de magistrado e passa a atuar como se fosse um xerife de filmes do faroeste americano, ou melhor, o dono da lei.
Volto ao ponto colocado no início. Moraes agiu legítima e legalmente ao determinar a remoção das mensagens alarmantes, mentirosas, de campanha contra o projeto de lei. Corretamente estabeleceu prazo ao Telegram para a remoção da mensagem e fixou multa por eventual desobediência.
Parêntese. O Telegram promoveu abusiva campanha promocional, que não se confunde com liberdade de crítica, nem com liberdade de expressão e de imprensa. Fechado parêntese.
Moraes, no entanto, partiu para o arbítrio ao exigir um "mea máxima culpa". Isso ao impor um texto substitutivo, elaborado de próprio punho, com reconhecimento de cometimento de "flagrante e ilícita desinformação", tudo com fraudes e distorções.
Para usar uma imagem, Moraes, em determinação onde deixa o limite legal da proteção social acautelatória, acabou prejulgando monocraticamente.
Pior, Moraes, fora da lei, atuou de forma policialesca e colocou o Telegram num pau-de-arara virtual.
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