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Desabrigados de prédio que desabou em SP fazem turno para dormir e receber doações

Luís Adorno*

Do UOL, em São Paulo

02/05/2018 10h04Atualizada em 02/05/2018 14h13

Parte das 428 pessoas desabrigadas que viviam no edifício que desabou após um incêndio na madrugada de terça-feira (1º) passou a primeira noite na rua, em frente à igreja de Nossa Senhora do Rosário, no largo do Paissandu, centro de São Paulo. Segundo Ricardo Luciano, coordenador do LDM (Movimento Luta por Moradia Digna), de 100 a 120 pessoas dormiram no local.

Com barracas, colchões e cobertores, muitos doados ou trazidos pelas lideranças do movimento que coordenava a ocupação do prédio, os desabrigados fizeram turnos durante a madrugada e o início da manhã desta quarta-feira (2) para receber doações e dormir.

A dona de casa Josiane Barranco, 40, foi uma delas. “Dormi agora pela manhã, durante o meu turno. À noite, fiquei recebendo as doações que chegaram. Graças a Deus, muitas pessoas se solidarizaram. Muito mais do que prefeito, governador e presidente”, disse.

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A porteira Carla Regina de Castro, 34, também passou a madrugada em claro. “Ainda não consegui [dormir]. Um pouco de nervoso, um pouco de insônia, um pouco de pânico. Passei a madrugada sentada, agradecendo quem estava trazendo doações”, contou.

Maria Carmelita Santos de Jesus, 53, é uma das ex-moradoras do edifício que passou a noite no Largo do Paiçandu. "Passei o dia todo aqui. Este colchão foi doado", conta. Auxiliar de limpeza, Maria Carmelita estava no trabalho, quando ocorreu o incêndio. "Só não perdi o documento e a roupa do corpo", conta. Mesmo na rua, ela vai retornar ao trabalho nesta quarta, das 22h às 6h, e tomar banho na casa da tia de uma vizinha da ocupação.

Ela considera aceitar o auxílio-aluguel, que seria ofertado pelo Governo do Estado, desde que consiga dividir um imóvel com outras vizinhas. "Não existe aluguel de R$ 400", disse. Maria Carmelita havia se mudado para a ocupação havia três anos, após o seu barraco na Favela do Moinho, também no centro da capital, ser atingido por um incêndio.

Apesar de a Prefeitura de São Paulo pedir que as doações sejam entregues à Cruz Vermelha, em local próximo ao aeroporto de Congonhas, os desabrigados pedem que tudo seja levado à igreja do largo do Paissandu, onde eles estão, ou para outra ocupação do movimento, na rua Benjamin Constant, número 170, também no centro. A igreja, porém, fechou as portas para doações por falta de espaço.

De acordo com o movimento, a permanência dos sobreviventes na rua é uma forma de pressionar o poder público a conseguir uma moradia definitiva. “A prefeitura está fazendo as famílias irem para um albergue. É uma jogada de marketing para maquiar a situação. Isso vai ter um custo muito alto para eles”, disse a porteira Carla. Os sobreviventes pedem todo tipo de doação. “Perdemos tudo, só não perdemos a vida. Então, roupa, colchão, produtos de higiene ou, até mesmo, conversa. Porque até isso, a conversa, nós perdemos.”

Segundo a Prefeitura de São Paulo, assistentes sociais que atuam no local haviam cadastrado até a madrugada desta quarta-feira 428 moradores, de 169 famílias. "Elas receberam alimentação, mas a maioria não aceitou acolhimento. Foram 45 pessoas encaminhadas aos abrigos municipais", informa a prefeitura em nota.

Também no largo, Leig Laura Aprigio, 36, passou a noite em uma barraca emprestada junto do marido e dos filhos, de 8 e 15 anos. "Ainda bem que teve a barraca, porque estava muito frio de noite", conta. Eles estavam no edifício havia menos de um mês após terem sido expulsos de uma casa que invadiram em Bertioga, no litoral paulista. "Uma mulher, a Selma, me convidou. Durou nem um mês", lamenta.

Já o vendedor ambulante Cláudio Maciel, de 34 anos, dormiu no largo para apoiar o movimento. Em situação de rua há 18 anos, ele costuma passar as noites no entorno, na Avenida São João. "Eles sempre me ajudaram, por que não vou ajudar?", contou ele, que costumava frequentar o edifício para tomar banho e fazer refeições.

O movimento reivindica que a prefeitura disponibilize uma tenda para instalarem uma cozinha provisória e banheiros químicos.

Ontem, o prefeito Bruno Covas (PSDB) disse que a orientação é que as famílias sejam mantidas juntas nos mesmos espaços de acolhimento. Além disso, Covas informou que será oferecido aluguel social para as famílias com recursos do governo estadual, como afirmou o governador do Estado, Márcio França (PSB).

O prefeito informou ainda que as famílias receberão R$ 1.200 no primeiro mês e R$ 400 a partir do segundo, durante doze meses. (*Com informações do Estadão Conteúdo)

Voluntários distribuem kits a moradores de prédio que desabou

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